´ Calculo vetorial com formas diferenciais S. C. Coutinho
Conteudo ´ Cap´ıtulo 1. Preliminares 1. Subconjuntos do Rn 2...
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´ Calculo vetorial com formas diferenciais S. C. Coutinho
Conteudo ´ Cap´ıtulo 1. Preliminares 1. Subconjuntos do Rn 2. Parametrizac¸a˜ o de curvas e superf´ıcies 3. Integrais duplas e triplas 4. Mudanc¸a de vari´aveis 5. Campos escalares e vetoriais 6. Exerc´ıcios
1 1 3 3 3 3 9
Cap´ıtulo 2. 1-formas 1. Trabalho 2. O caso geral 3. Integrac¸a˜ o de 1-formas 4. Teorema do gradiente 5. Aplicac¸o˜ es 6. Recapitulando 7. Exerc´ıcios 8. Problemas
13 13 24 33 42 43 51 53 57
Cap´ıtulo 3. 2-formas 1. Fluxo 2. O caso geral 3. Integrac¸a˜ o de 2-formas 4. Teorema de Stokes 5. Aplicac¸o˜ es 6. Recapitulando 7. Exerc´ıcios 8. Problemas
59 59 72 87 104 107 119 122 125
Cap´ıtulo 4. 3-formas 1. 3-formas 2. Integrac¸a˜ o de 3-formas 3. Teorema de Stokes 4. Aplicac¸o˜ es 5. Exerc´ıcios 6. Problemas
127 127 137 141 146 156 158
Cap´ıtulo 5.
161
n-formas iii
iv
´ CONTEUDO
Apˆendice 1. Determinantes
163 163
Bibliografia
165
´Indice
167
Cap´ıtulo 1 Preliminares Neste cap´ıtulo introduzimos algumas das noc¸o˜ es b´asicas que ser˜ao utilizadas ao longo de todo o livro, como campos escalares e vetoriais, e integrais duplas e triplas. 1. Subconjuntos do Rn Nesta sec¸a˜ o revisamos a nomenclatura b´asica utilizada na descric¸a˜ o dos conjuntos que servem como dom´ınio e imagem das func¸o˜ es do c´alculo. Para comec¸ar, se v e´ um vetor do Rn , ent˜ao podemos escrevˆe-lo na forma (1.1)
v = (a1 , . . . , an ).
Isto corresponde a` decomposic¸a˜ o de v em termos de suas coordenadas na base canˆonica ε de Rn . Os vetores de ε s˜ao ej = (0, . . . , 0, 1, 0, . . . , 0) para 1 ≤ j ≤ n, onde o 1 aparece na j-´esima posic¸a˜ o, e todas as demais entradas s˜ao nulas. Com freq¨ueˆ ncia escreveremos v = a1 e1 + · · · + an en , em vez de (1.1). A norma de v e´ kvk =
q a21 + · · · + a2n .
Se n = 1, ent˜ao v = a ∈ R e kvk = |a| e´ o m´odulo do n´umero real a. Seja, agora, p0 ∈ Rn e > 0 um n´umero real. A bola aberta de raio e centro em p0 e´ o conjunto B (p0 ) = {q ∈ Rn : kq − p0 k < }. Note que, no caso da bola aberta, usamos o sinal 0 (que depende de p) tal que B (p) ⊆ U. Isto e´ , cada ponto de U pertence a uma pequena bola aberta, que est´a inteiramente contida em U . S˜ao exemplos de conjuntos abertos de Rn , as bolas abertas (veja exerc´ıcio 1), o conjunto Rn inteiro, e o conjunto vazio. E´ f´acil entender porque Rn e´ aberto; mas e o conjunto vazio? O fato e´ que ∅ satisfaz a condic¸a˜ o para aberto por vacuidade. Em outras palavras, a condic¸a˜ o para aberto e´ satisfeita por todos os pontos de ∅ justamente porque este conjunto n˜ao tem nenhum ponto para satisfazer a condic¸a˜ o. Poder´ıamos ter definido conjuntos abertos partindo da noc¸a˜ o de retˆangulo aberto, em vez de bola aberta. Neste caso, um conjunto U ⊆ Rn seria definido como aberto se, dado um ponto qualquer de p de U , existe um n-retˆangulo aberto R tal que p ∈ R ⊆ U . Os conjuntos abertos assim definidos coincidem com aqueles definidos em termos de bolas. Isto decorre do fato de que todo n-retˆangulo aberto n˜ao vazio cont´em uma bola aberta e, reciprocamente, toda bola aberta n˜ao vazia cont´em um retˆangulo aberto. Para mais detalhes veja o exerc´ıcio 2. Por outro lado, um conjunto e´ fechado se seu complementar e´ aberto. Um ponto p de um conjunto fechado F pertence a` fronteira ∂F de F se, qualquer que seja > 0, temos que B (p) ∩ F 6= ∅ e B (p) ∩ (Rn \ F ) 6= ∅. Os pontos de F que n˜ao pertencem a` sua fronteira s˜ao chamados de pontos interiores. Note, contudo, que um fechado pode n˜ao ter nenhum ponto interior, como e´ o caso de um ponto isolado. Neste caso, o conjunto fechado inteiro e´ sua pr´opria fronteira. Al´em dos pontos isolados e das bolas fechadas, os conjuntos ∅ e Rn s˜ao fechados. Mas ∅ e Rn n˜ao eram abertos? Eram; mas tamb´em s˜ao fechados, j´a que Rn \ ∅ = Rn , que e´ aberto, e Rn \ Rn = ∅, que tamb´em e´ aberto. A bem da verdade, os u´ nicos subconjuntos de Rn que s˜ao simultaneamente abertos e fechados s˜ao exatamente estes dois; veja exerc´ıcio 3.
5. CAMPOS ESCALARES E VETORIAIS
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Um subconjunto V de Rn e´ conexo, se dados dois pontos p, q ∈ V , existe uma curva cont´ınua parametriz´avel C que liga p a q. Uma tal curva e´ definida por uma aplicac¸a˜ o C : [0, 1] → V, tal que C(0) = p e C(1) = q. Na pr´atica, isto significa que V e´ formado por apenas “um pedac¸o”. Por exemplo, se p, q ∈ Rn e d = kp − qk > 0 e´ a distˆancia entre p e q, ent˜ao a uni˜ao das bolas Bd/3 (p) ∪ Bd/3 (q) n˜ao e´ conexa. De fato, como as bolas n˜ao se tocam, n˜ao e´ poss´ıvel desenhar uma curva cont´ınua que liga o ponto de uma bola, a um ponto da outra. Finalmente, um subconjunto U de Rn e´ convexo se, dados dois pontos quaisquer p e q de U , o segmento de reta que une p a q est´a totalmente contido em U . Mais precisamente, o conjunto {(1 − t)p + tq : 0 ≤ t ≤ 1} ⊂ U. Bolas e retˆangulos, tanto abertos, quanto fechados s˜ao conjuntos convexos. Como convexo e conexo s˜ao palavras muito parecidas, e´ f´acil confundilas e, com isso, trocar um conceito pelo outro. Para complicar os conjuntos abertos e conexos aparecer˜ao com freq¨ueˆ ncia neste livro. Levando isto em conta, e tamb´em para evitar que nossa linguagem se torne prolixa, usaremos a palavra regi˜ao como abreviac¸a˜ o de aberto e conexo. ˜ de curvas e superf´ıcies 2. Parametrizac¸ao 3. Integrais duplas e triplas Revis˜ao de integrac¸a˜ o de func¸o˜ es de uma, duas e trˆes vari´aveis. Ainda n˜ao tive tempo de escrever. ´ 4. Mudanc¸a de variaveis Revis˜ao de mudanc¸a de vari´aveis em integrais duplas e triplas e jacobiano. Tamb´em n˜ao tive tempo de escrever. 5. Campos escalares e vetoriais O conceito mais importante deste livro e´ a noc¸a˜ o de campo, cujo estudo iniciamos nesta sec¸a˜ o.
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1. PRELIMINARES
˜ e exemplos. Dada uma regi˜ao U de Rn , considerare5.1. Definic¸ao mos dois tipos de campos neste livro. Um campo escalar e´ uma func¸a˜ o de U em R; j´a um campo vetorial e´ uma aplicac¸a˜ o de U em Rn . A importˆancia destes conceitos est´a relacionada a` s suas aplicac¸o˜ es em matem´atica, f´ısica, engenharia, meteorologia e ciˆencias afins. De agora em diante a palavra campo, usada sem nenhuma qualificac¸a˜ o adicional, significar´a sempre campo vetorial. Considere, por exemplo, a regi˜ao A da atmosfera, abaixo de uma certa altitude, e sobre uma dada a´ rea da superf´ıcie terrestre. A func¸a˜ o que relaciona a cada ponto de A a temperatura da atmosfera naquele ponto e´ um exemplo de campo escalar. Outro exemplo, e´ a func¸a˜ o que a cada ponto de A associa sua press˜ao atmosf´erica. Podemos representar campos escalares geometricamente usando curvas que passam por todos os pontos em que o campo tem um mesmo valor. No caso da temperatura, estas curvas s˜ao chamadas de isotermas, e foram introduzidas pelo naturalista alem˜ao Alexander von Humboldt como parte de sua observac¸a˜ o de que esp´ecies de plantas com caracter´ısticas semelhantes habitam a´ reas montanhosas de mesma temperatura; veja [7, p. 93-94].
F IGURA 1. Isotermas A representac¸a˜ o geom´etrica de um campo vetorial F : U → Rn , e´ feita associando-se a cada ponto p ∈ U o vetor F (p), que imaginaremos como tendo sua origem em p. Considerando a mesma regi˜ao A da atmosfera mencionada acima, imagine que a cada um de seus pontos associamos o vetor que corresponde a` velocidade com que uma part´ıcula se moveria se fosse solta naquele ponto. Isto nos daria um campo de velocidades, que e´ um exemplo de campo vetorial.
5. CAMPOS ESCALARES E VETORIAIS
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Esta definic¸a˜ o de campo vetorial n˜ao exclui a possibilidade do campo se anular em um ponto. Se isto ocorre, dizemos que o ponto e´ uma singularidade do campo. Contudo, o movimento de uma part´ıcula sob a ac¸a˜ o de um campo pode se tornar bastante complicado se o campo tiver singularidades.
F IGURA 2. Velocidade dos ventos Outros exemplos de campos vetoriais incluem os campos de forc¸a usais da f´ısica, como o campo gravitacional, o campo el´etrico e o campo magn´etico. Por exemplo, a lei de Coulomb nos diz que o campo el´etrico de uma carga positiva isolada, situada na origem, e´ dado por k E(x, y, z) = 2 (x, y, z), (x + y 2 + z 2 )3/2 onde k e´ uma constante. Portanto, os vetores deste campo s˜ao radiais e apontam para fora. Observe que a regi˜ao de definic¸a˜ o de E e´ R3 \ {(0, 0, 0)}, j´a que, na origem, estar´ıamos efetuando uma divis˜ao por zero. Os campos (escalares e vetoriais) que estudaremos n˜ao variam com o tempo. Isto e´ , o valor do campo, em um dado ponto, e´ sempre o mesmo, embora possa assumir valores distintos em pontos diferentes. Ao longo de todo o livro consideraremos apenas campos escalares e vetoriais que sejam diferenci´aveis. Como um campo escalar em U e´ uma func¸a˜ o de U em R, n˜ao h´a dificuldade em definir diferenciabilidade neste caso. No caso de um campo vetorial, temos uma func¸a˜ o de U em Rn . Assim, podemos escrever F , em termos de coordenadas, na forma F (p) = (F1 (p), . . . , Fn (p)), onde p ∈ U e Fj : U → R, para 1 ≤ j ≤ n, s˜ao as func¸o˜ es coordenadas de F . Diremos que F e´ diferenci´avel, se cada uma de suas func¸o˜ es coordenadas o for.
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1. PRELIMINARES
O conjunto dos campos escalares (isto e´ , func¸o˜ es) diferenci´aveis em U ser´a denotado por O(U ). Podemos munir este conjunto de duas operac¸o˜ es. A soma de f, g ∈ O(U ) e´ definida em cada ponto p ∈ U por (f + g)(p) = f (p) + g(p); j´a a multiplicac¸a˜ o e´ definida por (f g)(p) = f (p)g(p). Um escalar k ∈ R pode ser identificado com a func¸a˜ o constante de O(U ), que a cada ponto de U associa o valor k. Usando a definic¸a˜ o de multiplicac¸a˜ o de func¸o˜ es podemos, ent˜ao, definir o produto de uma func¸a˜ o f ∈ O(U ) por um escalar k ∈ R como (kf )(p) = kf (p) para todo p ∈ U. C´alculos de rotina mostram que o conjunto O(U ) e´ um espac¸o vetorial real relativamente a` s operac¸o˜ es de soma e multiplicac¸a˜ o por escalar definidas acima. O conjunto dos campos vetoriais diferenci´aveis em U ser´a denotado por X(U ). Este conjunto pode ser provido de operac¸o˜ es de soma e multiplicac¸a˜ o por um campo escalar. A soma de F, G ∈ X(U ) e´ definida em cada ponto p ∈ U por (F + G)(p) = F (p) + G(p). Se F = (F1 , . . . , Fn ) e G = (G1 , . . . , Gn ), s˜ao as express˜oes de F e G em termos de coordenadas, ent˜ao a definic¸a˜ o acima nos d´a F + G = (F1 + G1 , . . . , Fn + Gn ). J´a a multiplicac¸a˜ o de F por uma func¸a˜ o g ∈ O(U ) e´ definida por (gF ) = (gF1 , . . . , gFn ). Usando a definic¸a˜ o de multiplicac¸a˜ o de func¸o˜ es por campos podemos definir o produto de um campo vetorial F ∈ X(U ) por um escalar k ∈ R por (kF ) = (kF1 , . . . , kFn ). C´alculos de rotina mostram que o conjunto X(U ) e´ um espac¸o vetorial relativamente a` s operac¸o˜ es de soma e multiplicac¸a˜ o por escalar definidas acima. 5.2. Campos gradientes. Uma classe especial de campos vetoriais, muito importante nas aplicac¸o˜ es, s˜ao os campos gradientes. Um campo F definido em uma regi˜ao U de Rn e´ gradiente se existe uma func¸a˜ o f ∈ O(U ) tal que F = ∇f . Dizemos, tamb´em, que f e´ uma func¸a˜ o potencial para o campo F . O nome potencial foi empregado, neste sentido, pela primeira vez, na introduc¸a˜ o da monografia de 1828 de George Green. Em suas palavras
5. CAMPOS ESCALARES E VETORIAIS
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No que segue, teremos ocasi˜ao de falar freq¨uentemente sobre esta func¸a˜ o e, portanto, para abreviar, vamos cham´a-la de func¸a˜ o potencial do sistema S. 1 Veja [6, p. 1]. Exemplos de campos gradientes incluem os campos gravitacionais e os campos el´etricos. Considere, por exemplo, o campo el´etrico de uma carga pontual q. Como vimos no par´agrafo anterior, este campo e´ definido em U = R3 \ {(0, 0, 0)} por kq E(x1 , x2 , x3 ) = 2 (x1 , x2 , x3 ). 2 (x1 + x2 + x23 )3/2 Como ! 1 −xi ∂ p = 2 2 2 2 ∂xi x1 + x22 + x23 x1 + x2 + x3 vemos que a func¸a˜ o f=p
−kq
, + x22 + x23 e´ uma func¸a˜ o potencial para o campo E. O campo de uma esfera (s´olida) de raio 1, que foi uniformemente eletrizada tamb´em e´ gradiente. Para calcular o potencial explicitamente neste caso, basta imaginar cada “volume infinitesimal” da esfera como representando uma carga pontual, e integrar sobre a contribuic¸a˜ o de cada um destes pequenos volumes. Para facilitar os c´alculos digamos que o sistema de eixos foi escolhido de modo que a esfera tem centro na origem, e o ponto no qual queremos calcular o potencial tem coordenadas (0, 0, a), onde a > 1. A contribuic¸a˜ o do ponto (x1 , x2 , x3 ), de carga q, para o potencial em (0, 0, a) depende apenas da distˆancia entre os dois pontos, e e´ igual a −kq p . 2 2 x1 + x2 + (x3 − a)2 Integrando esta func¸a˜ o sobre toda a esfera, obtemos Z 1 Z √1−x2 Z √1−x2 −y2 −kq (5.1) dzdydx. h= √ 2 2 p 2 √ 2 + (x − a)2 2 x + x −1 − 1−x − 1−x −y 3 2 1 x21
Para simplificar a integrac¸a˜ o usaremos coordenadas esf´ericas. Neste caso, x21 + x22 + (x3 − a)2 = x21 + x22 + x23 − 2ax3 + a2 , e´ igual a r2 + a2 − 2ar cos(φ); ao passo que o jacobiano e´ r2 sen(φ). Portanto, a integral (5.1) e´ igual a Z Z Z −kq 2π 1 π r2 sen(φ) p h= dφdrdθ. 2 0 r2 + a2 − 2ar cos(φ) 0 0 1“In the sequel, we shall often have occasion to speak of this function, and will therefore, for abridgment, call it the potential function arising from the system S.”
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1. PRELIMINARES
Calculando a primeira integral integral, Z Z Z Z iπ p kq 2π 1 h p 2 kq 2π 1 h p 2 r r + a2 − 2ar cos(φ) drdθ = r r + a2 + 2ar − r h= a 0 a 0 0 0 0 Por sorte as express˜oes dentro das ra´ızes s˜ao quadrados perfeitos. H´a, contudo, um detalhe importante ao qual precisamos estar alerta. A express˜ao √ 2 r2 + a2 − 2ar corresponde √ a` raiz quadrada positiva de (r − a) . Como 2 2 a > 1 ≥ r, devemos ter r + a − 2ar = a − r > 0; e n˜ao r − a, que e´ um n´umero negativo. Assim, Z Z Z Z kq 2π 1 2kq 2π 1 2 π h= [r(r + a) − r(a − r)]0 drdθ = r drdθ. a 0 a 0 0 0 Continuando a integrac¸a˜ o, obtemos h=
4πkq . 3a
Note que a e´ a distˆancia entre a origem da esfera e o ponto no qual estamos calculando o potencial. Levando em conta a simetria da esfera e a distribuic¸a˜ o uniforme de carga, vemos que, o potencial no ponto, exterior a` esfera, cujas coordenadas s˜ao (x1 , x2 , x3 ), e´ ! 4πkq 1 p f (x1 , x2 , x3 ) = . 3 x21 + x22 + x23 Derivando o potencial, obtemos o campo el´etrico de uma esfera carregada no ponto (x1 , x2 , x3 ), que e´ −
1 4πkq (x1 , x2 , x3 ). 3 x21 + x22 + x23
Portanto, o campo el´etrico de uma esfera carregada e´ o mesmo de uma part´ıcula posicionada no centro da esfera, e cuja carga e´ igual a` carga total da esfera; isto e´ 4 (volume da esfera) × q = π · q. 3 Um resultado an´alogo foi provado por Newton no P RINCIPIA, relativamente ao campo gravitacional; [10, Proposition LXX, Theorem XXXI, p. 193]. Como os campos el´etrico e gravitacional variam com o inverso do quadrado da distˆancia, o argumento e´ essencialmente o mesmo nos dois casos. Entretanto, Newton n˜ao possu´ıa a noc¸a˜ o de potencial, nem ferramentas de c´alculo t˜ao avanc¸adas quanto as nossas. N˜ao admira, portanto, que a demonstrac¸a˜ o deste fato tenha sido um dos grandes obst´aculos que enfrentou ao escrever o P RINCIPIA. Uma discuss˜ao detalhada da contribuic¸a˜ o de Newton pode ser encontrada em [3, p. 269-275] e [15, p. 427].
6. EXERC´ICIOS
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6. Exerc´ıcios 1. Mostre que uma bola aberta e´ um conjunto aberto de Rn . 2. Mostre que todo retˆangulo aberto de Rn cont´em uma bola fechada e que toda bola aberta cont´em um retˆangulo fechado. 3. Mostre que os u´ nicos subconjuntos de Rn que s˜ao simultaneamente abertos e fechados s˜ao Rn e ∅. 4. Mostre que, se um conjunto fechado de Rn n˜ao tem fronteira, ent˜ao e´ igual a Rn e ∅. 5. Mostre que uma regi˜ao de R e´ convexa se, e somente se, e´ um intervalo. 6. Qual das seguintes afirmac¸o˜ es e´ verdadeira, e qual e´ falsa: (a) Todo subconjunto convexo de Rn e´ conexo. (b) Todo subconjunto conexo de Rn e´ convexo. Justifique cuidadosamente a sua resposta. 7. Seja U uma regi˜ao de Rn e f : U → R uma func¸a˜ o. O laplaciano de f e´ definido por n X ∂2f ∆(f ) = . ∂xj j=1 Dizemos que f satisfaz a equac¸a˜ o de Laplace se seu laplaciano e´ nulo. Mostre que as seguintes func¸o˜ es satisfazem a equac¸a˜ o de Laplace: (a) f (x, y, z) = x2 + y 2 − 2z 2 ; (b) f (x, y, z) = cos(5z) exp(3x + 4y) 8. Sejam f e g func¸o˜ es diferenci´aveis, definidas em uma regi˜ao aberta U ⊆ R2 . Mostre que, se ∂f ∂g ∂f ∂g =− e = , ∂x ∂y ∂y ∂x ent˜ao, ∆(f ) = 0. 9. Mostre que a func¸a˜ o f (x, y) = arctan(y/x) definida em x > 0, satisfaz ∆f = 0. 10. Seja U uma regi˜ao aberta de Rn e f : U → R uma func¸a˜ o diferenci´avel. Considere uma curva diferenci´avel parametrizada C : (0, 1) → U, com parˆametro t. Use a regra da cadeia em mais de uma vari´avel para calcular a derivada de g(t) = f (C(t)), em func¸a˜ o das derivadas parciais de f.
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1. PRELIMINARES
11. Seja U uma regi˜ao de Rn e f ∈ O(U ) uma func¸a˜ o diferenci´avel. O laplaciano de f e´ definido pela f´ormula n X ∂2f ∆(f ) = . ∂x2i i=1 Calcule o laplaciano das func¸o˜ es cos(x1 x2 ), tan(x1 + x2 ) e exp(x21 + x22 ). 12. Seja U uma regi˜ao de Rn . Uma func¸a˜ o f ∈ O(U ) satisfaz a equac¸a˜ o de Laplace se ∆(f ) = 0 em U . Mostre que cada uma das func¸o˜ es abaixo satisfaz a equac¸a˜ o de Laplace: (a) f (x, y, z) = x2 + y 2 − 2z 2 ; (b) f (x, y, z) = cos(5z) exp(3x + 4y) 13. Sejam f e g func¸o˜ es diferenci´aveis, definidas em uma regi˜ao aberta U ⊆ R2 . Mostre que, se ∂f ∂g ∂f ∂g =− e = , ∂x ∂y ∂y ∂x ent˜ao, ∆(f ) = 0. 14. Mostre que a func¸a˜ o f (x, y) = arctan(y/x) definida em x > 0, satisfaz ∆f = 0. 15. Seja r = (x21 + · · · + x2n )1/2 . (a) Calcule ∂r/∂xi . (b) Calcule ∇r. 16. Seja f uma func¸a˜ o diferenci´avel em apenas uma vari´avel e r = (x21 + · · · + x2n )1/2 . Defina g(x1 , . . . , xn ) = f (r). (a) Calcule o gradiente de g. (b) Calcule ∆g. 17. Seja f uma func¸a˜ o diferenci´avel definida em um aberto de Rn que cont´em a origem. Use o exerc´ıcio anterior para mostrar que: o valor de f em p ∈ U depende apenas da distˆancia de p a` origem −→ se, e somente se, ∇f e´ nulo ou paralelo ao vetor Op. 18. Seja U uma regi˜ao de Rn . Prove que O(U ) e X(U ) s˜ao espac¸os vetoriais sobre R. 19. Esboce cada um dos campos de velocidade descritos abaixo. (a) F (x, y, z) = (y, 0); (b) F (x, y, z) = (2/r2 , 0);
6. EXERC´ICIOS
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(c) F (x, y, z) = (4y, 0); (d) F (x, p y, z) = (0, 3r3 ); onde r = x2 + y 2 . 20. Seja f um polinˆomio nas vari´aveis x e y e coeficientes reais. A curva alg´ebrica Cf e´ o conjunto de pontos de R2 que s˜ao zeros de f ; isto e´ , Cf = {p ∈ R2 : f (p) = 0}. Esboce C(f ) em cada um dos casos abaixo: (a) f (x, y) = y − x2 . (b) f (x, y) = x2 + y 2 − 1. (c) f (x, y) = y 2 − x3 . (d) f (x, y) = y 2 − x2 (x + 1). 21. Seja f um polinˆomio nas vari´aveis x e y e coeficientes reais. (a) Dˆe uma f´ormula para o vetor tangente a Cf em um ponto p ∈ Cf , em func¸a˜ o das derivadas parciais de f . (b) Um ponto onde o vetor tangente se anula e´ conhecido como ponto singular de Cf . Determine os pontos singulares de Cf para cada uma das func¸o˜ es f do exerc´ıcio ??. 22. Seja g um polinˆomio em x. Mostre que se f (x, y) = y m − g(x), onde k > 0 e´ um n´umero inteiro, ent˜ao o n´umero de pontos singulares de f e´ finito. 23. Sejam p e q pontos do Rn . Escreva uma equac¸a˜ o param´etrica para o segmento de reta que vai de p a q. 24. Sejam p e q pontos da esfera de raio 1 e centro na origem do Rn . Escreva uma equac¸a˜ o param´etrica para a curva que vai de p a q e est´a totalmente contida na esfera. 25. Seja F um campo vetorial definido em uma regi˜ao U do R3 e defina o operador ∂ ∂ ∂ + F2 + F3 , DF = F1 ∂x1 ∂x2 ∂x3 onde F1 , F2 e F3 s˜ao as func¸o˜ es coordenadas de F . Mostre que se g ∈ O(U ), ent˜ao DF (g) = ∇g · F. 26. Sejam F e G campo vetoriais definidos em uma regi˜ao U do R3 . Defina o comutador de F e G como sendo [DF , DG ] = DF · DG − DG · DF , onde o ponto indica a composta de operadores. Mostre que [DF , DG ] = DH para algum campo H definido em U e calcule as func¸o˜ es coordenadas de H.
Cap´ıtulo 2 1-formas Usando a noc¸a˜ o de trabalho como ponto de partida, introduzimos neste cap´ıtulo as 1-formas e aprendemos a integr´a-las. 1. Trabalho Como explicamos na introduc¸a˜ o, comec¸amos nosso tratamento de 1-formas utilizando como motivc¸a˜ o a noc¸a˜ o de trabalho. 1.1. Trabalho de um campo constante. Seja F : R2 → R2 um campo de forc¸as constante definido em todo o plano. Como o campo e´ constante, temos que F (u) = F0 , para todo u ∈ R2 . No ensino m´edio, aprendemos a calcular o trabalho realizado por uma forc¸a em um deslocamento em linha reta. No nosso caso, a forc¸a e´ dada pelo campo. Como estamos supondo que o campo F e´ constante, podemos definir o trabalho realizado por F de maneira an´aloga ao do trabalho de uma forc¸a constante. Mais precisamente, o trabalho realizado por F no deslocamento em linha reta que vai de p a q em R2 e´ dado pelo produto interno F0 · (q − p), onde a diferenc¸a q − p deve ser interpretada como o vetor que vai de p a q. Aumentando um pouco a generalidade de nosso problema, suponhamos que o campo F e´ constante, mas que o deslocamento j´a n˜ao seja ao longo de uma reta. Comec¸aremos tratando o caso mais simples em que o deslocamento se d´a ao longo do gr´afico de uma func¸a˜ o. Digamos que x e y s˜ao as coordenadas usuais do plano, determinadas pela base canˆonica. A curva que queremos considerar corresponde ao gr´afico da func¸a˜ o cont´ınua f : [0, 1] → R. Em outras palavras, os pontos desta curva s˜ao da forma (t, f (t)), onde t ∈ [0, 1]. Note que assumimos f cont´ınua, para que a curva correspondente n˜ao dˆe pulos; do contr´ario, nosso modelo n˜ao seria fisicamente defens´avel. Desejamos definir o trabalho realizado pelo campo constante F : R2 → R2 ao longo desta curva. Nosso ponto de partida, ser´a a u´ nica definic¸a˜ o de trabalho que conhecemos; a que sup˜oe que o deslocamento seja ao longo de uma reta. A id´eia e´ o´ bvia, basta aproximar a curva por uma sucess˜ao de segmentos de reta. Somamos, ent˜ao, o trabalho realizado sobre cada segmento. Reduzindo o tamanho dos segmentos, podemos obter uma aproximac¸a˜ o t˜ao boa quanto 13
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2. 1-FORMAS
desejarmos. Para executar esta estrat´egia, dividimos o intervalo [0, 1] em n partes. Obtendo, assim, n subintervalos da forma [i/n, (i + 1)/n], onde 0 ≤ i ≤ n − 1. Nas extremidades do intervalo [i/n, (i + 1)/n] a func¸a˜ o f assume os valores f (i/n) e f ((i + 1)/n). Portanto, o segmento i i+1 t + (1 − t) com 0 ≤ t ≤ 1 n n nos d´a uma aproximac¸a˜ o de f entre i/n e (i + 1)/n. Naturalmente, a aproximac¸a˜ o ser´a tanto melhor, quanto menores forem os intervalos; isto e´ , quanto maior for n. A bem da verdade, esta afirmac¸a˜ o s´o e´ verdadeira se a curva correspondente ao gr´afico de f for diferenci´avel, e n˜ao apenas cont´ınua. Por isso assumiremos, de agora em diante, que f e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel. Passando, agora, ao c´alculo do trabalho em [i/n, (i + 1)/n], temos que o deslocamento em linha reta vai de (i/n, f (i/n)) a ((i + 1)/n, f ((i + 1)/n)). Desta forma, o vetor que descreve o deslocamento e´ ((i + 1)/n, f ((i + 1)/n)) − (i/n, f (i/n)) = (1/n, f ((i + 1)/n)) − f (i/n)), de modo que o trabalho correspondente ser´a (1/n, f ((i + 1)/n)) − f (i/n)) · F0 onde F0 e´ o vetor constante que define F . Para obter uma aproximac¸a˜ o do trabalho sobre toda a curva, somamos o trabalho ao longo dos pequenos segmentos, obtendo n−1 X
F0 · (1/n, f ((i + 1)/n)) − f (i/n)).
i=0
Pelas propriedades do produto interno, esta soma e´ igual a (1.1)
F0 ·
n−1 X
1/n,
i=0
n−1 X
! f ((i + 1)/n) − f (i/n) .
i=0
Expandindo o somat´orio n−1 X i=0
f
i+1 n
−f
i , n
temos 1 2 1 f − f (0) + f −f + ··· n n n n n−2 n−1 n−1 + f −f + f −f n n n n que e´ uma soma telesc´opica. Em outras palavras, os termos intermedi´arios se cancelam, de modo que sobram, apenas, o termo final e o inicial; com isso n−1 X i+1 i f( ) − f ( ) = f (n) − f (0). n n i=0
1. TRABALHO
15
Como n−1 X
1/n = 1,
i=0
verificamos que (1.1) e´ igual a F0 · (1, f (1) − f (0)). Este resultado e´ extremamente surpreendente, porque o cˆomputo final do trabalho acabou n˜ao dependendo nem do gr´afico da func¸a˜ o, nem de quantas partes dividimos o segmento [0, 1]. Em particular, o resultado e´ exato, j´a que o n´umero de divis˜oes do segmento n˜ao influencia o valor obtido. Mais surpreendente ainda e´ o fato do resultado n˜ao depender da forma do gr´afico da func¸a˜ o: d´a no mesmo se o gr´afico e´ uma reta ou uma curva cheia de altos e baixos. Antes que vocˆe fique por demais entusiasmado com a simplicidade do resultado que obtivemos, conv´em lembrar que estamos fazendo duas hip´oteses substanciais. A primeira e´ que o campo e´ constante; a outra, que a curva ao longo da qual o trabalho est´a sendo calculado e´ o gr´afico de uma func¸a˜ o. Vamos remover estas suposic¸o˜ es uma a uma, comec¸ando pela segunda. Seja, ent˜ao, C uma curva em R2 . Queremos dividir a curva em pequenos segmentos para calcular uma aproximac¸a˜ o do trabalho. O caso anterior foi f´acil, porque bastou dividir o segmento [0, 1] e usar isto para dividir a curva. Como proceder no caso de uma curva mais geral? A sa´ıda e´ n˜ao considerar uma curva geral demais; mais precisamente, queremos que C seja uma curva cont´ınua parametriz´avel. Isto significa que o conjunto C de pontos da curva e´ igual a` imagem de uma func¸a˜ o cont´ınua ψ : [0, 1] → R2 . Assim, para cada ponto p0 da curva C existe um t0 ∈ [0, 1] tal que p0 = ψ(t0 ). Em §3.3 veremos como considerar curvas um pouco mais gerais. Assumiremos, portanto, de agora em diante, que todas as curvas com as quais estamos trabalhando s˜ao, de fato, parametriz´aveis. Por causa disto, e para facilitar a notac¸a˜ o, usaremos a mesma letra para designar a curva e a func¸a˜ o de [0, 1] em R2 que corresponde a` sua parametrizac¸a˜ o. Seja, ent˜ao, C : [0, 1] → R2 uma curva parametrizada, e seja F : R2 → 2 R o campo de vetores constantes j´a considerado acima. Como no caso do gr´afico de uma func¸a˜ o, subdividimos o intervalo em que C est´a definida em n partes que, por sua vez, usamos para subdividir a curva C. Portanto, o trabalho realizado pelo campo no deslocamento ao longo de C pode ser aproximado por i+1 i F0 · C −C . n n Somando sobre cada intervalo, e apelando para as propriedades do produto interno, obtemos ! n−1 X i + 1 i F0 · C −C . n n i=0
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2. 1-FORMAS
Mais uma vez, trata-se de uma soma telesc´opica. Efetuando o cancelamento dos termos intermedi´arios, descobrimos que o trabalho total e´ igual a F0 · (C(1)) − F0 · (C(0)). Novamente o resultado depende apenas do in´ıcio e do fim da curva, e n˜ao de como a curva evolui entre estes dois pontos. Podemos, com isso, enunciar nosso primeiro teorema. T EOREMA . O trabalho de um campo constante entre dois pontos independe de como e´ feito o deslocamento entre estes pontos. Resta-nos remover a hip´otese do campo ser constante, faremos isto no pr´oximo par´agrafo. ´ 1.2. Trabalho de um campo variavel. Chegou a hora de enfrentar o caso geral, em que o campo n˜ao e´ constante e o deslocamento se d´a ao longo de uma curva qualquer. Lembre-se, por´em, que em nossa nomenclatura a express˜ao “curva qualquer” e´ uma abreviac¸a˜ o de “curva parametriz´avel cont´ınua qualquer”. Outro ponto a ser notado e´ que, como o campo era constante, estivemos supondo que estava definido em todo o plano. Contudo, j´a que vamos permitir um campo vari´avel, esta hip´otese se torna inconveniente. Por exemplo, o campo gravitacional definido por uma massa pontual n˜ao est´a definido no ponto onde a massa est´a situada, j´a que o valor do campo neste ponto seria infinito. Por isso, assumiremos, a partir de agora, que nossos campos e curvas est˜ao contidos em regi˜oes do plano. Antes de pˆor m˜aos a` obra, conv´em fazer algumas ressalvas sobre o tratamento que daremos ao problema de definir trabalho de um campo vari´avel neste par´agrafo. Nosso objetivo e´ justificar o porquˆe da definic¸a˜ o utilizada em f´ısica, tomando por base apenas a definic¸a˜ o de trabalho de um campo constante. Note o uso da palavra “justificar”. N˜ao podemos “provar” que a definic¸a˜ o utilizada em f´ısica est´a correta, simplesmente porque isto n˜ao faz sentido. Afinal, posso, em princ´ıpio, definir qualquer coisa que eu deseje. Se minha definic¸a˜ o e´ ou n˜ao u´ til na descric¸a˜ o de algum fenˆomeno f´ısico, e´ outro problema. Portanto, o que queremos e´ um argumento mais ou menos convincente que nos permita entender porque os f´ısicos julgam adequada a definic¸a˜ o geral de trabalho que utilizam. Tendo em mente as considerac¸o˜ es acima, utilizaremos um argumento que remonta aos P RINCIPIA de Newton. O argumento prop˜oe uma maneira de aproximar um campo de forc¸a vari´avel a partir de uma forc¸a constante. Seja U uma regi˜ao do plano. Digamos que F : U → R2 e´ um campo cont´ınuo (n˜ao constante), e que C : [0, 1] → U e´ uma curva cont´ınua parametrizada. Como no §1.1 dividiremos o intervalo em n partes iguais, e usamos isto para dividir a curva C. O argumento a` la Newton consiste em supor que o campo F pode ser aproximado por um campo descont´ınuo, que e´ igual a F (i/n) no intervalo [i/n, (i + 1)/n). Assim, de 0 at´e chegar a 1/n, suporemos que o campo vale F (0). Em 1/n, o campo aumenta instantaneamente para F (1/n), e continua assim at´e chegar em 2/n. Em 2/n h´a mais um aumento
1. TRABALHO
17
instantˆaneo, desta vez para F (2/n), e o campo fica constante at´e chegar a 3/n. E assim por diante. Newton usou este tipo de argumento, por exemplo, na Proposic¸a˜ o I, Teorema I, da sec¸a˜ o II, Livro I, do P RINCIPIA, onde prova que a terceira lei de Kepler segue do fato de que a gravitac¸a˜ o e´ uma forc¸a centr´ıpeta. Neste caso Newton imagina que a forc¸a centr´ıpeta, que deveria ser cont´ınua, e´ aplicada instantaneamente a intervalos regulares ao longo da trajet´oria do objeto. Vale a pena ler o argumento diretamente no P RINCIPIA; veja [10, p. 40]. Voltando ao nosso problema, vejamos como aplicar o que j´a sabemos sobre campos constantes a` situac¸a˜ o atual. Tomando o intervalo [i/n, (i+1)/n) como base, estamos supondo, em nossa aproximac¸a˜ o, que o campo vale F (C(i/n)) ao longo de todo este intervalo. Nosso primeiro impulso seria utilizar o teorema 1.1. Fazendo isto, concluir´ıamos que o trabalho executado, sob estas circunstˆancias, para ir de C(i/n) a C((i + 1)/n) deveria ser F (C(i/n)) · (C((i + 1)/n) − C(i/n)). Contudo, isto n˜ao est´a correto, j´a que estamos assumindo que o campo aumenta, instantaneamente, para F (C((i + 1)/n)) em (i + 1)/n; ao passo que o teorema pressup˜oe o campo constante em todo o intervalo fechado. Resolvemos esta dificuldade chegando muito perto de (i + 1)/n, mas sem atingi-lo. Por exemplo, avanc¸amos ao longo da curva C de i/n at´e (i + 1) 1 − n. n 2 Se n for grande, este n´umero est´a bem perto, mas aparece um pouco antes, de (i + 1)/n, de modo que o campo ainda vale F (C(i/n)) em 1 (i + 1) − n . C n 2 Portanto, sob estas hip´oteses, o trabalho realizado por F no intervalo [i/n, (i + 1)/n) e´ aproximadamente igual a 1 (i + 1) − n − C(i/n) . F (C(i/n)) · C n 2 Para descomplicar um pouco a notac¸a˜ o, escreveremos ti = i/n e ∆t =
1 1 − , n 2n
de modo que (i + 1) 1 − n = ti + ∆t. n 2 Com isto a aproximac¸a˜ o para o trabalho no intervalo [i/n, (i + 1)/n) se reescreve como F (C(ti )) · (C(ti + ∆t) − C(ti )).
18
2. 1-FORMAS
Somando todos estes valores para 0 ≤ i ≤ n − 1, obtemos Tn =
n−1 X
F (C(ti )) · (C(ti + ∆t) − C(ti )),
i=0
como uma aproximac¸a˜ o do trabalho realizado por F ao longo de C. Por´em, ao contr´ario do que ocorria no caso de um campo constante, esta n˜ao e´ uma soma telesc´opica. Para que isto fosse verdade precisar´ıamos poder cancelar F (C(ti )) · (C(ti + ∆t)) com F (C(ti+1 )) · (C(ti+1 )); o que n˜ao e´ poss´ıvel, j´a que n˜ao s˜ao iguais. Contornamos esta dificuldade fazendo uma coisa bem mais sofisticada. Pelas propriedades do produto interno, temos que Tn =
n−1 X
F (C(ti )) ·
i=0
C(ti + ∆t) − C(ti ) ∆t
∆t.
Contudo, esta soma e´ uma soma de Riemann (ou quase isto...); de forma que fazendo n tender a infinito, esperamos encontrar uma integral. Antes, por´em, devemos decidir o que acontece ao integrando quando passamos a este limite. Mas, 1 1 lim ∆t = lim − n = 0, n→∞ n→∞ n 2 de forma que C(t + ∆t) − C(t) C(t + ∆t) − C(t) = lim = C 0 (t), lim n→∞ ∆t→0 ∆t ∆t que e´ derivada de C em relac¸a˜ o a t, sua u´ nica vari´avel. E´ claro que, para que isto fac¸a sentido, C tem que ser diferenci´avel, e n˜ao apenas cont´ınua, como func¸a˜ o de t. Assumindo isto, obtemos Z 1 lim Tn = F (C(t)) · (C 0 (t))dt. n→∞
0
Portanto, o trabalho TC (F ) do campo F ao longo da curva C deve ser definido como Z 1 F (C(t)) · (C 0 (t))dt. (1.2) TC (F ) = 0
que e´ conhecida como a integral de linha de F ao longo de C, e denotada por Z F. C
1. TRABALHO
19
1.3. Exemplos. Antes de sistematizar a definic¸a˜ o obtida no §1.2, determinaremos o trabalho de alguns campos n˜ao constantes usando a f´ormula (1.2) da integral de linha. Considere a regi˜ao U = R2 . Calcularemos o trabalho realizado por dois campos diferentes ao longo da circunferˆencia de raio 1 com centro na origem. Os pontos desta circunferˆencia est˜ao completamente contidos em U , e podemos parametriz´a-la na forma C(t) = (cos(2πt), sen(2πt)). Como vamos precisar da derivada desta func¸a˜ o, e´ melhor calcul´a-la logo, C 0 (t) = (−2π sen(2πt), 2π cos(2πt)). Comec¸emos determinando o trabalho relativo ao campo F1 (x, y) = (x2 , y). Calculando o integrando de (1.2) para este campo, obtemos (cos(2πt)2 , sen(2πt)) · (−2π sen(2πt), 2π cos(2πt)), que e´ igual a 2π(− cos(2πt)2 sen(2πt) + sen(2πt)) cos(2πt)). Portanto, o trabalho realizado pelo campo ao longo da circunferˆencia e´ Z 1 2π (− cos(2πt)2 sen(2πt) + sen(2πt) cos(2πt))dt. 0
Esta func¸a˜ o e´ facilmente integr´avel, e nos d´a 1 sen(2πt)2 cos(2πt)3 + = 0. 2π 6π 4π 0 Note que este resultado e´ compat´ıvel com a expectativa gerada pelo teorema 1.1. Como estamos integrando ao longo de uma curva fechada, o valor do campo no in´ıcio e no fim da curva coincidem. Portanto, se o teorema continua valendo, dever´ıamos mesmo obter 0. Passando ao segundo exemplo, o campo desta vez e´ dado por F2 (x, y) = (−y, x). O integrando de (1.2) e´ igual a (− sen(2πt), cos(2πt))·(−2π sen(2πt), 2π cos(2πt)) = 2πsen(2πt)2 +2π cos(2πt)2 = 2π. Portanto, o trabalho realizado por F2 ao longo da circunferˆencia e´ igual a Z 1 dt = 2π, 0
e n˜ao e´ zero, como seria o caso se o teorema 1.1 valesse em geral. Este u´ ltimo exemplo nos permite concluir que o teorema 1.1 n˜ao vale para qualquer campo. Entretanto, j´a sabemos que sempre vale para campos constantes e parece valer tamb´em para F1 . O “parece” fica por conta do fato de s´o termos feito os c´alculos para um caminho muito especial, a circunferˆencia
20
2. 1-FORMAS
de raio 1 em torno da origem. Para garantir que o teorema e´ v´alido para F1 ter´ıamos que test´a-lo para qualquer curva fechada contida em U . Vejamos o que acontece se fizermos isto. Seja, ent˜ao, C : [0, 1] → U uma curva fechada diferenci´avel. O fato de C ser fechada se traduz pela igualdade C(0) = C(1); e isto e´ basicamente tudo que sabemos sobre C. Calculando o integrando de (1.2), obtemos c1 (t)2 c01 (t) + c2 (t)c02 (t), onde c1 e c2 s˜ao as func¸o˜ es coordenadas da curva C. Portanto, o trabalho realizado por F1 ao longo desta curva e´ igual a Z TC (F1 ) =
1
(c1 (t)2 c01 (t)
0
+
c2 (t)c02 (t))dt
c2 (t)2 c1 (t)3 + = 3 2
1 = 0, 0
uma vez que c1 (0) = c1 (1) e c2 (0) = c2 (1). Mostramos, assim, que o trabalho realizado por F1 em qualquer caminho fechado e´ sempre zero. Mas isto basta para concluirmos que o resultado do teorema 1.1 vale para F1 . Para entender porque, suponha que C e D s˜ao duas curvas que v˜ao de P1 a P2 , dois pontos de U . Definimos uma nova curva −D : [0, 1] → U por −D(t) = D(1 − t). Isto quer dizer que os ponto de −D s˜ao os mesmos de D, s´o que a curva e´ percorrida ao contr´ario. Percorrendo, agora, C de P1 a P2 , seguido de −D, de P2 a P1 , obtemos uma curva fechada. Vamos cham´a-la de C − D. Do que provamos acima, TC−D (F1 ) = 0. Mas, como e´ f´acil ver, TC−D (F1 ) = TC (F1 ) + T−D (F1 ) = TC (F1 ) − TD (F1 ), j´a que ao percorrermos a curva em sentido contr´ario, o sinal da integral se inverte. Mas isto implica que TC (F1 ) = TD (F1 ), provando assim que o trabalho realizado por F1 independe do deslocamento, desde que os pontos inicial e final coincidam. Revendo este argumento com o devido cuidado, e´ f´acil constatar que atiramos toda cautela pela janela. Por exemplo, j´a vimos que uma curva deve ser diferenci´avel para que possamos calcular a integral de linha. Contudo C − D pode n˜ao ser diferenci´avel mesmo se C e D o forem, como mostra a figura abaixo.
1. TRABALHO
21
·
D
C
· Nesta figura, as curvas C e D foram desenhadas de forma a terem tangentes em todo lugar. Apesar disto, formaram-se ‘bicos’ nos pontos onde as curvas se encontram, indicando que a curva fechada C − D n˜ao e´ diferenci´avel em nestes pontos. Voltaremos a esta quest˜ao em detalhe no §3.1. Com isto, podemos refinar nossas observac¸o˜ es anteriores sobre o teorema 1.1. Mostramos que • o teorema n˜ao vale para qualquer campo; • o teorema vale para qualquer campo constante; • o teorema n˜ao vale apenas para campos constantes. Estas observac¸o˜ es sugerem imediatamente o seguinte problema. P ROBLEMA . Caracterizar os campos para os quais trabalho entre dois pontos fixos independe da curva ao longo da qual e´ calculado. Campos para os quais esta propriedade vale s˜ao chamados de conservativos, e incluem muitos exemplos f´ısicos, como o campo gravitacional e o campo el´etrico. A caracterizac¸a˜ o dos campos conservativos ser´a feita no §5.6 do cap´ıtulo 3. 1.4. Mudando de perspectiva. Seja U uma regi˜ao do plano e F um campo definido em U . No §1.2 vimos que o trabalho de F ao longo de uma curva parametrizada C, contida em U , e´ a integral da func¸a˜ o γ(t) = F (C(t)) · C 0 (t), entre 0 e 1. Neste par´agrafo investigamos as propriedades desta func¸a˜ o. A primeira coisa a notar e´ que γ pode ser facilmente escrita como a composta de duas aplicac¸o˜ es, que chamaremos de G e α. A aplicac¸a˜ o G e´ definida por G(t) = (C(t), C 0 (t)) e tem dom´ınio [0, 1] e contradom´ınio U × R2 . J´a α : U × R2 → R e´ definida por α(p, v) = F (p) · v, onde p ∈ U e v ∈ R2 . Temos, assim, que G
α
[0, 1] −→ U × R2 −→ R
22
2. 1-FORMAS
donde γ = α · G. Note que, ao efetuar esta decomposic¸a˜ o, os pap´eis desempenhados pela curva e pelo campo foram atribu´ıdos a duas func¸o˜ es diferentes. De fato G codifica a informac¸a˜ o referente a` curva, ao passo que o campo e´ codificado em α. E´ nas propriedades de α que queremos nos concentrar a seguir. Em primeiro lugar, se p ∈ U for fixado, obtemos a partir de α a aplicac¸a˜ o α|p0 : Rn → R, definida por α|p0 (v) = α(p0 , v) = F (p0 ) · v. Apelando mais uma vez para as propriedades do produto interno, vemos que α|p0 e´ uma aplicac¸a˜ o linear. Em outras palavras, Propriedade 1: α e´ linear em sua segunda entrada, desde que a primeira entrada assuma um valor fixo. Por outro lado, se F = (a1 , a2 ) e v0 = (x0 , y0 ) for um vetor fixo de U , obtemos uma func¸a˜ o p 7→ α(p, v0 ) = a1 (p)x0 + a2 (p)y0 . Mas as func¸o˜ es coordenadas de F s˜ao diferenci´aveis por hip´otese. Como qualquer combinac¸a˜ o linear de func¸o˜ es diferenci´aveis e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel, o mesmo vale para a func¸a˜ o acima definida. Portanto, Propriedade 2: α e´ diferenci´avel em sua primeira entrada, desde que a segunda entrada assuma um valor fixo. Qualquer aplicac¸a˜ o U × Rn → R, que satisfac¸a as propriedades 1 e 2, destacadas acima, e´ chamada de 1-forma diferencial. Agora que sabemos o que e´ uma 1-forma, podemos introduzir a notac¸a˜ o tradicionalmente usada para denot´a-las. Seja β uma 1-forma em U e ε = {e1 , e2 } a base canˆonica do R2 . Escolha p ∈ U e v = x1 e1 + x2 e2 um vetor do plano. Apelando para a linearidade de β relativamente a` sua segunda entrada, podemos escrever (1.3)
β(p, v) = β(p, x1 e1 + x2 e2 ) = x1 β(p, e1 ) + x2 β(p, e2 ).
Como a segunda entrada est´a fixa em β(p, e1 ) e β(p, e2 ), temos que estas duas func¸o˜ es de p s˜ao diferenci´aveis. A partir de (1.3) seria f´acil descrever a representac¸a˜ o matricial de β, mas n˜ao e´ este o caminho adotado na notac¸a˜ o tradicional. Ao inv´es disto, definimos aplicac¸o˜ es lineares auxiliares dxi : R2 → R pela f´ormula dxi (v) = dxi (x1 e1 + x2 e2 ) = xi , para 1 ≤ i ≤ 2. Em palavras, dxi captura a i-´esima coordenada de v.
1. TRABALHO
23
Usando esta notac¸a˜ o, e levando em conta (1.3), β pode ser escrita como β = β(p, e1 )dx1 + β(p, e2 )dx2 . Podemos resumir o que fizemos at´e aqui dizendo que uma 1-forma e´ uma express˜ao da forma b1 dx1 + b2 dx2 , onde b1 , b2 : U → R s˜ao func¸o˜ es diferenci´aveis. A aplicac¸a˜ o composta α · G e´ conhecida como a imagem inversa de α pela curva parametrizada C, e denotada por C ∗ (α). H´a um detalhe importante desta u´ ltima construc¸a˜ o que n˜ao podemos deixar de observar. Conservando a notac¸a˜ o introduzida acima para F , e denotando as func¸o˜ es coordenadas de C por c1 e c2 , temos que C ∗ (α) = a1 (C)c01 + a2 (C)c02 . Apesar de estarmos acostumados a pensar na derivada C 0 (t) como sendo um vetor, o correto seria consider´a-la como a transformac¸a˜ o linear DC : R → R2 definida em s ∈ R por DC(t) (s) = C 0 (t)s = (c01 (t)s, c02 (t)s). Naturalmente estamos supondo que t est´a fixo na definic¸a˜ o acima. Assumindo que a derivada e´ uma transformac¸a˜ o linear, vemos que C ∗ (α) corresponde a` aplicac¸a˜ o de [0, 1] × R em R, dada por (1.4)
C ∗ (α)(t, s) = γ(t)s,
onde γ(t) == (a1 (C(t))c01 (t) + a2 (C(t))c02 (t)), e´ uma func¸a˜ o de [0, 1] em R. Como C ∗ (α)(t, s) e´ linear em s e diferenci´avel em t, temos uma 1-forma diferencial, s´o que, desta vez, definida no intervalo (0, 1). Retroagindo a` definic¸a˜ o dada anteriormente, uma 1-forma diferencial em (0, 1) deve ser uma aplicac¸a˜ o η : (0, 1) × R → R, que e´ diferenci´avel em relac¸a˜ o a` sua primeira coordenada e linear em relac¸a˜ o a` segunda. Procedendo como no caso de 1-formas de R2 , podemos escrever η como η = η(t, 1)dt, onde dt : R → R e´ a transformac¸a˜ o linear definida por dt(s) = s. Talvez isto parec¸a muita notac¸a˜ o para pouca matem´atica, mas e´ apenas conseq¨ueˆ ncia do fato, bem conhecido, de que um operador linear qualquer de R e´ dado pela multiplicac¸a˜ o por uma constante. E e´ exatamente isto que obter´ıamos se fix´assemos t na express˜ao de η. Usando esta notac¸a˜ o, podemos reescrever (1.4) na forma C ∗ (α) = γ(t)dt. Estes coment´arios nos ajudam a interpretar a noc¸a˜ o de integral de linha na linguagem das formas diferenciais. Lembre-se que a integral de F ao longo
24
2. 1-FORMAS
de C foi definida como sendo a integral da func¸a˜ o γ entre 0 e 1. Mas γ e´ o coeficiente da 1-forma C ∗ (α). Reescrevendo tudo isto numa ordem mais direta: a integral da 1-forma α ao longo de C, e´ a integral da 1-forma C ∗ (α) em [0, 1] que, por sua vez, e´ a integral de γ neste mesmo intervalo. Isto e´ , Z Z Z 1 α= C ∗ (α) = γdt. C
[0,1]
0
Como de costume, o termo mais a` direita nesta u´ ltima equac¸a˜ o representa a integral da func¸a˜ o γ entre 0 e 1. O dt est´a presente, apenas, para indicar qual e´ a vari´avel de integrac¸a˜ o. Contudo, a integral da 1-forma γdt em [0, 1] e´ Z γdt, [0,1]
que e´ perigosamente parecida com a notac¸a˜ o para a integral de γ entre 0 e 1. Removeremos o perigo de amb´ıg¨uidade simplesmente definindo Z Z 1 γdt, como sendo igual a γdt. [0,1]
0
Para encerrar, generalizamos a definic¸a˜ o acima para a integral de qualquer 1-forma do plano ao longo de uma curva. Se β e´ uma 1-forma em U e C : [0, 1] → U uma curva, definimos Z Z β= C ∗ (β). C
[0,1]
Como C ∗ (β) = gdt, para alguma func¸a˜ o diferenci´avel g, Z Z C ∗ (β) = [0,1]
1
gdt,
0
que e´ a integral usual de g entre 0 e 1. Na pr´oxima sec¸a˜ o generalizaremos e sistematizaremos tudo isto. Entre outras coisas, precisamos esclarecer como se deve lidar com o conflito entre intervalos abertos e fechados, que se manisfestou subrepiticiamente na discuss˜ao acima. De fato, a integral foi calculada no intervalo fechado [0, 1]. Contudo, o seu integrando e´ uma 1-forma definida no intervalo aberto (0, 1). 2. O caso geral Nesta sec¸a˜ o vamos generalizar e (com perd˜ao pelo trocadilho) formalizar a noc¸a˜ o de 1-forma diferenci´avel. Apesar de n˜ao utilizarmos formas em espac¸os de dimens˜ao superior a 3 em nossas aplicac¸o˜ es, introduziremos 1-formas sobre Rn . Faremos isto porque a teoria geral e´ t˜ao elementar que restringi-la n˜ao a simplificaria em nada. Sinta-se livre para imaginar que 1 ≤ n ≤ 3, se preferir.
2. O CASO GERAL
25
2.1. 1-formas diferenciais. Seja U uma regi˜ao de Rn . Uma 1-forma diferencial em U e´ uma aplicac¸a˜ o α : U × Rn → R, que satisfaz a` s seguintes condic¸o˜ es: (1) fixando p0 ∈ U , e considerando α(p0 , u) como func¸a˜ o apenas de u, temos uma aplicac¸a˜ o linear de Rn em R; (2) fixando u0 ∈ Rn , e considerando α(p, u0 ) como func¸a˜ o apenas de p, temos uma func¸a˜ o diferenci´avel de U em R. Como no §1.4, uma vez que p ∈ U tenha sido fixado, definimos αp como sendo a transformac¸a˜ o linear αp : Rn → R, dada por α|p (v) = α(p, v) para todo v ∈ Rn . Podemos expressar qualquer 1-forma de maneira bastante concreta, se adotamos um sistema de coordenadas em Rn . Feito isto, seja ε = {e1 , . . . , en }, a base canˆonica relativamente a esta escolha de coordenadas. Dado um vetor v, qualquer, de Rn , podemos escrevˆe-lo como v = b1 e1 + · · · + bn en , onde b1 , . . . , bn s˜ao n´umeros reais. Fixando, agora, um ponto p em U , e apelando para a propriedade (1) da definic¸a˜ o acima, α(p, v) = b1 α(p, e1 ) + · · · + bn α(p, en ).
(2.1)
Denotando, ent˜ao, por dxi a transformac¸a˜ o linear de Rn em R que extrai a i-´esima coordenada de um vetor, temos que dxi (u) = bi . Portanto, o u´ ltimo termo de (2.1) pode ser reescrito na forma α(p, u) = α(p, e1 )dx1 (u) + · · · + α(p, en )dxn (u). Entretanto, ei e´ um vetor fixo de Rn , de modo que, pela propriedade (2), α(p, ei ) e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel de p para cada 1 ≤ i ≤ n. Por isso, escrevendo, ai (x1 , . . . , xn ) = α((x1 , . . . , xn ), ei ), temos uma func¸a˜ o diferenci´avel ai : U → R. Assim, α(p, u) = a1 (p)dx1 (u) + · · · + an (p)dxn (u), para todo p ∈ U e u ∈ Rn . Mas isto equivale a dizer que α = a1 dx1 + · · · + an dxn ,
(2.2) n
em U × R .
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2. 1-FORMAS
N˜ao foi a` toa que preferimos definir o conceito de 1-forma diferenci-al utilizando as propriedades (1) e (2), ao inv´es de usar diretamente a express˜ao (2.2). A f´ormula (2.2) pressup˜oe que um sistema de coordenadas tenha sido previamente escolhido, que n˜ao e´ o caso da definic¸a˜ o do in´ıcio deste par´agrafo. No jarg˜ao matem´atico a definic¸a˜ o que escolhemos e´ livre de coordenadas. 2.2. O espac¸o vetorial das 1-formas diferenciais. O conjunto formado pelas 1-formas diferenciais definidas em uma regi˜ao U do Rn ser´a denotado por Ω1 (U ). H´a v´arias operac¸o˜ es que podemos definir em Ω1 (U ), a mais simples das quais e´ a soma. Sejam α e β 1-formas diferenciais em U , a soma α + β e´ definida em um ponto (p, v) ∈ U × Rn por (α + β)(p, v) = α(p, v) + β(p, v). Para que esta definic¸a˜ o seja u´ til, e´ preciso que α + β tamb´em seja uma 1-forma diferencial em U , e n˜ao apenas uma aplicac¸a˜ o qualquer. Mas isto e´ f´acil de verificar usando as propriedades (1) e (2). Em primeiro lugar, fixando p ∈ U e tomando v1 , v2 ∈ Rn e um escalar k, temos que (2.3)
(α + β)(p, v1 + kv2 ) = α(p, v1 + kv2 ) + β(p, v1 + kv2 ).
Como α e β satisfazem (1), α(p, v1 + kv2 ) = α(p, v1 ) + kα(p, v2 ) e β(p, v1 + kv2 ) = β(p, v1 ) + kβ(p, v2 ). Substituindo em (2.3), obtemos (α + β)(p, v1 + kv2 ) = α(p, v1 ) + kα(p, v2 ) + β(p, v1 ) + kβ(p, v2 ), que pode ser reescrito na forma (α + β)(p, v1 + kv2 ) = (α + β)(p, v1 ) + k(α + β)(p, v2 ). Isto mostra que α + β e´ linear na segunda coordenada, quando a primeira est´a fixa. Poder´ıamos ter abreviado toda esta conta apelando apenas para o fato de que a soma de duas aplicac¸o˜ es lineares (neste caso, α|p e β|p ) tamb´em e´ uma aplicac¸a˜ o linear. Fixando, agora, um vetor v0 ∈ Rn temos, pela propriedade (2), que α(p, v0 ) e β(p, v0 ) s˜ao func¸o˜ es diferenci´aveis de p. Como a soma de func¸o˜ es diferenci´aveis em U e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel em U , conclu´ımos que (α + β)(p, v0 ) e´ diferenci´avel como func¸a˜ o de p. Mostramos, assim, que α + β satisfaz (1) e (2); portanto, e´ uma 1-forma diferenci´avel em U . Um c´alculo simples mostra que se α = a1 dx1 + · · · + an dxn e β = b1 dx1 + · · · + bn dxn , ent˜ao α + β = (a1 + b1 )dx1 + · · · + (an + bn )dxn , como, ali´as, seria de esperar.
2. O CASO GERAL
27
Procedendo de maneira semelhante, podemos mostrar que se α e´ uma 1forma diferencial em U e f : U → R, ent˜ao a aplicac¸a˜ o de U × Rn em R definida por (f α)(p, v) = f (p)α(p, v), onde p ∈ U e v ∈ Rn . Mais uma vez, isto e´ facilmente expresso em termos de coordenadas pela f´ormula f α = f (a1 dx1 + · · · + an dxn ) = (f a1 )dx1 + · · · + (f an )dxn . Um caso particular da multiplicac¸a˜ o de uma 1-forma por uma func¸a˜ o ocorre quando a func¸a˜ o e´ constante. Neste caso o que temos e´ o produto de um escalar por uma 1-forma. Assim, podemos somar 1-formas diferenci´aveis e multiplic´alas por escalares. Com um pouco de paciˆencia e´ poss´ıvel verificar que estas operac¸o˜ es satisfazem todas as propriedades requeridas para fazer de Ω1 (U ) um espac¸o vetorial sobre R. Este e´ um fato que usaremos com freq¨ueˆ ncia ao longo destas notas; t˜ao frequentemente que raramente chamaremos a atenc¸a˜ o para o que estamos fazendo. No §1.4 vimos como associar uma 1-forma diferencial a um campo do plano. Esta construc¸a˜ o se generaliza imediatamente para dimens˜oes maiores. Seja U uma regi˜ao de Rn e F : U → Rn um campo de vetores diferenci´avel em U . Denotando por x1 , . . . , xn as coordenadas de Rn relativamente a` base canˆonica, e por F1 , . . . , Fn as func¸o˜ es coordenadas de F , definimos a 1-forma diferencial associada a F por τF = F1 dx1 + · · · + Fn dxn . Isto nos d´a uma correspondˆencia bijetiva entre campos definidos em U e formas em Ω1 (U ). Com isso, tanto podemos estudar o c´alculo vetorial em termos de formas, quanto de campos. A vantagem de usar a linguagem de formas e´ que permite um tratamento unificado do que ocorre em todas as dimens˜oes; ao contr´ario do que ocorre com os campos de vetores, como j´a comentamos na introduc¸a˜ o. 2.3. Diferencial. Como vimos no §5.2 do cap´ıtulo 1, uma classe importante de campos vetoriais s˜ao os campos gradientes. Seja F um campo gradiente, definido em uma regi˜ao U de Rn , e f ∈ O(U ) sua func¸a˜ o potencial. A 1-forma ∂f ∂f dx1 + · · · + dxn τ∇f = ∂x1 ∂xn e´ denotada por df , e conhecida como a diferencial, ou diferencial total, da func¸a˜ o f . Uma 1-forma em U que pode ser escrita como df para algum f ∈ O(U ), e´ chamada de exata. Podemos nos perguntar de que forma a diferencial se comporta com relac¸a˜ o a` s operac¸o˜ es definidas em O(U ); veja §5 do cap´ıtulo 1. Em primeiro lugar, como a derivac¸a˜ o parcial e´ linear, d(f + kg) = d(f ) + kd(g), para todo f, g ∈ O(U ) e k ∈ R.
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2. 1-FORMAS
Como O(U ) e Ω1 (U ) s˜ao ambos espac¸os vetoriais sobre R, podemos reformular esta propriedade dizendo simplesmente que a diferencial d : O(U ) → Ω1 (U ) e´ uma transformac¸a˜ o linear. No caso da multiplic¸a˜ o de func¸o˜ es, a situac¸a˜ o e´ mais complicada. Considerando, novamente, o que ocorre com as derivadas parciais, temos que se f, g ∈ O(U ), ent˜ao ∂f ∂g ∂ (f g) = g+f , ∂xj ∂xj ∂xj para cada 1 ≤ j ≤ n. Assim, n X ∂g ∂f g+f dxj . d(f g) = ∂xj ∂xj j=1 Distribuindo os dxj sobre a soma, obtemos n X ∂f ∂g d(f g) = gdxj + f dxj . ∂xj ∂xj j=1 Separando as parcelas em duas somas, X n n X ∂f ∂g g dxj + f dxj . d(f g) = ∂xj ∂xj j=1 j=1 Pondo, agora, f e g em evidˆencia, n n X X ∂f ∂g d(f g) = g dxj + f dxj , ∂xj ∂xj j=1 j=1 que pode ser reescrito como d(f g) = gdf + f dg. Esta equac¸a˜ o e´ conhecida como f´ormula de Leibniz. 2.4. Imagem inversa. E´ chegada a hora de introduzir o conceito de imagem inversa de uma 1-forma por uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel. Faremos isto de uma maneira suficientemente geral para cobrir os dois casos de imagem inversa introduzidos no §1.4. Seja V uma regi˜ao de Rm , e seja φ : V → Rn uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel. Escrevendo φ em termos de suas func¸o˜ es coordenadas, temos que φ(p) = (φ1 (p), . . . , φn (p)), para todo p ∈ V . Dizer que φ e´ diferenci´avel, equivale a dizer que cada uma das func¸o˜ es coordenadas φj : V → R para 1 ≤ j ≤ n, e´ diferenci´avel. A derivada de φ em um ponto p ∈ V e´ dada pela matriz jacobiana Jp (φ), que por sua vez define uma transformac¸a˜ o linear de Rm em Rn , que tamb´em denotaremos por (Jp (φ)).
2. O CASO GERAL
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At´e aqui n˜ao fizemos nada que n˜ao tenha sido visto em um curso de c´alculo diferencial. Seguindo, agora, o roteiro j´a utilizado em 1.4, definimos uma func¸a˜ o Gφ : V × R m → Rn × R n , por Gφ (p, v) = (φ(p), Jp (φ)v), m
onde p ∈ V e v ∈ R . Note que Gφ e´ diferenci´avel como func¸a˜ o de suas m primeiras coordenadas e linear como func¸a˜ o das m u´ ltimas coordenadas. Suponha, agora, que a imagem de φ est´a contida em uma regi˜ao U de Rn , na qual est´a definida uma 1-forma diferencial α. Neste caso a imagem de Gφ est´a contida em U × Rn , de modo que faz sentido calcular a composta de α com Gφ . A imagem inversa de α por φ, denotada por φ∗ (α), e´ definida por φ∗ (α) = α · Gφ . Pela definic¸a˜ o de composta, φ∗ (α) e´ uma aplicac¸a˜ o de V × Rm em R. Restanos mostrar que e´ uma 1-forma diferencial em V . Para isto, basta verificar as condic¸o˜ es (1) e (2) da definic¸a˜ o enunciada no §2.1. Digamos que um ponto p0 ∈ V foi fixado. Ent˜ao, para qualquer v ∈ Rm temos φ∗ (α)(p0 , v) = α(φ(p0 ), Jp0 (φ)v), que e´ equivalente a dizer que φ∗ (α)(p0 , v) = α|φ(p0 ) · Jp0 (φ)(v). Mas, com p0 fixado, tanto α|φ(p0 ) , quanto Jp0 (φ) s˜ao lineares nas coordenadas restantes. Como a composta de aplicac¸o˜ es lineares e´ linear, temos que a aplicac¸a˜ o φ∗ (α)(p0 , v) e´ linear em v, de modo que φ∗ (α) satisfaz (1). Suponhamos, agora, que o vetor v0 ∈ Rm est´a fixo. Considere a func¸a˜ o g0 : V → U × Rn definida pela regra g0 (p) = (φ(p), Jp (φ)(v0 )). Como Jp (φ)(v0 ) e´ diferenci´avel como func¸a˜ o de p, o mesmo vale para g0 . Contudo, φ∗ (α)(p, v0 ) = α · g0 (p) qualquer que seja p ∈ V . Como composta de duas aplicac¸o˜ es diferenci´aveis, φ∗ (α)(p, v0 ) e´ , ela pr´opria, diferenci´avel, o que prova (2). E´ claro que, se φ corresponder a uma curva parametriz´avel, ent˜ao a imagem inversa definida aqui coincide com a que foi definida no §1.4. Por outro lado, se φ : Rm → Rn for uma transformac¸a˜ o linear, ent˜ao Gφ (p, v) = (φ(p), φ(v)), j´a que, neste caso, a transformac¸a˜ o linear induzida pela jacobiana e´ a pr´opria φ. Se α for uma 1-forma diferenci´avel em Rm , temos α · Gφ (p, v) = α(φ(p), φ(v)).
30
2. 1-FORMAS
Supondo, agora, que α e´ constante, seus coeficientes s˜ao independentes da escolha de suas m primeiras coordenadas, de modo que α · Gφ (p, v) = α(φ(v)). Com isso, φ∗ (α) = α · φ, se α for uma forma constante. Um caso um pouco mais geral corresponde a` imagem inversa de dxi por uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel qualquer, onde xi e´ a i-´esima coordenada de Rn em relac¸a˜ o a` base canˆonica ε. Mais uma vez, seja V um aberto de Rm e φ : V → Rn uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel. Por definic¸a˜ o, Gφ (p, v) = (φ(p), Jp (φ)v), m
onde p ∈ V e v ∈ R . Mas isto implica que φ∗ (dxi )(p, v) = dxi (Jp (φ)v). Contudo, a i-´esima coordenada de Jp (φ)v e´ igual a (2.4)
∂φi ∂φi (p)b1 + · · · + (p)bm , ∂y1 ∂ym
onde y1 , . . . , ym s˜ao as coordenadas de Rm relativamente a` sua base canˆonica, e v = (b1 , . . . , bm ). Com isto, dyj (v) = bj , para 1 ≤ j ≤ m. de modo que (2.4) pode ser reescrita como ∂φi ∂φi (p)dy1 + · · · + (p)dym (v). ∂y1 ∂ym Mas isto significa que φ∗ (dxi ) =
∂φi ∂φi dy1 + · · · + dym . ∂y1 ∂ym
que e´ exatamente a diferencial da func¸a˜ o φi , conforme definida no final do §2.1. Com isso, podemos escrever (2.5)
φ∗ (dxi ) = dφi .
2.5. Propriedades da imagem inversa. Seja φ : V → U uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel, onde V e U s˜ao regi˜oes de Rm e Rn , respectivamente. Usando a notac¸a˜ o introduzida no §2.1 para o espac¸o das 1-formas diferenciais sobre uma regi˜ao, podemos dizer que a imagem inversa nos d´a uma aplicac¸a˜ o φ∗ : Ω1 (U ) → Ω1 (V ). Observe que φ tem V como dom´ınio e U como contradom´ınio, ao passo que, na imagem inversa, estas duas regi˜oes aparecem com suas posic¸o˜ es trocadas: o dom´ınio de φ s˜ao as formas definidas sobre U , j´a seu contradom´ınio corresponde a` s formas definidas sobre V .
2. O CASO GERAL
31
Como Ω1 (U ) e Ω1 (V ) s˜ao espac¸os vetoriais, e´ razo´avel perguntar se φ∗ e´ uma transformac¸a˜ o linear. A resposta e´ sim, como e´ f´acil de verificar. Se α1 e α2 s˜ao 1-formas diferenciais em U e k e´ um escalar, ent˜ao φ∗ (α1 + kα2 ) = (α1 + kα2 ) · Gφ . Mas, da definic¸a˜ o de soma de formas, isto e´ igual a α1 · Gφ + k(α2 · Gφ ); que pode ser reescrito como φ∗ (α1 ) + kφ∗ (α2 ), provando, assim, a linearidade de φ∗ . O produto de uma 1-forma por um escalar e´ apenas um caso especial do produto por uma func¸a˜ o. Como vimos no §2.1, se g : U → R e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel e α uma 1-forma na regi˜ao U , ent˜ao a f´ormula (2.6)
(gα)(p, v) = g(p)α(p, v), para todo p ∈ U e v ∈ Rn ,
define uma nova 1-forma diferencial em U . Vejamos o que acontece se calculamos a imagem inversa de gα pela aplicac¸a˜ o diferenci´avel φ : V → U dada acima. Por definic¸a˜ o, temos que φ∗ (gα)(p, v) = (gα)(φ(p), Jp (φ)v). Mas, pela f´ormula (2.6), (gα)(φ(p), Jp (φ)v) = g(φ(p))α(φ(p), Jp (φ)v) = (g · φ)(p)φ∗ (α). Escrevendo φ∗ (g) = g · φ, temos a sugestiva f´ormula φ∗ (gα) = φ∗ (g)φ∗ (α), na qual a justaposic¸a˜ o indica o produto da func¸a˜ o φ∗ (g) pela 1-forma φ∗ (α), ambas definidas sobre V . Por uma quest˜ao de coerˆencia diremos que φ∗ (g) e´ a imagem inversa da func¸a˜ o g pela aplicac¸a˜ o φ. As propriedades descritas acima nos permitem dar uma f´ormula bastante compacta, al´em de muito u´ til, para a imagem inversa de uma forma expressa em termos de coordenadas. Digamos que x1 , . . . , xn s˜ao as coordenadas de Rn , e que φ1 , . . . , φn s˜ao as func¸o˜ es coordenadas de φ. Neste caso, se a 1forma diferencial α se escreve como α = a1 dx1 + · · · + an dxn , temos que φ∗ (α) = φ∗ (a1 dx1 ) + · · · + φ∗ (an dxn ), pela linearidade da imagem inversa. Usando, agora, a propriedade relativa ao produto por uma func¸a˜ o diferenci´avel, obtemos φ∗ (α) = φ∗ (a1 )φ∗ (dx1 ) + · · · + φ∗ (an )φ∗ (dxn ). Finalmente, por (2.5), (2.7)
φ∗ (α) = φ∗ (a1 )dφ1 + · · · + φ∗ (an )dφn .
32
2. 1-FORMAS
Outra propriedade muito importante da imagem inversa diz respeito a` diferencial de uma func¸a˜ o. Se f : U → R e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel, ent˜ao, pela f´ormula (2.5), a imagem inversa de sua diferencial por φ e´ n m m X X X ∂φ ∂f ∂f j (φ(z))dφj = (φ(z)) dxi . φ∗ (df ) = ∂y ∂y ∂x j j i i=1 j=1 j=1 Entretanto, pela regra da cadeia, isto e´ igual a d(φ∗ (f )) = d(f · φ). Como veremos na sec¸a˜ o 5, esta f´ormula e´ uma das chaves do estudo de campos conservativos. A u´ ltima propriedade que desejamos considerar diz respeito a` imagem inversa por uma aplicac¸a˜ o composta. Sejam ψ:W →V e φ:V →U aplicac¸o˜ es diferenci´aveis, onde W , V e U s˜ao regi˜oes de Rk , Rm e Rn , respectivamente. Queremos calcular (φ · ψ)∗ (α), onde α e´ uma 1-forma definida em U . Mas, (φ · ψ)∗ (α)(p, v) = α((φ · ψ)(p), Jp (φ · ψ)(v). Contudo, pela regra da cadeia para func¸o˜ es de mais de uma vari´avel Jp (φ · ψ) = Jψ(p) (φ)Jp (ψ). Assim, (φ · ψ)∗ (α)(p, v) = α((φ · ψ)(p), Jψ(p) (φ)Jp (ψ)(v), que e´ igual a φ∗ (α)(ψ(p), Jp (ψ)(v); que, por sua vez, e´ ψ ∗ (φ∗ (α))(p, v). Portanto, (φ · ψ)∗ (α) = ψ ∗ (φ∗ (α)). Note a invers˜ao das posic¸o˜ es de φ e ψ quando passamos de um lado para o outro da equac¸a˜ o. Vamos encerrar enunciando, de maneira sistem´atica, todas as propriedades da imagem inversa de formas. Seja φ : V → U uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel entre regi˜oes V ⊆ Rm e U ⊆ Rn . Propriedade 1: A imagem inversa φ∗ : Ω1 (U ) → Ω1 (V ) e´ uma transformac¸a˜ o linear entre espac¸os vetoriais. Propriedade 2: Se α ∈ Ω1 (U ) e f ∈ O(U ), ent˜ao φ∗ (f α) = φ∗ (f )φ∗ (α). Propriedade 3: Se f ∈ O(U ), ent˜ao φ∗ (df ) = dφ∗ (f ).
˜ DE 1-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
33
Propriedade 4: Se ψ : W → V e´ uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel em uma regi˜ao W ⊆ Rk e α ∈ Ω1 (U ), ent˜ao (φ · ψ)∗ (α) = ψ ∗ (φ∗ (α)). ˜ de 1-formas 3. Integrac¸ao J´a estamos de posse de toda a maquinaria necess´aria para definir a integral de uma 1-forma diferencial qualquer sobre uma curva. ´ 3.1. Integral de 1-forma em 1-celula. At´e aqui assumimos que uma curva parametrizada C e´ , simplesmente, uma func¸a˜ o diferenci´avel do intervalo [0, 1] em R. Lembre-se que a diferenciabilidade e´ necess´aria para que o c´alculo da imagem inversa de uma forma possa ser feita. Entretanto, esta definic¸a˜ o envolve um certo conflito de interesses. O problema se d´a porque queremos que C esteja definida em um intervalo fechado; j´a que a integral vai de um extremo ao outro da curva. Por outro lado, a diferenciabilidade de C requer que esteja definida em um aberto, porque o limite do quociente de Newton deve ser tomado a` esquerda e a` direita de cada ponto do intervalo. Da´ı o conflito: para ter a diferenciabilidade, perdemos os extremos do intervalo. H´a v´arias sa´ıdas poss´ıveis, algumas mais sofisticadas, outras menos. Por exemplo, poder´ıamos definir diferenciabilidade apenas a` direita ou apenas a` esquerda, para dar conta das extremidades do intervalo. Entretanto, em nome da simplicidade, a soluc¸a˜ o que adotaremos ser´a muito menos sofisticada. Imaginaremos que C est´a definida em um intervalo aberto um pouco maior que [0, 1], e que e´ diferenci´avel em todo este intervalo. Para quase todas as aplicac¸o˜ es pr´aticas da teoria, esta e´ uma hip´otese perfeitamente aceit´avel. Sejam a < b dois n´umeros reais. Sistematizando os coment´arios acima, diremos que σ e´ uma 1-c´elula definida no intervalo [a, b], se existe um n´umero real > 0 tal que σ : (a − , b + ) → R, e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel em todo ponto de (a − , b + ). H´a duas raz˜oes principais para chamar o objeto que acabamos de definir de 1-c´elula, em vez de curva parametrizada. A primeira, e´ que ter´ıamos mais um sentido ligeiramente diferente para o termo curva parametrzizada, o que o tornaria ainda mais sobrecarregado. A segunda, e´ que queremos chamar sua atenc¸a˜ o para o paralelo entre as v´arias c´elulas definidas ao longo do curso; 2-c´elulas no cap´ıtulo 3 e 3-c´elulas no cap´ıtulo 4. Talvez vocˆe j´a tenha observado que definimos 1-c´elulas sobre um intervalo fechado geral [a, b], e n˜ao sobre [0, 1], como v´ınhamos fazendo com todas as curvas parametrizadas at´e aqui. Na verdade, esta n˜ao e´ uma generalizac¸a˜ o relevante. De fato, se σ e´ uma 1-c´elula em [a, b], ent˜ao a func¸a˜ o σ ˆ : [0, 1] → R, definida por σ ˆ (t) = σ(a(1 − t) + bt)
34
2. 1-FORMAS
e´ diferenci´avel e tem a mesma imagem que σ. Em outras palavras, qualquer 1-c´elula pode ser reparametrizada em termos do intervalo [0, 1]. A u´ nica raz˜ao para admitir intervalos de definic¸a˜ o mais gerais para as 1-c´elulas e´ que isto simplifica as demonstrac¸o˜ es de algumas propriedades da integral de uma 1forma, conforme veremos a seguir. Nossa definic¸a˜ o ter´a como partida o caso unidimensional. Em primeiro lugar, qualquer 1-forma definida em um intervalo (a0 , b0 ) de R pode ser escrita na forma gdt, onde t e´ a coordenada de R e g : (a0 , b0 ) → R e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel. Se a0 < a < b < b0 , ent˜ao a integral da forma gdt no intervalo [a, b] e´ definida como sendo a integral da func¸a˜ o g neste intervalo. Isto e´ , Z Z b gdt = gdt. [a,b]
a
n
Suponha, agora, que U ⊆ R e´ uma regi˜ao, α e´ uma 1-forma diferencial em U e σ : [a, b] → Rn e´ uma 1-c´elula cuja imagem est´a contida em U . A integral de α ao longo de σ e´ definida por Z Z α= σ ∗ (α). σ
[a,b]
Esta f´ormula est´a bem definida porque, a` direita, temos a integral de uma 1forma em dimens˜ao um, que j´a foi definida anteriormente. Se F for um campo de vetores em U , a integral de linha de F ao longo de σ e´ Z Z F = τF . σ
σ
Como τ estabelece uma correspondˆencia bijetiva entre campos e 1-formas, as noc¸o˜ es de integral de linha e integral de 1-forma s˜ao essencialmente equivalentes. Por isso, passaremos de uma a` outra noc¸a˜ o, sem maiores cerimˆonias, sempre que necess´ario. Vejamos um exemplo em dimens˜ao trˆes. Seja α = xdx + yzdy + (x + y)dz, uma 1-forma definida em todo o R3 e σ : [1, 2] → R a 1-c´elula definida por σ(t) = (t2 , t3 , t4 ). Calculando a imagem inversa da forma por σ, obtemos σ ∗ (α) = σ ∗ (x)σ ∗ (dx) + σ ∗ (yz)σ ∗ (dy) + σ ∗ (x + y)σ ∗ (dz). Contudo, σ ∗ (x) = t2 ,
σ ∗ (yz) = t7 e σ ∗ (x + y) = t2 + t3 ,
ao passo que, σ ∗ (dx) = d(t2 ) = 2tdt, σ ∗ (dy) = d(t3 ) = 3t2 dt e σ ∗ (dz) = d(t4 ) = 4t3 dt. Assim, σ ∗ (α) = (2t3 + 3t9 + 4t5 + 4t6 )dt.
˜ DE 1-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
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Portanto, 2 4 Z Z 2 3t10 2t6 4t7 15014 t 3 9 5 6 + + + = . α= (2t +3t +4t +4t )dt = 2 10 3 7 35 σ 1 1 3.2. Propriedades da integral de uma 1-forma. H´a algumas propriedades elementares das integrais de 1-formas que precisamos considerar. Suponha, como j´a se tornou usual, que U seja uma regi˜ao de Rn . Dadas duas 1-formas diferenciais α e β em U , e um escalar k ∈ R, queremos calcular Z (α + kβ), σ
onde σ e´ uma 1-c´elula definida em [a, b] cuja imagem est´a contida em U . Por definic¸a˜ o Z Z (α + kβ) = σ ∗ (α + kβ). σ
[a,b]
Assim, das propriedades da imagem inversa, segue que Z Z (α + kβ) = σ ∗ (α) + kσ ∗ (β). σ
[a,b]
Mas, do lado direito desta equac¸a˜ o, temos a integral de func¸o˜ es de uma vari´avel, que sabemos satisfazer Z Z Z b σ ∗ (α) + kσ ∗ (β) = σ ∗ (α) + k σ ∗ (β). [a,b]
[a,b]
a
Reescrevendo tudo isto em termos ao longo de C temos Z Z Z (α + kβ) = α + k β, σ
σ
σ
como, ali´as, seria de esperar. As outras propriedades que desejamos estudar est˜ao relacionadas a mudanc¸as nas curvas. Em primeiro lugar, que efeito tem uma reparametrizac¸a˜ o da curva sobre a integral? Antes de formular esta pergunta com exatid˜ao, e´ conveniente introduzir a seguinte definic¸a˜ o. Para manter a coerˆencia com a noc¸a˜ o de 1-c´elula descrita acima, usaremos a express˜ao a func¸a˜ o diferenci´avel γ : [a, b] → [c, d] para designar uma func¸a˜ o diferenci´avel γ : (c − , d + ) → (a − , b + ) onde e´ um n´umero real positivo. Se σ e γ s˜ao como acima, ent˜ao, σ · γ define uma parametrizac¸a˜ o diferente da 1-c´elula σ. Isto e´ , σ · γ e´ uma 1-c´elula cuja imagem e´ a mesma de σ. A pergunta pode, ent˜ao, ser reformulada como: qual a relac¸a˜ o entre a integral de uma 1-forma α ∈ Ω1 (U ) ao longo da 1-c´elula σ · γ e a integral da mesma forma ao longo de σ?
36
2. 1-FORMAS
Para responder a esta pergunta, calculamos a integral desejada usando as v´arias propriedades que j´a conhecemos. Como, Z Z α= (σ · γ)∗ α, σ·γ
[c,d]
devemos calcular primeiro a imagem inversa (σ · γ)∗ α. Usando a propriedade 4 do final do §2.5, temos que (σ · γ)∗ α = γ ∗ (σ ∗ (α)). Como σ ∗ (α) e´ uma func¸a˜ o de apenas uma vari´avel, podemos escrevˆe-la como gdu, onde g e´ uma func¸a˜ o do parˆametro u de σ. Nesta notac¸a˜ o, γ ∗ (σ ∗ (α)) = γ ∗ (gdu) = (g · γ)dγ. Explicitando o valor da diferencial dγ em func¸a˜ o da vari´avel t de γ, obtemos γ ∗ (σ ∗ (α)) = (g · γ)γ 0 dt. Portanto, Z
∗
Z
∗
(g · γ)γ 0 dt.
γ (σ (α)) = [c,d]
[c,d]
Mas esta e´ a integral de uma func¸a˜ o de uma vari´avel, de modo que, pela regra de integrac¸a˜ o por substituic¸a˜ o, Z Z γ(d) 0 (g · γ)γ dt = g(u)du, [c,d]
γ(c)
∗
onde u = γ(t). Como σ (α) = gdu, obtemos a f´ormula Z Z γ(d) (3.1) α= σ ∗ (α). σ·γ
γ(c)
Se γ satisfizer γ(c) = a e γ(d) = b, a f´ormula (3.1) nos d´a Z
Z α=
σ·γ
α. σ
Em outras palavras, a reparametrizac¸a˜ o de uma 1-c´elula por uma func¸a˜ o diferenci´avel n˜ao altera o valor da integral de uma forma ao longo daquela 1-c´elula. Este resultado e´ t˜ao importante que e´ melhor enunci´a-lo a` parte. ´ ´ F ORMULA DE MUDANC ¸ A DE VARI AVEIS . Sejam σ : [a, b] → R uma 1-c´elula e γ : [c, d] → [a, b] uma func¸a˜ o diferenci´avel. Se a imagem de σ est´a contida em uma regi˜ao U de Rn na qual est´a definida uma 1-forma α, temos Z Z γ(d) α= σ ∗ (α). σ·γ
γ(c)
˜ DE 1-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
37
Seja σ uma 1-c´elula definida em [a, b] e cuja imagem est´a contida em uma regi˜ao U de Rn . Se γ : [0, 1] → [a, b], e´ dada por γ(t) = (b − a)t + a, ent˜ao σ · γ e´ uma 1-c´elula cuja imagem e´ a mesma de σ. Al´em disso, se α ∈ Ω1 (U ), temos que Z Z α= α. σ·γ
σ
Isto significa que podemos supor que as 1-c´elulas que aparecem na demonstrac¸a˜ o de qualquer de nossos teoremas est˜ao parametrizadas a partir de [0, 1], sem que com isto haja qualquer perda de generalidade. E´ exatamente isto que faremos, daqui at´e o final deste par´agrafo. As pr´oximas propriedades da integral s˜ao conseq¨ueˆ ncias imediatas da f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis. Seja σ uma 1-c´elula parametrizada por [0, 1] e cuja imagem est´a contida em U . Defina −σ : [0, 1] → U pela regra −σ(t) = σ(1 − t). Se 0 ≤ t ≤ 1, ent˜ao (1 − t) ∈ [0, 1], contudo −σ(0) = σ(1) e −σ(1) = σ(0). Portanto, −σ tem a mesma imagem que σ, mas percorre os pontos da imagem no sentido oposto ao de σ. Aplicando a f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis com γ(t) = 1 − t, obtemos Z Z γ(1) α= σ ∗ (α). −σ
γ(0)
Contudo, como −σ(0) = σ(1) e −σ(1) = σ(0), Z Z α=− σ ∗ (α). −σ
[0,1]
Z
Z
Portanto, α=−
(3.2) −σ
α. σ
Em outras palavras, percorrer a 1-c´elula ao contr´ario inverte o sinal da integral. A pr´oxima propriedade da integral est´a relacionada ao fato de que uma part´ıcula em movimento pode percorrer uma mesma curva v´arias vezes. Isto ocorre, por exemplo, com uma part´ıcula carregada presa em um campo magn´etico. Qual o trabalho realizado pelo campo, em um caso como este? Naturalmente, precisamos supor que a curva e´ fechada para que a pergunta fac¸a sentido. Seja, ent˜ao, σ : [0, 1] → U, uma curva fechada e α uma 1-forma definida em U . Se percorrermos σ duas vezes, obtemos uma nova curva 2σ : [0, 2] → U
38
2. 1-FORMAS
definida por ( σ(t) 2σ(t) = σ(t − 1)
se t ∈ [0, 1] se t ∈ [1, 2],
Note que, se σ for diferenci´avel, ent˜ao 2σ tamb´em ser´a diferenci´avel e ( σ 0 (t) se t ∈ [0, 1] (2σ)0 (t) = 0 σ (t − 1) se t ∈ [1, 2]. Portanto, Z
Z
2
(2σ)∗ α
α= 2σ
0
e´ igual a Z
1
2
Z
0
α(σ(t − 1))σ 0 ((t − 1))dt.
α(σ(t)σ (t))dt + 0
1
Contudo, tomando s = t − 1, Z 2 Z α(σ(t − 1))σ 0 ((t − 1))dt = 1
1
α(σ(s))σ 0 (s)ds,
0
de modo que Z
Z α=2
2σ
1
α(σ(t)σ 0 (t)dt
0
Assim, Z
Z α=2
2σ
α, σ
que, evidentemente, e´ uma f´ormula muito satisfat´oria. Um argumento semelhante mostra que se k e´ um inteiro positivo, ent˜ao Z Z α = k α. kσ
σ
Por outro lado, supondo ainda que k > 0, temos por (3.2) que Z Z Z α=− α = −k α. −kσ
kσ
σ
Resumindo, se k for um inteiro qualquer, positivo ou negativo, ent˜ao Z Z (3.3) α = k α. kσ
σ
Esta f´ormula desempenhar´a um papel central no pr´oximo par´agrafo.
˜ DE 1-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
39
´ 3.3. Integrais em encadeamentos de 1-celulas. Para a u´ ltima propriedade da integral consideremos trˆes n´umeros reais a < b < c e uma 1-c´elula σ, definida em [a, c]. Podemos subdividir σ em duas curvas que chamaremos de σ1 e σ2 . A primeira destas c´elulas corresponde ao arco descrito por σ quando t varia entre a e b, ao passo que a segunda corresponde ao arco com t variando entre b e c. Mais precisamente, σ1 (t) = σ(t) para a ≤ t ≤ c, e σ2 (t) = σ(t) para c ≤ t ≤ b. Se a imagem de σ est´a contida em uma regi˜ao U de Rn e α ∈ Ω1 (U ), ent˜ao Z Z α= σ ∗ (α). σ
[a,c]
Mas, pelas propriedades da integral de func¸o˜ es de uma vari´avel, Z Z Z ∗ ∗ σ (α) = σ (α) + σ ∗ (α). [a,c]
[a,b]
Como σ = σ1 no intervalo [a, b], Z Z ∗ σ (α) = [a,b]
[b,c]
σ1∗ (α)
Z α,
=
[a,b]
σ1
e uma equac¸a˜ o semelhante vale para σ2 . Portanto, Z Z Z (3.4) α= α+ α. σ
σ1
σ2
A pr´oxima f´ormula deveria corresponder a` colagem de duas 1-c´elulas, uma seguida da outra, para formar uma u´ nica curva parametrizada. Digamos que σ1 : [a, b] → Rn e σ2 : [a0 , b0 ] → Rn sejam duas 1-c´elulas cujas imagens est˜ao contidas em uma regi˜ao U ⊆ Rn . Se σ1 (b) = σ2 (a0 ), podemos definir uma curva cont´ınua σ1 + σ2 : [0, 1] → Rn por ( σ1 (a(1 − 2t) + 2bt) (σ1 + σ2 )(t) = σ2 (a0 (1 − 2t) + 2b0 t)
se 0 ≤ t ≤ 1/2 se 1/2 ≤ t ≤ 1.
Apesar de ser cont´ınua, σ1 + σ2 nem sempre ser´a diferenci´avel no ponto σ1 (b) = σ2 (a0 ), onde foi feita a emenda. Por exemplo, o segmento de reta σ1 parametrizado por (t, −t) no intervalo [−1, 0] tem o ponto (0, 0) em comum com o segmento σ2 parametrizado por (t, t) no intervalo [0, 1]. Contudo, a curva C resultante da colagem de σ1 com σ2 n˜ao e´ diferenci´avel em (0, 0).
40
2. 1-FORMAS
· 22 22 22 22 σ1 2 σ2 22 22 2 · Felizmente, isto n˜ao nos impede de definir a integral de uma forma ao longo de σ1 + σ2 . A sa´ıda deste impasse est´a no famoso ditado: se n˜ao pode prov´a-lo, defina-o. Continuando com a notac¸a˜ o acima, se α ∈ Ω1 (U ), definimos Z α, σ1 +σ2
como sendo a soma
Z
Z α+
α.
σ1
σ2
Desta forma, a f´ormula (3.4) continua valendo neste caso mais geral, se tomamos E = σ1 + σ2 . Isto parece um blefe; e e´ ! Mas, que importa? Basta que o blefe funcione. Note que esta definic¸a˜ o e´ coerente com a f´ormula (3.3), bastando para isso que convecionemos escrever kσ = σ + · · · + σ , se k ≥ 0 e | {z }
kσ = −|k|σ, se k < 0,
k vezes
para qualquer 1-c´elula σ e qualquer inteiro k. Isto explica porque escolhemos usar o s´ımbolo para a soma, em vez do s´ımbolo da uni˜ao, para denotar este procedimento de colagem de curvas. Afinal, se A e´ um conjunto, ent˜ao A∪A = A, que n˜ao corresponde ao comportamente esperado para a colagem de curvas. Considere, agora, o seguinte diagrama L1
P
· ·
R
·
L2
Imagine que uma part´ıcula se movimenta ao longo desta curva da seguinte maneira: comec¸ando em P a part´ıcula segue R para a direita, d´a a volta no lac¸o L2 e retorna por R para a esquerda, dando a volta em L1 e parando novamente no ponto de partida P . Usando a notac¸a˜ o introduzida acima, podemos descrever esta curva como R + L2 − R + L1 .
(3.5)
Se α for uma 1-forma definida em uma regi˜ao que cont´em a curva, ent˜ao Z Z Z Z Z Z Z α= + α− α+ α= α+ α. R+L2 −R+L1
R
L2
R
L1
L2
L1
A tentac¸a˜ o em escrever esta u´ ltima soma de integrais como uma u´ nica integral Z α L1 +L2
˜ DE 1-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
41
e´ grande, mas n˜ao faria sentido, pelo menos em vista do processo de colagem definido originalmente. Afinal de contas, os lac¸os L1 e L2 juntos n˜ao formam uma curva cont´ınua. Entretanto, se admitirmos, por um momento, que a soma L1 + L2 fac¸a sentido, nos vemos tentados a ir ainda mais longe e nos perguntamos se n˜ao seria poss´ıvel cancelar R com −R na express˜ao (3.5). Neste caso obter´ıamos diretamente R + L2 − R + L1 = L1 + L2 , e n˜ao haveria necessidade, sequer, de escrever as integrais e proceder ao seu cancelamento. Isto e´ mais razo´avel do que pode parecer a` primeira vista, porque a u´ nica justificativa para introduzirmos esta “soma” de c´elulas e´ o fato de que precisamos de curvas mais gerais para usar nas nossas integrais. Se o cancelamento vai ser mesmo feito nas integrais, por que n˜ao cancelar logo as curvas e ganhar tempo com isto? Este tipo de argumento e´ um tanto perigoso em matem´atica, porque parece estar clamando que os fins justificam os meios. Felizmente h´a uma sa´ıda aceit´avel, que consiste em criar um c´alculo com c´elulas, com regras pr´oprias, formalizadas com o devido cuidado. Evidentemente, as regras para este c´alculo com c´elulas ser˜ao derivadas do comportamento das integrais. Passando a` formalizac¸a˜ o, definimos um encadeamento de 1-c´elulas, ou 1-encadeamento, como uma express˜ao da forma c1 σ1 + · · · + cm σm , onde os σs s˜ao 1-c´elulas contidas em uma regi˜ao U do Rn e os cs s˜ao n´umeros inteiros. Esta adic¸a˜ o de c´elulas satisfaz a` s seguintes propriedades. Se σ1 , σ2 e σ3 s˜ao c´elulas em U e k ∈ Z, ent˜ao: • (σ1 + σ2 ) + σ3 ≡ σ1 + (σ2 + σ3 ); • σ 1 + σ2 ≡ σ 2 + σ 1 ; • kσ1 + σ1 ≡ (k + 1)σ1 ; • 0σ1 ≡ 0; • se a imagem de σ1 e´ apenas um ponto, ent˜ao σ1 ≡ 0. Usamos ≡ em lugar de um simples sinal de igualdade para deixar claro que cada uma destas propriedades e´ derivada do comportamento de uma integral calculada sobre um encadeamento. Diremos que um encadeamento est´a em forma reduzida se eliminamos todas as parcelas que correspondem a pontos, e cancelamos todos os pares de c´elulas com sinais opostos. Assim, no exemplo acima, L1 + L2 e´ a forma reduzida de R + L2 − R + L1 . Para lhe dar o verdadeiro nome, o que fizemos foi sistematizar o comportamento da adic¸a˜ o de c´elulas enumerando suas propriedades b´asicas. Isto n˜ao corresponde ao que um matem´atico chamaria de “formalizac¸a˜ o” desta adic¸a˜ o. O problema e´ que, para chegar a um n´ıvel de precis˜ao considerado satisfat´orio por um matem´atico precisar´ıamos apelar para a teoria de grupos. Se o seu conhecimento de grupos abrange a noc¸a˜ o de grupo quociente ent˜ao vocˆe pode resolver o problema 3, onde a formalizac¸a˜ o dos conceitos acima e´ levada a cabo em detalhes.
42
2. 1-FORMAS
4. Teorema do gradiente Esta sec¸a˜ o cont´em um u´ nico resultado: uma generalizac¸a˜ o do teorema fundamental do c´alculo para 1-formas. Nem mesmo se trata de um teorema cuja demonstrac¸a˜ o seja longa ou complicada. Ent˜ao, porque dedicar uma sec¸a˜ o inteira a este teorema? A principal raz˜ao e´ que este e´ o primeiro de uma s´erie de resultados que ser˜ao todos reunidos no cap´ıtulo 4 sob o nome de teorema de Stokes. Os resultados correspondentes, nos pr´oximos cap´ıtulos, s˜ao bem mais sofisticados e demandam uma sec¸a˜ o pr´opria. Para chamar sua atenc¸a˜ o para o paralelo entre os resultados deste cap´ıtulo e dos pr´oximos, pareceu conveniente manter a mesma estrutura de sec¸o˜ es entre os diversos cap´ıtulos. E foi assim que este teorema veio parar em uma sec¸a˜ o pr´opria: por influˆencia de seus irm˜aos mais importantes. T EOREMA DO GRADIENTE . Seja U uma regi˜ao do Rn e σ uma 1-c´elula contida em U , que comec¸a em p e acaba em q. Se f ∈ O(U ), ent˜ao Z df = f (q) − f (p). σ
˜ . A demonstrac¸a˜ o e´ meramente uma quest˜ao de calcuD EMONSTRAC¸ AO lar a integral pela definic¸a˜ o. Digamos que σ e´ parametrizada a partir do intervalo [a, b]. Como Z Z σ ∗ (df ),
df = σ
[a,b]
e σ ∗ (df ) = d(σ ∗ (f )), temos que Z Z df = σ
d(σ ∗ (f )).
[a,b]
Contudo, g(t) = σ ∗ (f ) = f (σ(t)), e´ uma func¸a˜ o de um u´ nica vari´avel t, de modo que Z Z Z (4.1) df = d(σ ∗ (f )) = g 0 dt. σ
[a,b]
[a,b]
Aplicando, agora, o teorema fundamental do c´alculo para uma vari´avel, Z (4.2) g 0 dt = g(b) − g(a). [a,b]
Mas, (4.3)
g(b) = f (σ(b)) = f (q) e g(a) = f (σ(a)) = f (p),
j´a que a curva comec¸a em p e acaba em q. Reunindo as equac¸o˜ es (4.1), (4.2) e (4.3), obtemos Z Z b df = g 0 dt = g(b) − g(a) = f (q) − f (p), σ
a
provando assim o teorema.
˜ 5. APLICAC¸OES
43
Se aplicarmos este teorema a uma forma definida em um intervalo da reta, obtemos o teorema fundamental do c´alculo para func¸o˜ es de uma vari´avel, que aprendemos em c´alculo I. Entretanto, este u´ ltimo teorema foi o u´ nico resultado importante utilizado na demonstrac¸a˜ o acima. Esta situac¸a˜ o curiosa significa que estes dois teoremas – o teorema do gradiente e o teorema fundamental do c´alculo – s˜ao exatamente equivalentes um ao outro. Como a integral de uma 1-forma sobre um 1-encadeamento e´ mera soma das integrais sobre as parcelas, temos de imediato a seguinte generalizac¸a˜ o do teorema acima. ´ C OROL ARIO . Seja U uma regi˜ao do Rn e E um 1-encadeamento contido em U , que comec¸a em p e acaba em q. Se f ∈ O(U ), ent˜ao Z df = f (q) − f (p). E
˜ 5. Aplicac¸oes Nesta sec¸a˜ o investigamos algumas aplicac¸o˜ es da integral de uma 1-forma. ˜ 5.1. Circulac¸ao. Imagine um fluido que escorre em uma regi˜ao do R3 . Sabemos que o campo de velocidades do fluido nos permite descrever o caminho percorrido por uma part´ıcula nele abandonada. A pergunta que desejamos fazer aqui, entretanto, e´ um pouco diferente: De que forma o fluido contribui, ou se op˜oe, ao movimento de uma part´ıcula que percorre uma curva fechada? Para tornar a pergunta mais concreta, considere a seguinte situac¸a˜ o. Imagine uma circunferˆencia feita de arame, na qual circula uma pequena esfera perfurada, como uma conta num colar. Mergulhamos o aro com a esfera em um fluido, e movemos a esfera ao longo do aro. A esfera descrever´a uma circunferˆencia mas, dependendo do campo de velocidades, o fluxo pode empurrar a esfera em alguns momentos, e oferecer resistˆencia a seu movimento em outros. Queremos definir uma magnitude, chamada de circulac¸a˜ o, que mede a contribuic¸a˜ o total de um campo ao movimento ao longo de uma curva fechada contida na regi˜ao onde o campo est´a definido. Vejamos, em primeiro lugar, o que ocorre se o campo e´ constante. Digamos que o campo est´a definido em todo o R3 , e que flui ao longo do sentido positivo do eixo x. Em outras palavras, o campo F : R3 → R3 e´ definido por F (p) = e1 = (1, 0, 0), para todo p ∈ R3 . Seja C a circunferˆencia de centro na origem e raio 1, contida no plano z = 0. Queremos saber de que forma o campo empurra ou se op˜oe ao movimento de uma part´ıcula que tentamos fazer girar ao longo de C. Note que a contribuic¸a˜ o do campo ao movimento da part´ıcula e´ igual a` componente de F tangente a C em cada ponto. Parametrizando C como usual,
44
2. 1-FORMAS
temos C(t) = (cos(t), sen(t), 0), onde 0 ≤ t ≤ 2π. O vetor tangente a C no ponto C(t) e´ C 0 (t) = ( −sen(t), cos(t), 0), de modo que a projec¸a˜ o do campo sobre a tangente a` curva no ponto C(t) d´a C 0 (t) · e1 = −sen(t). Isto significa que, enquanto empurramos a esfera entre t = 0 e t = π, o campo se op˜oe ao movimento. Por outro lado, entre t = π e t = 2π, o campo e o vetor tangente a` curva apontam na mesma direc¸a˜ o. Com isto, o campo nos ajuda a empurrar a esfera. Como −sen(t + π) = −sen(t), o campo se op˜oe ao movimento da esfera no primeiro semi-c´ırculo exatamente com a mesma intensidade com que nos ajuda a empurr´a-la no segundo semic´ırculo. Portanto, e´ de esperar que a contribuic¸a˜ o total do campo ao movimento da esfera seja zero. Mas, para obter a contribuic¸a˜ o total, precisamos “somar” C 0 (t) · e1 sobre todos os valores de t entre 0 e 2π. Mais precisamente, devemos calcular a integral Z 2π Z 2π (C 0 (t) · e1 )dt = (−sen(t))dt = 0. 0
0
Em geral, se F e´ um campo de velocidades definido em uma regi˜ao U do espac¸o, a contribuic¸a˜ o total de F ao nosso esforc¸o de deslocar uma part´ıcula ao longo de uma curva fechada C, parametrizada por [a, b], e´ igual a` integral da projec¸a˜ o de F (C(t)) sobre C 0 (t) ao longo da curva C. Chamamos este n´umero de circulac¸a˜ o de F em C, e o denotamos por ΓF (C). Assim, Z ΓF (C) = F. C
Equivalentemente, se α e´ uma 1-forma em U definimos sua circulac¸a˜ o em C por Z Γα (C) =
α. C
Vejamos outro exemplo. Imagine um fio (infinito) ao longo do eixo z no qual flui uma corrente el´etrica. Com isto temos um campo magn´etico B : U → R3 na regi˜ao U = {(x, y, z) ∈ R3 : z 6= 0}, que corresponde ao R3 sem o eixo z. O campo B e´ dado por B(x, y, z) =
x2
k (−y, x, 0), + y2
˜ 5. APLICAC¸OES
45
onde k e´ uma constante. Vamos calcular a circulac¸a˜ o de B ao longo de uma circunferˆencia de raio r, contida no plano z = z0 . Parametrizando a circunferˆencia, obtemos C(t) = (r cos(t), r sen(t), z0 ), onde 0 ≤ t ≤ 2π. O vetor tangente a C no ponto C(t) e´ C 0 (t) = ( −r sen(t), r cos(t), 0), ao passo que o valor de B em C(t) e´ , B(C(t)) =
k (−r sen(t), r cos(t), 0). r
Assim, C 0 (t) · B(C(t)) =
k 2 (r sen2 (t) + r2 cos2 (t)) = kr. r
Portanto, Z ΓB (C) =
2π
krdt = 2πkr. 0
Isto n˜ao e´ surpreendente porque, neste caso, as linhas de forc¸a do campo s˜ao circunferˆencias paralelas ao plano z = 0, e com centro no eixo z. Se interpretarmos o campo B como sendo o campo de velocidades de um fluido, vemos que o fluido estaria girando em torno do eixo z. Mas isto significa que o campo estaria sempre empurrando ou se opondo a qualquer part´ıcula que fosse girada em torno de z. E´ exatamente isto que faz com que a circulac¸a˜ o deste campo n˜ao seja nula. Em geral, o campo de velocidades de um fluido ter´a circulac¸a˜ o n˜ao nula se nele houver v´ortices ou redemoinhos, como ocorre com o campo B. A figura abaixo ilustra exemplos de v´ortices avistados pelo sat´elite Landsat 7 na atmosfera terrestre sobre a ilha Selkirk. A prop´osito, esta ilha do Pac´ıfico tem este nome em homenagem ao marinheiro Alexander Selkirk, que l´a foi abandonado, a seu pedido, em 1704. Selkirk foi resgatado em 1709 e voltou a` Inglaterra. Esta hist´oria inspirou Daniel Defoe a escrever Robinson Cruso´e, que foi publicado apenas dois anos depois do retorno de Selkirk. Apesar de s´o termos calculado exemplos de circulac¸a˜ o de campos sobre curvas fechadas parametrizadas, podemos fazˆe-lo sobre qualquer 1-encadeamento cuja extremidade inicial coincide com a final. De agora em diante vamos nos referir a estes encadeamentos como fechados. 5.2. Formas exatas. Seja U uma regi˜ao de Rn . Lembre-se que uma 1-forma diferencial α em U e´ exata se existir f ∈ O(U ) tal que α = df . Neste par´agrafo caracterizamos as formas exatas em termos de sua circulac¸a˜ o. Usaremos isto, j´a no pr´oximo par´agrafo, para mostrar que todo campo conservativo tem potencial. Outras aplicac¸o˜ es surgir˜ao no cap´ıtulo 3. Antes de enunciar o teorema precisamos de introduzir a seguinte terminologia. Diremos que um encadeamento E = σ 1 + · · · + σm
46
2. 1-FORMAS
F IGURA 1. V´ortices na atmosfera e´ cont´ınuo se o ponto final de σi coincide com o ponto inicial de σi+1 , para todo 1 ≤ i ≤ m − 1. Se, al´em disso, o ponto final de σn coincide com o ponto inicial de σ1 , diremos que E e´ fechado. T EOREMA . Uma 1-forma definida em uma regi˜ao U de Rn e´ exata se, e somente se, sua circulac¸a˜ o e´ nula para qualquer encadeamento fechado contido em U . ˜ . Para comec¸ar, suponha, que a 1-forma e´ exata. PorD EMONSTRAC¸ AO tanto, podemos escrevˆe-la como df , para alguma func¸a˜ o f ∈ O(U ). Seja, agora, E = σ1 + · · · + σm ⊂ U um encadeamento cont´ınuo e digamos que cada uma destas 1-c´elulas e´ parametrizada por [0, 1], o que podemos fazer sem perda de generalidade pela f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis do §3.2. Ent˜ao Z Z 1 df = σi∗ (df ). σi
Como
σi∗ (df )
=
0
d(σi∗ (f )),
obtemos Z Z τ∇f = σi
1
d(σi∗ (f )).
0
Mas, σi∗ (f ) = g e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel, de uma vari´avel t, definida em [0, 1]. Portanto, σi∗ (df ) = g 0 dt, donde Z Z 1 df = g 0 dt. σi
0
Contudo, pelo teorema fundamental do c´alculo Z 1 g 0 dt = g(1) − g(0), 0
˜ 5. APLICAC¸OES
47
de forma que Z df = g(1) − g(0). σi
Por´em, como g(a) = σi∗ (f )(0) = f (σi (0)), e uma f´ormula semelhante vale para g(1), conclu´ımos que Z df = f (σi (1)) − f (σi (0)). σi
Como Z df = E
m Z X i=1
df,
σi
obtemos, ap´os o cancelamento dos termos intermedi´arios da soma telesc´opica, que Z m X (f (σi (1)) − f (σi (0))) = f (σn (1)) − f (σ1 (0)). df = E
i=1
Portanto, a integral de uma forma exata df em um encadeamento cont´ınuo depende apenas dos valores de f nos pontos inicial e final do encadeamento. Em particular, se o encadeamento for fechado, σn (1) = σ1 (0), de modo que Z df = 0. E
Mostramos, assim, que toda forma exata tem circulac¸a˜ o nula. Passando, agora, a` rec´ıproca, seja α ∈ Ω1 (U ) uma 1-forma cuja circulac¸a˜ o e´ zero. Queremos usar isto para construir uma func¸a˜ o f : U → R de modo que F = df . O problema e´ como proceder para construir f . Se n = 1, isto e´ f´acil de fazer. Neste caso, a forma α = gdx, onde g e´ uma func¸a˜ o de um intervalo aberto em R. Portanto, se f for uma primitiva de g, teremos d0 f = f 0 dx = gdx. Logo, para achar f basta integrar g. Isto sugere que podemos tentar obter a func¸a˜ o potencial integrando α ao longo de um encadeamento. Fixe um ponto p0 ∈ U que servir´a de base para a construc¸a˜ o. A func¸a˜ o f vai assumir valor zero em p0 , e seu valor em outros pontos ser´a calculado relativamente a este ponto base. Seja p ∈ U e C uma curva qualquer que vai de p0 a p. Definimos Z f (p) = α. E
48
2. 1-FORMAS
Como α e´ exata, o valor da integral independente do encadeamento cont´ınuo escolhido para ir de p0 a p. Para concluir a demonstrac¸a˜ o, precisamos apenas mostrar que df = α. Para isto basta provar que ∂f = ai para cada 1 ≤ i ≤ n, ∂xi onde ai e´ o coeficiente de dxi em α. Calcularemos as derivadas parciais de f a partir da definic¸a˜ o; isto e´ , usando quocientes de Newton. Como U e´ um conjunto aberto, existe um n´umero real positivo , para o qual a bola aberta Bp (), de raio e centro em p, est´a totalmente contida em U . Seja h um n´umero real que satisfaz |h| < . Denotando por ei o i-´esimo vetor da base canˆonica, temos que p + hei ∈ Bp (). O encadeamento de E com o segmento de reta σ que vai de p a p + hei nos d´a um encadeamento E + σ entre p0 e p + hei . Portanto, Z Z f (p + hei ) − f (p) = α− α; E+σ
donde
E
Z f (p + hei ) − f (p) =
α. σ
Mas σ(t) = p + tei , para 0 ≤ t ≤ h, de modo que Z h f (p + hei ) − f (p) = σ ∗ α. 0
Contudo, como p + tei e´ constante em todas as direc¸o˜ es exceto ei , temos que ( dt se j = i ∗ σ (dxj ) = 0 se j 6= i. Mas isto implica que σ ∗ (α) = ai (p + tei )dt. Assim, Z f (p + hei ) − f (p) =
h
ai (p + tei )dt 0
que e´ a integral de uma func¸a˜ o de apenas uma vari´avel. Pelo teorema fundamental do c´alculo Z f (p + hei ) − f (p) 1 h lim = lim ai (p + tei )dt h→0 h 0 h→0 h e´ igual a ai (p), completando assim a demonstrac¸a˜ o do teorema.
A demonstrac¸a˜ o do teorema prop˜oe um m´etodo que podemos utilizar para calcular f , quando soubermos que a forma α e´ exata. Considere, por exemplo, a forma α = yzdx + xzdy + xydz, definida sobre todo o R3 . Tomando o ponto base p0 como sendo a origem, queremos calcular o valor da func¸a˜ o f em p = (x, y, z). Para isso precisamos
˜ 5. APLICAC¸OES
49
calcular a integral de α de um caminho qualquer que vai da origem a p. Como o campo est´a definido em todo o R3 , podemos escolher o segmento de reta que vai da origem a (x, y, z). Isto e´ , podemos tomar σ(t) = (xt, yt, zt) para 0 ≤ t ≤ 1. Neste caso, Z
Z
f (p) =
α= σ
1
σ ∗ (α).
0
Como, σ ∗ (α) = σ ∗ (yzdx + xzdy + xydz) = 3xyzt2 dt, obtemos Z f (x, y, z) = f (p) =
1
3xyzt2 dt = 3xyz.
0
˜ de campos conservativos. No par´agrafo 1.3 de5.3. Circulac¸ao finimos campos conservativos do plano, mas esta noc¸a˜ o pode ser facilmente generalizada para Rn . Dizemos que um campo F , definido em uma regi˜ao U de Rn , e´ conservativo se o trabalho realizado por F e´ o mesmo ao longo de quaisquer duas curvas em U que tenham os mesmos pontos inicial e final. Os campos conservativos tamb´em podem ser definidos em termos de sua circulac¸a˜ o. Como esta outra definic¸a˜ o e´ muito conveniente quando se trata de verificar se um campo e´ ou n˜ao conservativo, provaremos que e´ equivalente a` definic¸a˜ o original. ˜ . Um campo e´ conservativo se, e somente se, sua circulaP ROPOSIC¸ AO c¸a˜ o sobre qualquer encadeamento fechado e´ nula. Um encadeamento fechado e´ aquele que corresponde a uma curva cont´ınua cujos extremos coincidem. ˜ . Seja U uma regi˜ao de Rn e F : U → Rn um campo D EMONSTRAC¸ AO de vetores. Como F e´ conservativo, a integral de τF assume o mesmo valor ao longo de qualquer caminho que comece e termine em um ponto P ∈ U . Mas o mais simples destes caminhos e´ dado pela 1-c´elula constante D(t) = P , para todo t ∈ [0, 1]. Contudo, D∗ (τF ) = 0, de modo que Z Z ΓF (E) = τF = τF = 0, E
D
qualquer que digamos que o 1-encadeamento fechado E ⊂ U , que comece e termine no ponto P . Reciprocamente, suponha que F tem circulac¸a˜ o nula, e sejam E1 e E2 dois encadeamentos com mesmos pontos iniciais e mesmos pontos finais. Isto significa que o encadeamento E1 − E2 e´ fechado. Portanto, Z τF = 0. E1 −E2
50
2. 1-FORMAS
Contudo, pelas f´ormulas do final do §3.2, temos Z Z Z τF − τF = τF = 0; E1
E1 −E2
E2
de modo que Z
Z τF =
E1
τF , E2
completando, assim, nossa demonstrac¸a˜ o.
Para refinar ainda mais este resultado, usaremos o teorema sobre formas exatas provados no §5.2. T EOREMA . Um campo vetorial definido em uma regi˜ao de Rn e´ conservativo se, e somente se, tem func¸a˜ o potencial. ˜ . Seja U uma regi˜ao de Rn e F um campo em U . Pela D EMONSTRAC¸ AO proposic¸a˜ o anterior F e´ conservativo se, e somente se, sua circulac¸a˜ o e´ nula sobre qualquer encadeamento fechado contido em U . Traduzindo isto em termos de formas, podemos dizer que F e´ conservativo se, e somente se, τF tem circulac¸a˜ o igual a zero sobre qualquer encadeamento fechado contido em U . Entretanto, pelo teorema do §5.2, isto ocorre se, e somente se, existe f ∈ O(U ) tal que τF = df . Portanto, F e´ conservativo, se, e somente se, τF = df = τ∂f , para algum f ∈ O(U ); que e´ equivalente ao resultado enunciado no teorema. 5.4. Campos centrais. Um tipo especial de campo conservativo, muito importante em f´ısica, s˜ao os campos centrais. Se p ∈ Rn , dizemos que um campo F definido em U = Rn \ {p} e´ central se • os vetores de F tˆem como suporte retas que passam por p; • a intensidade de F em qualquer ponto q ∈ U depende apenas da distˆancia entre p e q. O ponto p e´ chamado de centro do campo. Escolhendo o sistema de coordenadas de maneira que o centro p seja a origem, podemos escrever F em U na forma F (x1 , . . . , xn ) = g(r)(x1 , . . . , xn ),
(5.1) p
onde r = x21 + · · · + xn e g : R → R e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel. Para campos centrais vale uma vers˜ao mais refinada do teorema do §5.3. T EOREMA . Todo campo central e´ conservativo, e seu potencial em um ponto e´ func¸a˜ o apenas da distˆancia deste ponto ao centro do campo. ˜ . J´a vimos que uma escolha adequada de coordenadas D EMONSTRAC¸ AO nos permite escrever um campo central F na forma (5.1). Como todo campo gradiente e´ conservativo, basta achar uma func¸a˜ o potencial para F . Neste caso
6. RECAPITULANDO
51
isto e´ muito f´acil, porque se h for qualquer func¸a˜ o de uma vari´avel ent˜ao, pela regra da cadeia, ∂h(r) ∂r = h0 (r) , ∂xj ∂xj onde h0 denota a derivada de h em relac¸a˜ o a` sua u´ nica vari´avel, neste caso r. Contudo, xj ∂r , = ∂xj r donde ∂h(r) xj = h0 (r) . ∂xj r Assim, h0 (r) ∇h(r) = (x1 , . . . , xn ). r Comparando esta u´ ltima equac¸a˜ o a 5.1, verificamos que h seria um potencial para F se h0 (r) = rg(r); isto e´ , se h for uma primitiva de rg(r). Como g e´ diferenci´avel, uma tal primitiva sempre existe, provando assim o teorema. 6. Recapitulando Nesta sec¸a˜ o recapitulamos boa parte do que foi feito no primeiro cap´ıtulo. H´a duas raz˜oes para fazermos isto. A primeira, e mais o´ bvia, e´ provˆe-lo com um resumo sistem´atico do conte´udo das sec¸o˜ es anteriores. A segunda raz˜ao e´ que esta recapitulac¸a˜ o nos ajudar´a a tornar mais expl´ıcito o padr˜ao que ser´a seguido no desenvolvimento da teoria de 2-formas no pr´oximo cap´ıtulo. Com isto, a sec¸a˜ o 5 ficou de fora da recapitulac¸a˜ o, j´a que trata apenas de aplicac¸o˜ es da teoria. Na sec¸a˜ o 1 introduzimos de 1-forma, curva parametriz´avel, imagem inversa e integral de uma 1-forma ao longo de uma curva a partir do conceito de trabalho de uma forc¸a. Estas noc¸o˜ es foram sistematizadas nas sec¸o˜ es 2, 3 e 4, obedecendo a` s seguintes etapas. ˜ 6.1. Definic¸ao. Fixada uma regi˜ao U do Rn , comec¸amos introduzindo o conceito geral de 1-forma diferencial como sendo uma aplicac¸a˜ o α : U × Rn → R, que satisfaz a` s duas condic¸o˜ es seguintes: (1) fixando p0 ∈ U , e considerando α(p0 , u) como func¸a˜ o apenas de u, temos uma aplicac¸a˜ o linear de Rn em R; (2) fixando u0 ∈ Rn , e considerando α(p, u0 ) como func¸a˜ o apenas de p, temos uma func¸a˜ o diferenci´avel de U em R.
52
2. 1-FORMAS
O conjunto das 1-formas em U , que e´ denotado por Ω1 (U ), e´ um espac¸o vetorial relativamente a` soma de formas, e a` sua multiplicac¸a˜ o por escalares, conforme definidas no §2.1. 6.2. Campos e formas. A um campo vetorial F : U → Rn cujas func¸o˜ es coordenadas s˜ao F1 , . . . , Fn , fazemos corresponder a 1-forma τF = F1 dx1 + · · · + Fn dxn . Esta correspondˆencia e´ bijetiva, e nos permite tratar a an´alise vetorial seja na linguagem de formas, seja na linguagem de campos. A vantagem da linguagem de formas e´ que estabelece um padr˜ao generaliz´avel para objetos de dimens˜ao maior; ao contr´ario do que acontece com os campos. 6.3. Diferencial. O conjunto das func¸o˜ es diferenci´aveis em U ser´a denotado por O(U ). Tamb´em este e´ um espac¸o vetorial, j´a que podemos somar estas func¸o˜ es e multiplic´a-las por escalar. A diferencial determina uma transformac¸a˜ o linear de O(U ) em Ω1 (U ), que e´ definida em f ∈ O(U ) pela f´ormula ∂f ∂f df = dx1 + · · · + dxn . ∂x1 ∂xn Vimos, tamb´em, que se f, g ∈ O(U ), ent˜ao d(f g) = f d(g) + gd(f ), que e´ conhecida como a f´ormula de Leibniz. Uma 1-forma que e´ do tipo df , para alguma func¸a˜ o f ∈ O(U ), e´ chamada de exata. ´ 6.4. 1-celulas e encadeamentos. Uma 1-c´elula em U e´ uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel σ : [a, b] → U , onde a < b s˜ao n´umeros reais. Um encadeamento de 1-c´elulas σj : [aj , bj ] → U, para 1 ≤ j ≤ k e´ uma express˜ao da forma c1 σ1 + · · · + ck σk ,
(6.1)
onde os cs s˜ao n´umeros inteiros. Estas express˜oes podem ser manipuladas obedecendo-se a` s seguintes regras: se σ1 , σ2 e σ3 s˜ao c´elulas em U e k ∈ Z, ent˜ao, • • • • •
(σ1 + σ2 ) + σ3 ≡ σ1 + (σ2 + σ3 ); σ 1 + σ2 ≡ σ 2 + σ 1 ; kσ1 + σ1 ≡ (k + 1)σ1 ; 0σ1 ≡ 0; se a imagem de σ1 e´ apenas um ponto, ent˜ao σ1 ≡ 0.
7. EXERC´ICIOS
53
6.5. Imagem inversa. Dada uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel φ : V → U , onde V e´ uma regi˜ao de Rm , definimos a imagem inversa de uma 1-forma α = a1 dx1 + · · · + an dxn ∈ Ω1 (U ), como sendo φ∗ (α) = (a1 · φ)dφ1 + · · · + (an · φ)dφn ∈ Ω1 (V ), onde φ1 , . . . , φn s˜ao as func¸o˜ es coordenadas de φ. A imagem inversa determina uma transformac¸a˜ o linear de Ω1 (U ) em Ω1 (V ) que satisfaz φ∗ (df ) = dφ∗ (f ). 6.6. Integral. Se σ for uma 1-c´elula em U , a imagem inversa de α ∈ Ω1 (U ) por σ pode ser escrita na forma σ ∗ (α) = gdt, onde g = g(t) e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel definida no intervalo [a, b], que parametriza σ. A integral de α ao longo de σ e´ dada por Z Z Z b α= σ ∗ (α) = gdt, σ
[a,b]
a
que e´ a integral usual da func¸a˜ o g no intervalo [a, b]. A integral de α ao longo do um encadeamento (6.1) de U e´ definida pela f´ormula Z Z Z α = c1 α + · · · + ck α. c1 σ1 +···+ck σk
σ1
σk
Se F : U → Rn e´ um campo de vetores e E e´ um encadeamento em U , a integral Z Z F = τF , E
E
e´ conhecida como a integral de linha de F ao longo de E. 7. Exerc´ıcios 1. Considere as curvas parametrizadas no intervalo (−1, 1) dadas abaixo. Determine os pontos em que sua tangente n˜ao est´a bem definida e esboce a curva em cada caso. (a) C(t) = (t2 , t3 ); (b) C(t) = (t2 − t, t3 ); (c) C(t) = (2 sen(3πt + 1)), 3 sen(2πt + 4)). 2. Parametrize as seguintes curvas alg´ebricas usando coordenadas polares. Em cada caso, a e b s˜ao constantes positivas. (a) x2 /a2 + y 2 /b2 = 1; (b) ((x − a)2 + y 2 )((x + a)2 + y 2 ) = b4 ; (c) (y − a)2 (x2 + y 2 ) = b2 y 2 .
54
2. 1-FORMAS
3. Esboce cada uma das curvas cuja equac¸a˜ o polar e´ dada abaixo e escreva a equac¸a˜ o param´etrica correspondente. (a) r = a cos(θ); (b) r = a(1 + cos(θ)); (c) r = 4a cos3 (θ/3. 4. Calcule o trabalho dos campos abaixo nos caminhos indicados. (a) (x2 − 2xy, y 2 − 2xy) ao longo da par´abola y = x2 , entre (−2, 4) e (1, 1); (b) (x, y, xz p− y) no segmento de reta que vai da origem a (1, 2, 4); (c) (x, y)/ x2 + y 2 na circunferˆencia de raio 2 e centro na origem, orientada no sentido anti-hor´ario; (d) (xy, x) na par´abola x = 2y 2 , do ponto (2, −1), ao ponto (8, 2); (e) (x2 y 2 , xy 2 ) no caminho fechado formado por partes das retas x = 1 e √ y = 0, e da par´abola y = x, percorrido em sentido anti-hor´ario. 5. Seja F (x, y) = (cxy, x6 y 2 ), um campo polinomial definido em todo o plano, onde c e´ uma constante positiva. Sejam a e b n´umeros reais positivos. Ache um valor de a, em termos de c, para o qual a integral de F ao longo de y = axb , da origem a` reta x = 1 e´ independente de b. 6. Calcule α(p, u) para (a) α = cos(x1 )dx1 + sen(x22 )dx3 , p = (1, 0, 0), u = (1, 1, 1); (b) α = ex2 dx1 +log(x3 )dx2 −cos(x1 x2 )dx3 , p = (1, 1, 1), u = (1, 1, 3); (c) α = x2 dx1 + x3 dx2 − x1 x2 dx3 , p = (1, 8, 7), u = (1, 4, 3); (d) α = cos(x1 x3 )dx1 + sen(x1 x3 )dx2 , p = (π, 8, 7), u = (1, 5, 1); 7. Seja U uma regi˜ao de Rn e α uma 1-forma diferencial em U . Mostre que se f : U → R e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel, ent˜ao a aplicac¸a˜ o de U × Rn em R definida por (f α)(p, v) = f (p)α(p, v), onde p ∈ U e v ∈ Rn , e´ uma 1-forma em U . 8. Seja U uma regi˜ao de Rn . Mostre que Ω1 (U ) e´ um espac¸o vetorial sobre R. 9. Calcule a diferencial total de cada uma das seguintes func¸o˜ es de R3 : (a) x2 y 4 + 5z 7 + xz 3 ; (b) cos(z) tan(x + y); (c) cos(x + y + z); (d) log(xyz); (e) exp(x cos(y)). 10. Seja T o operador linear de R3 cuja matriz na base canˆonica e´ 2 3 4 1 2 −3 . 7 −5 2
7. EXERC´ICIOS
55
Calcule as imagens inversas das 1-formas dx1 ,
3dx1 + 2dx2 − 2dx3 e dx1 + dx2 + dx3 ,
por T . 11. Calcule as imagens inversas das 1-formas cos(x1 )dx1 + sen(x22 )dx3
e
ex2 dx1 + log(x3 )dx2 − cos(x1 x2 )dx3 ,
pelas seguintes aplicac¸o˜ es: (a) φ(t) = (t2 , t3 , t4 ); (b) φ(s, t) = (t cos(s), t2 et , t3 ); (c) φ(u, v, w) = (uvw, uv, u2 ); (d) φ(u, v, w) = (u, v, uw); (e) φ(u, v, w) = (cos(uvw), v, exp(u2 )). 12. Escreva na forma de um 1-encadeamento um caminho cont´ınuo cujas c´elulas s˜ao todas as arestas do cubo [0, 1] × [0, 1] × [0, 1]. E´ poss´ıvel fazer isto de modo que cada 1-c´elula tenha multiplicidade um? 13. Explique porque a curva parametrizada C(t) descrita abaixo n˜ao e´ uma 1c´elula e escreva-a na forma de um 1-encadeamento. t (2 − 2π , 0) se 0 ≤ t ≤ 2π (cos(5t), sen(5t)) se 2π ≤ t ≤ 4π C(t) = (2 cos(t), 2 sen(t)) se 4π ≤ t ≤ 5π (−2 + (t − 5π), 3(t − 5π)) se 5π ≤ t ≤ 8π 14. Calcule a integral do campo (x, y 2 , 4z 3 ) ao longo do caminho obtido como o encadeamento do segmento de reta que vai de (0, 0, 0) a (1, 1, 0), seguido do segmento que vai deste u´ ltimo ponto a (1, 1, 2). 15. Calcule as integrais das 1-formas de R2 dadas abaixo, nos encadeamentos indicados: (a) xydx + xdy na espiral r = θ, com 0 ≤ θ ≤ 3π; (b) x2 y 2 dx + xy 2 dy no encadeamento r = | cos(θ)|, com 0 ≤ θ ≤ 3π. (c) (x2 y 2 +x+1)dx+xy 2 dy no encadeamento fechado formado por partes √ das retas x = 1 e y = 0, e da par´abola y = x, orientado no sentido anti-hor´ario; (d) (x2 + y)dx + (x − y 2 )dy no encadeamento formado pelos lados do retˆangulo [0, 3] × [0, 2], percorrido no sentido anti-hor´ario; (e) (x2 − y 2 )dx + xdy no encadeamento fechado, formado pelos eixos coordenados e pelo arco de x2 +y 2 = 9 contido no primeiro quadrante, orientado no sentido anti-hor´ario.
56
2. 1-FORMAS
16. Calcule as integrais das 1-formas de R3 dadas abaixo, nos encadeamentos indicados: (a) (x − 2x3 y)dx + (y 3 − 2xy)dy + dz na intersec¸a˜ o de z = x2 + y 2 e y = 0 entre os pontos (−2, 0, 4) e (1, 0, 1); (b) xyzdx + y 2 dy + (xz − y)dz no segmento de reta que vai da origem a ao ponto (1, 2, 4); (c) (x2 −y 2 )dx+xdy+(xy+z)dz na circunferˆencia de equac¸o˜ es x2 +y 2 = 4 e z = 0, orientada no sentido hor´ario (para quem olha de cima); (d) xydx + xdy na curva r = z = θ, com 0 ≤ θ ≤ 3π. 17. Considere o campo definido em R2 por F (x, y) = (x2 y, xy 2 ). (a) Este campo admite func¸a˜ o potencial? √ √ (b) Calcule a integral de F entre a origem O e o ponto P = (1/ 2, 1/ 2) ao longo do segmento de reta que vai de O a P . (c) Calcule a integral de F entre O e P ao longo do encadeamento do segmento de reta que vai de O a (1, 0), seguido do arco de circunferˆencia que vai de (1, 0) a P . (d) Compare os valores das integrais ao longo destes dois caminhos. 18. Calcule o potencial de cada um dos campos centrais dados abaixo. Para p simplificar a notac¸a˜ o escreveremos r = x2 + y 2 + z 2 . (a) (x, y, z)/r3 ; (b) (r2 + r + 1)(x, y, z); (c) (cos(r) + 7 cos(r) sen(r))(x, y, z). 19. Seja α = a1 dx1 + · · · + an dxn uma 1-forma diferencial definida em uma regi˜ao U de Rn . Mostre que se aj e´ func¸a˜ o apenas de xj , ent˜ao α e´ uma forma diferencial exata. 20. Traduza o exerc´ıcio anterior em termos de campos conservativos. 21. Seja α uma 1-forma f dx definida em [0, 1], com f (0) = f (1). Mostre que existe um u´ nico n´umero k, de modo que α − kdx = dg, para alguma func¸a˜ o g : [0, 1] → R, que satisfaz g(0) = g(1). ˜ : integre α − kdx = dg em [0, 1] para achar k. S UGEST AO
8. PROBLEMAS
57
8. Problemas 1. Seja σ uma 1-c´elula em R3 . Defina uma 1-forma diferencial ds por ds(p, v) = T (p) · v, onde T (p) e´ o vetor tangente a p ∈ σ. Note que esta forma s´o est´a definida para pontos de σ. (a) Discuta a forma ds a` luz da definic¸a˜ o de 1-forma dada no §2.1. (b) Mostre que a integral de ds sobre σ e´ igual ao comprimento de σ. (c) Seja f uma func¸a˜ o definida em uma regi˜ao contendo σ. Expresse a integral da 1-forma f ds em σ em termos da integral de uma func¸a˜ o de uma vari´avel (o parˆametro de σ). 2. Seja U uma regi˜ao de Rn . Dado um campo de vetores F em U , defina uma aplicac¸a˜ o ιF : Ω1 (U ) → O(U ), por ιF (α)(p) = α(p, F ), para uma forma α e um ponto p ∈ U . (a) Calcule ιF (α)(p) quando p = (x1 , . . . , xn ) e α = a1 dx1 +· · ·+an dxn . (b) Mostre que ιF e´ uma transformac¸a˜ o linear. (c) Calcule ι∇f (α) e ιF (df ) onde f ∈ O(U ). (d) Calcule ιF (τF ). (e) Seja R = (x1 , x2 , x3 ) o campo radial de R3 . Mostre que se f e´ um polinˆomio homogˆeneo de grau k nas vari´aveis x1 , x2 e x3 , ent˜ao ιE (df ) = kf. Lembre-se que um polinˆomio f nas vari´aveis x1 , x2 e x3 e´ homogˆeneo se todas os seus monˆomios tˆem grau total igual a k. Isto e´ , a soma do graus de cada uma das vari´aveis d´a k para cada um dos monˆomios de f. 3. Seja S(U ) o conjunto das 1-c´elulas definidas em uma regi˜ao U ⊆ Rn e seja F(U ) o grupo abeliano livre cuja base e´ o conjunto S(U ). Considere o subgrupo P(U ) de F(U ) gerado pelos σ ∈ S(U ) cuja imagem e´ um ponto. (a) Mostre que se α ∈ Ω1 (U ), ent˜ao a aplicac¸a˜ o Iα : F(U ) → R, definida por Z Iα (σ) =
α σ
e´ um homomorfismo de grupos. (b) Mostre que P(U ) est´a contido no n´ucleo de Iα , qualquer que seja α ∈ Ω1 (U ). (c) Defina o conjunto E1 (U ) dos 1-encadeamentos contidos em U como sendo o grupo quociente F(U )/P(U ) e mostre que Iα induz um homomorfismo de E1 (U ) em R.
Cap´ıtulo 3 2-formas Neste segundo cap´ıtulo discutimos a noc¸a˜ o de 2-forma diferencial. Seguiremos um roteiro semelhante ao do cap´ıtulo 2. Assim, na primeira sec¸a˜ o introduzimos 2-formas a partir da noc¸a˜ o de fluxo. J´a a integral de uma 2-formas ser´a definida na sec¸a˜ o 3. A sec¸a˜ o 4 e´ dedicada a uma vers˜ao do teorema de Stokes e suas interpretac¸o˜ es em an´alise vetorial (teorema de Green). Finalmente, aplicamos estes resultados a problemas de f´ısica na sec¸a˜ o 5, e revisamos todo o conte´udo do cap´ıtulo na sec¸a˜ o 6.
1. Fluxo Vamos imaginar um fluido incompress´ıvel que escorre ao longo de uma calha. Incompress´ıvel, naturalmente, significa que o fluido n˜ao pode ser comprimido. Podemos formalizar isto dizendo que a densidade do fluido e´ constante ao longo de toda a calha e n˜ao varia no tempo. Imagine, agora, que vocˆe tem uma moldura de arame plana, com qualquer forma desejada, mas que est´a vazada. Digamos que a largura m´axima da moldura e´ menor que a profundidade e largura da calha, de modo que podemos imergi-la completamente no fluido. O fluxo do fluido atrav´es da moldura e´ a quantidade de l´ıquido que atravessa a a´ rea limitada pela moldura. Interpretaremos a quantidade de fluido em termos de volume. Entretanto, como estamos supondo que o fluido e´ incompress´ıvel, poder´ıamos falar igualmente em massa; para isto, bastaria multiplicar o volume pela densidade do fluido em todas as nossas equac¸o˜ es. Nosso objetivo nesta sec¸a˜ o e´ criar um modelo matem´atico para a noc¸a˜ o de fluxo. H´a, entretanto, um detalhe importante que precisa ser levado em conta. Caso a superf´ıcie seja fechada–uma caixa oca, por exemplo–o fluxo atrav´es da caixa e´ igual a` diferenc¸a entre a quantidade de l´ıquido que entra e que sai da caixa. Para que isto fac¸a sentido, precisamos ser capazes de associar um sinal ao fluxo, para que possamos identificar onde o l´ıquido entra na caixa, e onde sai da caixa. Portanto, para que o fluxo atrav´es de uma superf´ıcie fechada n˜ao dˆe nulo e´ preciso que haja ou uma fonte, ou um sorvedouro, dentro da superf´ıcie. Como a maneira mais natural de definir fluxo e´ mesmo em termos de um fluido incompress´ıvel, vocˆe e´ convidado a imaginar que os campos de vetores descritos nesta sec¸a˜ o s˜ao todos campos de velocidades.
59
60
3. 2-FORMAS
1.1. Fluxo de um campo constante. Seja F : R3 → R3 um campo de vetores constante–que estaremos imaginando ser um campo de velocidades. Suponhamos que o vetor constante F (p) e´ paralelo ao eixo z. Queremos definir o fluxo de F atrav´es de um retˆangulo R = [0, `] × [0, h]. Comec¸amos com o caso em que R est´a contido em um plano paralelo a z = 0. Digamos que R tem largura ` (medida ao longo de x) e comprimento h (medido ao longo de y). Neste caso, todo o l´ıquido contido no paralelep´ıpedo de base R e altura |F (p)|t (medida ao longo de z) atravessa R no tempo t. Em outras palavras, o fluxo deste campo atrav´es de R ser´a ΦF (R) = |F (p)|h`, que e´ a quantidade de l´ıquido que atravessa o retˆangulo por unidade de tempo. Mantendo o campo constante, vamos inclin´a-lo de um aˆ ngulo θ em relac¸a˜ o ao eixo z. Ao fazer isto, a quantidade de fluido que atravessa R no tempo t passa a ser igual ao volume de um prisma. Tomando a base do prisma como sendo o retˆangulo de lados ` e h, sua altura ser´a igual a |F (p)|t sen(θ). Portanto, neste caso, o fluxo de F atrav´es de R e´ ΦF (R) = |F (p)|h` sen(θ). Existe uma outra maneira de calcular o volume do prisma que e´ mais conveniente para os nossos prop´ositos. Em primeiro lugar, o retˆangulo R fica completamente determinado pelos vetores v1 = `e2 , v2 = he2 ; ao passo que a altura do prisma e´ dada pela projec¸a˜ o do vetor v3 = F (0) ao longo da vertical, que e´ igual a F (0) · e3 . Portanto, o volume do prisma e´ h`(F (0) · e3 ) = F (0) · (h`e3 ). Contudo, como v1 e v2 s˜ao ortogonais, v1 × v2 = (h`e3 ). Assim, o fluxo atrav´es do retˆangulo R e´ dado por (1.1)
ΦF (R) = F (0) · (v1 × v2 ),
que e´ o produto misto destes trˆes vetores. Uma vantagem de expressar o fluxo desta maneira e´ que a f´ormula 1.1 vale, n˜ao importa qual seja a posic¸a˜ o relativa dos vetores v1 , v2 e F . Tomaremos este produto misto como sendo a definic¸a˜ o do fluxo do campo constante F , atrav´es do paralelograma definido pelos vetores ortogonais v1 e v2 .
1. FLUXO
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Note que definimos o valor do fluxo como sendo o produto misto, e n˜ao o seu m´odulo. Este e´ um ponto importante. Considere, por exemplo, o que acontece se calculamos o fluxo de um campo constante atrav´es do cubo [0, 1] × [0, 1]. Se o campo e´ definido por F = e3 , ent˜ao o fluxo pelas faces do cubo perpendiculares ao plano z = 0 vai dar zero. J´a o fluxo pela face contida em z = 0 d´a 1, e o fluxo pela face contida em z = 1 d´a −1. Assim o fluxo total atrav´es do cubo d´a zero. Isto e´ exatamente o que esper´avamos. Afinal, conforme observamos no in´ıcio desta sec¸a˜ o, o fluxo atrav´es de uma superf´ıcie fechada ser´a zero sempre que n˜ao houver uma fonte ou sorvedouro de fluido dentro da superf´ıcie. Expressar o fluxo como o produto misto tamb´em tem a vantagem de que passa a ser f´acil calcul´a-lo a partir das coordenadas dos vetores. Se vj = (aj , bj , cj ), para 1 ≤ j ≤ 2, e F = (F1 , F2 , f3 ), ent˜ao, F1 (v1 × v2 ) · v3 = det a1 a2
F2 b1 b2
F3 c1 , c2
como aprendemos no curso b´asico de geometria anal´ıtica. Mais detalhes podem ser encontrados em [12, pp. 21–24]. Para simplificar a notac¸a˜ o denotaremos o determinante acima por det[F, v1 , v2 ]. 1.2. Propriedades do fluxo. Suponhamos, agora, que F seja um campo vetorial qualquer definido em uma regi˜ao U de R3 . Se p ∈ U e v1 e v2 s˜ao vetores de R3 , ent˜ao podemos escrever det[F (p), v1 , v2 ]. Contudo “poder escrever” n˜ao basta. O que queremos mesmo saber e´ se este n´umero serve para alguma coisa ou, melhor ainda, se tem uma interpretac¸a˜ o f´ısica. Mas, se os vetores v1 e v2 tiverem comprimento muito pequeno, o n´umero det[F (p), v1 , v2 ] nos d´a uma aproximac¸a˜ o para o fluxo atrav´es do retˆangulo determinado por v1 e v2 em p, mesmo quando o campo n˜ao for constante. Em outras palavras, det[F (p), v1 , v2 ] representa uma aproximac¸a˜ o do fluxo nas proximidades de p. Com isto em mente, estudaremos as propriedades de det[F (p), v1 , v2 ] como func¸a˜ o de p e dos vetores v1 e v2 . Para facilitar a discuss˜ao escreveremos ΦF (p, v1 , v2 ) = det[F (p), v1 , v2 ], o que nos d´a uma aplicac¸a˜ o ΦF : U × R3 × R3 → R. Se p ∈ U for fixado, obtemos a partir de ΦF a aplicac¸a˜ o (ΦF )p0 : Rn × Rn → R,
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3. 2-FORMAS
definida por (ΦF )p0 (v, w) = ΦF (p0 , v, w) = det[F (p0 ), v, w]. Apelando para as propriedades do determinante, vemos que (ΦF )p0 satisfaz • (ΦF )p0 (v, w + w0 ) = (ΦF )p0 (v, w) + (ΦF )p0 (v, w0 ), e • (ΦF )p0 (v, kw) = k(ΦF )p0 (v, w). Uma aplicac¸a˜ o com estas propriedades e´ chamada de bilinear, porque e´ linear em cada uma de suas entradas (pressupondo que a outra entrada esteja fixa!). Uma aplicac¸a˜ o bilinear bem conhecida nossa e´ o produto interno entre dois vetores. Entretanto, ao contr´ario do que ocorre com o produto interno, (ΦF )p0 n˜ao e´ sim´etrica; isto e´ , seu valor n˜ao e´ independente da ordem em que os vetores aparecem no argumento. Isto ocorre porque o determinante troca de sinal quando permutamos duas de suas linhas. Portanto, (ΦF )p0 (w, v) = det[F (p0 ), w, v] = − det[F (p0 ), v, w], que por sua vez e´ igual a (ΦF )p0 (v, w). Logo, (ΦF )p0 (w, v) = −(ΦF )p0 (v, w). Por isso, dizemos que (ΦF )p0 e´ alternada. Assim, Propriedade 1: ΦF e´ bilinear e alternada em suas duas u´ ltimas entradas, desde que a primeira entrada assuma um valor fixo. Apelando para uma outra propriedade dos determinantes, a expans˜ao em co-fatores, podemos decompor ΦF (p, v, w) de uma maneira mais ou menos canˆonica. Expandindo o determinante pela primeira linha a2 a3 a1 a3 a1 a2 (1.2) ΦF (p, v, w) = F1 det −F2 det +F3 det b2 b3 b1 b3 b1 b2 Supondo que os vetores v e w estejam fixos, ΦF (p, v, w) e´ uma combinac¸a˜ o linear dos coeficientes de F . Como estes coeficientes s˜ao diferenci´aveis, o mesmo vale para ΦF (p, v, w) como func¸a˜ o de p. Portanto, Propriedade 2: ΦF e´ diferenci´avel em sua primeira entrada, desde que as duas u´ ltimas entradas assumam valores fixos. Qualquer aplicac¸a˜ o U × R3 × R3 → R, que satisfac¸a as propriedades 1 e 2, destacadas acima, e´ chamada de 2-forma diferencial. Agora que sabemos o que e´ uma 2-forma, podemos introduzir a notac¸a˜ o tradicionalmente usada para denot´a-las. Para 1 ≤ i 6= j ≤ 3 definimos dxi ∧ dxj como sendo a 2-forma de R3 dada pelo determinante det[(−1)k ek , v, w], onde i 6= k 6= j. Por sua vez, este determinante e´ o menor 2×2 obtido da matriz [(−1)k ek , v, w] pela eliminac¸a˜ o da primeira linha e da k-´esima coluna. Por exemplo, 1 0 0 a a3 dx2 ∧ dx3 (v, w) = a1 a2 a3 = 2 b 2 b3 b 1 b2 b3
1. FLUXO
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Em geral, temos (1.3)
1 dxi ∧ dxj (ek , e` ) = −1 0
se i = k e j = ` se i = ` e j = k em qualquer outro caso.
Usando esta notac¸a˜ o podemos escrever (1.11) como (1.4)
ΦF = F1 dx2 ∧ dx3 − F2 dx1 ∧ dx3 + F3 dx1 ∧ dx2 .
Diremos que esta e´ a 2-forma associada ao fluxo do campo F . Como j´a atribu´ımos um significado a dx1 , dx2 e dx3 (como 1-formas), e´ dif´ıcil resistir a` tentac¸a˜ o de pensar em dx1 ∧ dx2 , dx1 ∧ dx3 e dx2 ∧ dx3 como “produtos” destas 1-formas. E´ dif´ıcil, e n˜ao e´ necess´ario, porque, como veremos, e´ poss´ıvel definir uma multiplicac¸a˜ o de 1-formas. Mas isto fica para a sec¸a˜ o ????. Vejamos o que acontece se aplicamos a definic¸a˜ o de 2-forma ao R2 . Seja V uma regi˜ao de R2 , e η uma aplicac¸a˜ o V × R2 × R2 → R, que e´ diferenci´avel com respeito a` primeira, e bilinear alternada com respeito a` s duas u´ ltimas entradas. Tome p ∈ V e dois vetores v = a1 e1 + a2 e2 e w = b1 e1 + b2 e2 . Vamos calcular η(q, v, w) = η(q, a1 e1 + a2 e2 , b1 e1 + b2 e2 ). Como η e´ bilinear, η(q, v, w) = a1 b1 η(q, e1 , e1 )+a1 b2 η(q, e1 , e2 )+a2 b1 η(q, e2 , e1 )+a2 b2 η(q, e2 , e2 ). Mas η tamb´em e´ alternada, o que implica que η(q, e2 , e1 ) = −η(q, e1 , e2 ), e tamb´em que η(q, e1 , e1 ) = η(q, e2 , e2 ) = 0. Temos, portanto, que (1.5)
η(q, v, w) = (a1 b2 − a2 b1 )η(q, e1 , e2 ),
onde g(p) = η(q, e1 , e2 ) e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel definida em V . Denotando por s e t as coordenadas de R2 , podemos definir ds ∧ dt como sendo a 2-forma de R2 que satisfaz ds ∧ dt(v, w) = det[v, w] = a1 b2 − a2 b1 . Usando esta notac¸a˜ o, (1.14) nos d´a a igualdade (1.6)
η = gds ∧ dt.
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3. 2-FORMAS
1.3. Superf´ıcies parametrizadas. At´e agora tratamos apenas de como calcular o fluxo de um campo constante atrav´es de um retˆangulo. Mas nossa meta e´ definir fluxo para um campo qualquer atrav´es de uma superf´ıcie n˜ao necessariamente plana. Para isso, precisamos delimitar o que deve ser entendido quando usarmos a palavra superf´ıcie. Antes, por´em, precisamos descobrir como estas superf´ıcies ser˜ao utilizadas. Por isso, comec¸aremos descrevendo a estrat´egia a ser adotada para definir fluxo no caso geral. Usando a definic¸a˜ o de trabalho sobre uma curva como inspirac¸a˜ o, iniciaremos aproximando a superf´ıcie por retˆangulos. Al´em disso, assumiremos que os retˆangulos escolhidos s˜ao pequenos o suficiente para que o campo possa ser considerado como constante sobre cada um deles. Sob estas hip´oteses podemos calcular o fluxo atrav´es de cada retˆangulo, cuja soma nos dar´a uma aproximac¸a˜ o para o fluxo atrav´es de toda a superf´ıcie. Passando ao limite, obteremos uma f´ormula integral para o fluxo. Nossa experiˆencia com o caso do trabalho de um campo sugere que, para facilitar a aproximac¸a˜ o por retˆangulos, seria prefer´ıvel introduzir superf´ıcies de maneira parametrizada, e e´ exatamente isto que faremos aqui. Tomando a definic¸a˜ o de curva como ponto de partida, definimos uma superf´ıcie parametrizada de R3 como sendo uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel S : [a, a0 ] × [b, b0 ] → R3 , onde a < a0 e b < b0 s˜ao n´umeros reais. Como sempre n˜ao estamos fazendo uma distinc¸a˜ o clara entre a aplicac¸a˜ o S e sua imagem, muito embora a superf´ıcie propriamente dita corresponda ao conjunto de pontos de R3 que forma a imagem de S. Como no caso de curvas, trabalhar com uma superf´ıcie parametrizada S tem a vantagem de permitir que a aproximac¸a˜ o de S por uma malha de retˆangulos seja f´acil de fazer. Para isto, subdividimos [a, a0 ] em m partes iguais, e [b, b0 ] em n partes iguais, onde m e n s˜ao inteiros positivos. Assim, [a, a0 ] × [b, b0 ] fica subdividido em mn retˆangulos de largura `=
(a0 − a) m
e altura
(b0 − b) , n que correspondem aos produtos cartesianos de cada uma das partes em que dividimos os dois intervalos. Escrevendo h=
ai = a + i` e bi = b + jh onde 0 ≤ i ≤ m e 0 ≤ j ≤ n, temos que o retˆangulo resultante do produto do subintervalo [ai , ai+1 ] de [a, a0 ], com o subintervalo [bj , bj+1 ],
1. FLUXO
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de [b, b0 ] pode ser parametrizado como (1 − t1 − t2 )(ai , bj ) + t1 (ai+1 , bj ) + t2 (ai , bj+1 ), onde 0 ≤ t1 , t2 ≤ 1. Aplicando os v´ertices deste retˆangulo do plano sobre a superf´ıcie S, obtemos os retˆangulos Ri,j (S) definidos por (1 − t1 − t2 )S(ai , bj ) + t1 S(ai+1 , bj ) + t2 S(ai , bj+1 ), onde 0 ≤ t1 , t2 ≤ 1. Na verdade, Ri,j (S) fica completamente determinado pelos vetores S(ai+1 , bj ) − S(ai , bj ) e S(ai , bj+1 ) − S(ai , bj ), que definem dois de seus lados adjacentes. Em particular, Ri,j (S) n˜ao e´ a imagem de um retˆangulo do plano por S. Para simplificar a terminologia, diremos que Rij (S) e´ um S-retˆangulo, e que o conjunto Rm,n = {Rij (S) : 0 ≤ i ≤ m e 0 ≤ j ≤ n}, de todos os S-retˆangulos correspondentes a uma certa escolha de inteiros positivos m e n, determina uma subdivis˜ao da superf´ıcie. Entretanto, deve ficar claro que os S-retˆangulos que estamos considerando s˜ao planos, e sabemos apenas que seus v´ertices est˜ao sobre a superf´ıcie. Em outras palavras, n˜ao e´ estritamente verdade que S fica subdividida pelos Rij (S), j´a que os pontos destes retˆangulos n˜ao est˜ao totalmente contidos na imagem de S. Por exemplo, ao subdividir uma calota esf´erica em S-retˆangulos temos um efeito semelhante ao que obter´ıamos colando pastilhas de revestimento de parede na superf´ıcie interna da calota. Ali´as, o exemplo da calota e´ muito bom, porque pode ser facilmente explicitado usando coordenadas esf´ericas. Considerando a calota como tendo raio um e centro na origem, sua parametrizac¸a˜ o S : [0, 2π] × [0, π] → R3 , ser´a dada por S(θ, φ) = ( sen(φ) cos(θ), sen sen(θ), cos(φ)). O quadrado [0, π/4] × [0, π/2] e´ levado por esta parametrizac¸a˜ o em R0,0 (S) = (1 − u − v)(0, 0, 1)+ u( sen(0) cos(π/2), sen(0) sen(π/2), cos(0))+ v( sen(π/4) cos(0), sen(π/4) sen(0), cos(π/4)) que e´ igual a
√ 2 2 , 0, ). R0,0 (S) = (0, 0, 1)(1 − u − v) + u(0, 1, 0) + u( 2 2 Outro exemplo e´ dado pela superf´ıcie do cilindro parab´olico, definida por √
Sc (s, t) = (s, s2 , t), onde 0 ≤ s, t ≤ 1.
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3. 2-FORMAS
Tomando n = 4, como acima, temos 1 1 1 R0,0 (Sc ) = (0, 0, 0)(1 − u − v) + u( , , 0) + v(0, 0, ), 4 16 4 ao passo que 1 1 3 9 1 1 1 R1/2,0 (Sc ) = (1 − u − v)( , , 0) + u( , , 0) + v( , , ). 2 4 4 16 2 4 4 ´ de uma superf´ıcie. Seja U uma regi˜ao de R3 e 1.4. Fluxo atraves F : U → R3 um campo de vetores. Queremos calcular o fluxo de F atrav´es de uma superf´ıcie parametrizada S : [a, a0 ] × [b, b0 ] → R3 , onde a < a0 e b < b0 s˜ao n´umeros reais. Recapitulando a estrat´egia, j´a descrita no §1.3, devemos, primeiramente, subdividir a superf´ıcie em S-retˆangulos. Supondo os retˆangulos suficientemente pequenos, assumiremos que o campo pode ser considerado constante sobre todo o retˆangulo. Com isto, podemos calcular o fluxo atrav´es de um retˆangulo a partir do valor do campo em um de seus v´ertices. Somando todos estes valores temos uma aproximac¸a˜ o do valor do fluxo sobre toda a superf´ıcie. Mas esta aproximac¸a˜ o e´ tanto melhor quanto maiores s˜ao m e n. Portanto, tomando o limite quando m e n tendem a infinito obteremos o valor exato, que ser´a representado por uma integral dupla. Para executar esta estrat´egia em detalhes, comec¸amos escolhendo os inteiros positivos m e n, e costruindo a subdivis˜ao Rm,n da superf´ıcie em Sretˆangulos. Utilizando a notac¸a˜ o introduzida no n´umero 1.3, o fluxo atrav´es do retˆangulo Rij (S) ser´a det[F (ai , bj ), ∆1 (i, j), ∆2 (i, j)]. onde ∆1 (i, j) = S(ai+1 , bj ) − S(ai , bj ) = S(ai + `, bj ) − S(ai , bj ) ao passo que ∆2 (i, j) = S(ai , bj+1 ) − S(ai , bj ) = S(ai , bj + h) − S(ai , bj ), para 1 ≤ i ≤ m e 1 ≤ j ≤ n. Somando sobre toda a superf´ıcie, obtemos uma soma dupla (1.7)
n−1 X m−1 X
det[F (ai , bj ), ∆1 (i, j), ∆2 (i, j)].
j=0 i=0
que corresponde a uma aproximac¸a˜ o do fluxo ΦF (S) do campo F calculado sobre toda a superf´ıcie S.
1. FLUXO
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Como o determinante e´ linear relativamente a cada uma de suas linhas, podemos reescrever (1.7) como (1.8)
n−1 X m−1 X j=0 i=0
det[F (ai , bj ),
∆1 (i, j) ∆2 (i, j) , ]`h, ` h
onde ` e´ largura e h a altura de cada um dos retˆangulos da malha em que [a, a0 ] × [b, b0 ] foi subdividido. Com isto, a aproximac¸a˜ o para o fluxo dada por (1.7) pode ser considerada como uma soma de Riemann. O pr´oximo passo consiste em passar ao limite, fazendo m e n tenderem a infinito. Entretanto, a` medida que o n´umero de quadrados cresce, seu tamanho diminui. Mais precisamente, ` e h tendem a zero quando m e n tendem a infinito. Contudo, ∂S S(s0 + `, t0 ) − S(s0 , t0 ) = (s0 , t0 ), `→0 ` ∂s onde s e t denotam os parˆametros de S. Esta notac¸a˜ o precisa ser interpretada com um certo cuidado. Geralmente falamos de derivadas parcias de func¸o˜ es de uma regi˜ao aberta em R. Por´em, S e´ uma aplicac¸a˜ o cujo contradom´ınio e´ R3 . Em outras palavras, lim
S(s, t) = (S1 (s, t), S2 (s, t), S3 (s, t)), onde S1 S2 e S3 s˜ao as func¸o˜ es coordenadas de S. Ent˜ao, a derivada parcial de S com relac¸a˜ o a s deve ser interpretada como sendo o vetor ∂S1 ∂S2 ∂S2 , , , ∂s ∂s ∂s j´a que o limite quando ` vai a zero est´a sendo tomado com relac¸a˜ o a cada coordenada. Sob esta mesma interpretac¸a˜ o, e´ f´acil mostrar que ∂S S(s0 , t0 + h) − S(s0 , t0 ) = (s0 , t0 ), h ∂t Portanto, ao tomar o limite quando m e n tendem a infinito, a aproximac¸a˜ o dada pela dupla soma de Riemann (1.8) tende para a integral dupla Z a0 Z b0 ∂S ∂S det F (S(s, t)), (s, t), (s, t) dsdt. ∂s ∂s a b lim
h→0
Sempre que n˜ao houver o risco de confus˜ao, omitiremos os nomes dos parˆametros da notac¸a˜ o. Fazendo isto na express˜ao acima, ela se simplifica para Z a0 Z b0 ∂S ∂S (1.9) det F (S), , dsdt. ∂s ∂s a b Seja F = (x, y, z 2 ) um campo em R3 e σp : [0, 1] × [0, 2π] → R3 ,
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3. 2-FORMAS
parte da superf´ıcie de um parabol´oide parametrizado por (1.10)
σp (r, θ) = (r cos(θ), r sen(θ), r2 ).
Vamos determinar o fluxo de F atrav´es de σp utilizando (1.9). Para comec¸ar precisamos calcular a func¸a˜ o ∂σp ∂σp , , g(r, θ) = det σp , ∂r ∂θ que devemos integrar. Mas, para isto, precisamos conhecer as derivadas parcias de σp , ∂σp ∂σp = (cos(θ), sen(θ), 2r) e = (−r sen(θ), r cos(θ), 0). ∂r ∂θ Ent˜ao, r cos(θ) r sen(θ) z 2 sen(θ) 2r g(r, θ) = det cos(θ) −r sen(θ) r cos(θ) 0 que, feitos os os cancelamentos necess´arios, nos d´a g(r, θ) = (r5 − 2r3 ). Portanto, o fluxo de F atrav´es de σp e´ igual a` integral Z r Z 2π (r5 − 2r3 )drdθ. 0
0
Efetuando a integrac¸a˜ o, obtemos 6 1 2π r r4 2π − · θ = − . 6 2 0 3 0 1.5. Mudando a perspectiva. Procederemos exatamente como fizemos no §1.4. Assim, nosso primeiro objetivo e´ separar, no integrando do fluxo, o que cabe ao campo e o que cabe a` superf´ıcie. Sejam F : U → Rn um campo e S : [a, a0 ] × [b, b0 ] → U , uma superf´ıcie em uma regi˜ao U de Rn . Denotando por Fi e Si as func¸o˜ es coordenadas de F e S, respectivamente, o integrando ser´a F1 (S) F2 (S) F3 (S) γ(s, t) = det ∂S1 /∂s ∂S2 /∂s ∂S3 /∂s ∂S1 /∂t ∂S2 /∂t ∂S2 /∂t onde s e t s˜ao os parˆametros de S. Para isolar a contribuic¸a˜ o do campo F , da que corresponde a` superf´ıcie S criaremos duas func¸o˜ es. A primeira, GS : [a, a0 ] × [b, b0 ] → U × R3 × R3 e´ definida por GS (q, u, z) = (S(q), Jq (S)u, Jq (S)z), onde Jq (S) e´ a jacobiana de S em q; e a segunda ω : U × R3 × R3 → R
1. FLUXO
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por F1 ω(p, v, w) = det a1 b1
F2 a2 b2
F3 a3 b3
onde v = (a1 , a2 , a3 ) e w = (b1 , b2 , b3 ). Com isto, γ(q) = (ω · GF )(q, e1 , e2 ). E´ nas propriedades de ω que queremos nos concentrar, em primeiro lugar. Se p ∈ U for fixado, obtemos a partir de ω a aplicac¸a˜ o ωp0 : Rn × Rn → R, definida por ωp0 (v, w) = ω(p0 , v, w) = det[F (p0 ), v, w]. Apelando para as propriedades do determinante, vemos que ωp0 satisfaz • ωp0 (v, w + w0 ) = ωp0 (v, w) + ωp0 (v, w0 ), e • ωp0 (v, kw) = kωp0 (v, w). Uma aplicac¸a˜ o com estas propriedades e´ chamada de bilinear, porque e´ linear em cada uma de suas entradas (pressupondo que a outra entrada esteja fixa!). Uma aplicac¸a˜ o bilinear bem conhecida nossa e´ o produto interno entre dois vetores. Entretanto, ao contr´ario do que ocorre com o produto interno, ωp0 n˜ao e´ sim´etrica; isto e´ , seu valor n˜ao e´ independente da ordem em que os vetores aparecem no argumento. Isto ocorre porque o determinante troca de sinal quando permutamos duas de suas linhas. Portanto, ωp0 (w, v) = det[F, w, v] = − det[F, v, w], que por sua vez e´ igual a ωp0 (v, w). Logo, ωp0 (w, v) = −ωp0 (v, w). Por isso, dizemos que ωp0 e´ alternada. Assim, Propriedade 1: ω e´ bilinear e alternada em suas duas u´ ltimas entradas, desde que a primeira entrada assuma um valor fixo. Apelando para uma outra propriedade dos determinantes, a expans˜ao em co-fatores, podemos decompor ω(p, v, w) de uma maneira mais ou menos canˆonica. Expandindo o determinante pela primeira linha a a3 a a3 a a2 (1.11) ω(p, v, w) = F1 det 2 − F2 det 1 + F3 det 1 b2 b3 b1 b 3 b 1 b2 Supondo que os vetores v e w estejam fixos, ω(p, v, w) e´ uma combinac¸a˜ o linear dos coeficientes de F . Como estes coeficientes s˜ao diferenci´aveis, o mesmo vale para ω(p, v, w) como func¸a˜ o de p. Portanto, Propriedade 2: ω e´ diferenci´avel em sua primeira entrada, desde que as duas u´ ltimas entradas assumam valores fixos.
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3. 2-FORMAS
Qualquer aplicac¸a˜ o U × R3 × R3 → R, que satisfac¸a as propriedades 1 e 2, destacadas acima, e´ chamada de 2-forma diferencial. Agora que sabemos o que e´ uma 2-forma, podemos introduzir a notac¸a˜ o tradicionalmente usada para denot´a-las. Para 1 ≤ i 6= j ≤ 3 definimos dxi ∧ dxj como sendo a 2-forma de R3 dada pelo determinante det[ek , v, w], onde i 6= k 6= j. Por sua vez, este determinante e´ o menor 2 × 2 obtido da matriz [ek , v, w] pela eliminac¸a˜ o da primeira linha e da k-´esima coluna. Assim, por exemplo, 1 0 0 a2 a3 dx2 ∧ dx3 (v, w) = a1 a2 a3 = b2 b3 b1 b2 b3 Em geral, temos (1.12)
1 dxi ∧ dxj (ek , e` ) = −1 0
se i = k e j = ` se i = ` e j = k em qualquer outro caso.
Usando esta notac¸a˜ o podemos escrever (1.11) como (1.13)
ΦF = F1 dx2 ∧ dx3 − F2 dx1 ∧ dx3 + F3 dx1 ∧ dx2 .
Diremos que esta e´ a 2-forma associada ao fluxo do campo F . Como j´a atribu´ımos um significado a dx1 , dx2 e dx3 (como 1-formas), e´ dif´ıcil resistir a` tentac¸a˜ o de pensar em dx1 ∧ dx2 , dx1 ∧ dx3 e dx2 ∧ dx3 como “produtos” destas 1-formas. E´ dif´ıcil, e n˜ao e´ necess´ario, porque, como veremos, e´ poss´ıvel definir uma multiplicac¸a˜ o de 1-formas. Mas isto fica para a pr´oxima sec¸a˜ o. Vejamos o que acontece se aplicamos a definic¸a˜ o de 2-forma ao R2 . Seja V uma regi˜ao de R2 , e η uma aplicac¸a˜ o V × R2 × R2 → R, que e´ diferenci´avel com respeito a` primeira, e bilinear alternada com respeito a` s duas u´ ltimas entradas. Tome p ∈ V e dois vetores v = a1 e1 + a2 e2 e w = b1 e1 + b2 e2 . Vamos calcular η(q, v, w) = η(q, a1 e1 + a2 e2 , b1 e1 + b2 e2 ). Como η e´ bilinear, η(q, v, w) = a1 b1 η(q, e1 , e1 )+a1 b2 η(q, e1 , e2 )+a2 b1 η(q, e2 , e1 )+a2 b2 η(q, e2 , e2 ). Mas η tamb´em e´ alternada, o que implica que η(q, e2 , e1 ) = −η(q, e1 , e2 ), e tamb´em que η(q, e1 , e1 ) = η(q, e2 , e2 ) = 0.
1. FLUXO
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Temos, portanto, que η(q, v, w) = (a1 b2 − a2 b1 )η(q, e1 , e2 ),
(1.14)
onde g(p) = η(q, e1 , e2 ) e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel definida em V . Denotando por s e t as coordenadas de R2 , podemos definir ds ∧ dt como sendo a 2-forma de R2 que satisfaz ds ∧ dt(v, w) = det[v, w] = a1 b2 − a2 b1 . Usando esta notac¸a˜ o, (1.14) nos d´a a igualdade (1.15) η = gds ∧ dt. ´E chegada a hora de voltar nossa atenc¸a˜ o para a aplicac¸a˜ o composta ω·GS , que e´ conhecida como a imagem inversa de ω pela superf´ıcie parametrizada S, e denotada por S ∗ (ω). Se q e´ um ponto do retˆangulo onde S est´a definida, temos por (1.15) que S ∗ (ω) = ω(S, Jq (S)e1 , Jq (S)e2 )ds ∧ dt = γ(q)ds ∧ dt. Estes coment´arios nos ajudam a interpretar a noc¸a˜ o de integral de superf´ıcie na linguagem das formas diferenciais. Lembre-se que a integral de F atrav´es de S foi definida como sendo a integral da func¸a˜ o γ no retˆangulo R = [a, a0 ] × [b, b0 ]. Mas γ e´ o coeficiente da 1-forma S ∗ (ω). Reescrevendo tudo isto numa ordem mais direta: a integral da 2-forma ω ao longo de S, e´ a integral da 2forma S ∗ (ω) no retˆangulo R que, por sua vez, e´ a integral de γ neste mesmo retˆangulo. Isto e´ , Z Z Z a0 Z b0 ω= S ∗ (ω) = γdsdt. S
R
a
b
Como no caso de 1-formas, removemos o perigo de ambig¨uidade entre a integral da 2-forma γds ∧ dt e a integral dupla de γ declarando que uma e´ outra. Ou seja, definimos Z Z a0 Z b0 γds ∧ dt, como sendo igual a γdsdt. R
a
b
Com isto podemos generalizar a definic¸a˜ o acima para a integral de qualquer 2-forma sobre uma superf´ıcie. Se θ e´ uma 2-forma em U e S : [a, a0 ] × [b, b0 ] → U e´ uma superf´ıcie, definimos Z Z θ= S ∗ (θ). S
[a,a0 ]×[b,b0 ]
Como S ∗ (θ) = gds ∧ dt, para alguma func¸a˜ o diferenci´avel g, Z Z a0 Z S ∗ (θ) = [a,a0 ]×[b,b0 ]
a
b
b0
gdt,
72
3. 2-FORMAS
que e´ a integral usual de g no retˆangulo [a, a0 ] × [b, b0 ]. Note o paralelo entre as integrais de 1-formas e 2-formas, que relacionamos na tabela abaixo. Onde havia: trabalho 1-forma integral simples curva parametrizada C C(t) dC/dt
Temos agora: fluxo 2-forma integral dupla superf´ıcie parametrizada S S(s, t) ∂S/∂s e ∂S/∂t.
2. O caso geral Nesta sec¸a˜ o comec¸amos a sistematizar os conceitos introduzidos na sec¸a˜ o anterior. Iniciamos revisando alguns conceitos b´asicos de a´ lgebra linear. 2.1. Formas bilineares alternadas. Uma forma bilinear de Rn e´ uma aplicac¸a˜ o ω : Rn × Rn → R, que satisfaz a` seguinte condic¸a˜ o: dado um vetor v0 ∈ Rn , a aplicac¸a˜ o ωj : Rn → R, para j = 1, 2 obtida fixando-se a j-´esima coordenada de ω como sendo igual a v0 , e´ linear. Uma descric¸a˜ o mais expl´ıcita (por´em mais prolixa) consiste em dizer que, dados v0 , v1 , v2 ∈ Rn e k ∈ R, temos que • ω(v0 , v1 + kv2 ) = ω(v0 , v1 ) + kω(v0 , v2 ), e • ω(v1 + kv2 , v0 ) = ω(v1 , v0 ) + kω(v2 , v0 ). As formas bilineares ocorrem em abundˆancia em matem´atica, a comec¸ar pelo produto interno de Rn . Outro exemplo, que j´a fez sua aparic¸a˜ o na sec¸a˜ o anterior, e´ o determinante F1 F2 F3 det[F, v1 , v2 ] = det x1 y1 z1 , x2 y2 z2 onde F = (F1 , F2 , F3 ) e´ um vetor constante, ao passo que v1 = (x1 , y1 , z1 ) e v2 = (x2 , y2 , z2 ), s˜ao vetores quaisquer de R3 . Uma forma bilinear ω de Rn pode ser expressa, de maneira bastante concreta, se fixamos uma base β = {u1 , . . . , un }
2. O CASO GERAL
73
de Rn . Escrevendo v, w ∈ Rn como func¸a˜ o de β, obtemos (2.1)
v = a1 u1 + · · · + an un e w = b1 u1 + · · · + bn un ,
onde os as e os bs s˜ao n´umeros reais. Apelando, agora, para a linearidade de ω relativamente a` segunda entrada, temos que ω(v, w) = ω(v, b1 u1 + · · · + bn un ) nos d´a (2.2)
ω(v, w) = b1 ω(v, u1 ) + · · · + bn ω(v, un ).
Mas ω tamb´em e´ linear com relac¸a˜ o a` sua primeira entrada, de forma que ω(v, ui ) = ω(a1 u1 + · · · + an un , ui ) = a1 ω(u1 , ui ) + · · · + an ω(un , ui ), para cada 1 ≤ i ≤ n. Substituindo em (2.2), X (2.3) ω(v, w) = ai bj ω(ui , uj ). 1≤i,j≤n
Esta equac¸a˜ o pode ser reescrita em forma matricial como ω(v, w) = v t Ωβ w, onde Ωβ e´ a matriz n × n cuja entrada ij e´ ω(ui , uj ). H´a duas classes muito importantes de formas bilineares: as formas sim´etricas e as formas alternadas. Uma forma bilinear ω de Rn e´ sim´etrica se ω(v, w) = ω(w, v) para todo v, w ∈ Rn . Escolhendo, em particular, v = ui e w = uj , elementos de β, obtemos ω(ui , uj ) = ω(uj , ui ), quaisquer que sejam 1 ≤ i, j ≤ n. Isto implica que as entradas das posic¸o˜ es ij e ji de Ωβ s˜ao iguais. Em outras palavras, Ωβ e´ uma matriz sim´etrica: o que, ali´as, soa muito justo. O produto escalar e´ o exemplo mais conhecido de forma sim´etrica. Por outro lado, uma forma bilinear ω de Rn e´ alternada se ω(v, w) = −ω(w, v) para todo v, w ∈ Rn . As formas bilineares alternadas tamb´em s˜ao conhecidas como 2-formas constantes. A matriz Ωβ , da forma bilinear alternada ω relativamente a uma base β do Rn , e´ anti-sim´etrica, isto e´ , satisfaz Ωtβ = −Ωβ . Em particular, usando a notac¸a˜ o de (2.1), temos que X ω(v, w) = ω(ui , uj )(ai bj − aj bi ). 1≤i<j≤n
74
3. 2-FORMAS
Note que ai bj − aj bi e´ igual ao determinante da matriz 2 × 2 correspondente a` s colunas i e j da matriz a1 a2 · · · an . b 1 b2 · · · bn A aplicac¸a˜ o que associa ao par de vetores (v, w) o n´umero ai bj − aj bi tamb´em e´ uma 2-forma constante. Quando β e´ a base canˆonica de Rn , esta forma e´ denotada por dxi ∧ dxj . Neste caso, podemos escrever ω como X (2.4) ω= ω(ui , uj )dxi ∧ dxj . 1≤i<j≤n
Como as 2-formas constantes s˜ao aplicac¸o˜ es que tomam valores em R, podemos som´a-las da maneira usual. Isto, e´ , dadas duas formas constantes ω e θ, definimos (ω + θ)(v, w) = ω(v, w) + θ(v, w),
(2.5)
quaisquer que sejam v, w ∈ Rn . N˜ao h´a d´uvida de que esta f´ormula define uma aplicac¸a˜ o de Rn × Rn em R; a quest˜ao e´ se essa aplicac¸a˜ o e´ bilinear e alternada. Contudo, fixando v0 em (2.5), temos (ω + θ)(v0 , w) = ω(v0 , w) + θ(v0 , w). Mas, por definic¸a˜ o, ω(v0 , w) e θ(v0 , w) s˜ao aplicac¸o˜ es lineares, quando consideradas como func¸o˜ es de suas segundas entradas. Assim, (ω + θ)(v0 , w) e´ linear como func¸a˜ o de w. Um argumento semelhante mostra que ω + θ e´ linear como func¸a˜ o da primeira entrada, quando a segunda est´a fixa. Finalmente, (ω + θ)(w, v) = ω(w, v) + θ(w, v) = −ω(w, v) − θ(w, v); como isto e´ igual a −(ω + θ)(w, v), conclu´ımos que ω + θ tamb´em e´ alternada. Resumindo: a soma de duas 2-formas constantes e´ uma 2-forma constante. Encerramos este par´agrafo definindo a imagem inversa de uma 2-forma constante por uma aplicac¸a˜ o linear. Dada uma transformac¸a˜ o linear T : Rm → Rn , comec¸amos por definir uma aplicac¸a˜ o ∆ T : Rm × R m → Rn × R n , pela f´ormula ∆T (v, w) = (T (v), T (w)). Como T e´ linear, • ∆T (v1 + kv2 , w0 ) = ∆T (v1 , w0 ) + k∆T (v2 , w0 ); • ∆T (w0 , v1 + kv2 ) = ∆T (w0 , v1 ) + k∆T (w0 , v2 ), onde k e´ um escalar e v1 , v2 , w0 ∈ Rm . ˜ . Se ω e´ uma 2-forma constante em Rn , ent˜ao a composta P ROPOSIC¸ AO ω · ∆T e´ uma 2-forma constante em Rm .
2. O CASO GERAL
75
˜ . Sejam k um escalar e v1 , v2 , w0 ∈ Rm , ent˜ao D EMONSTRAC¸ AO (ω · ∆T )(v1 + kv2 , w0 ) = ω · ∆T (v1 , w0 ) + kω · ∆T (v2 , w0 ); ao passo que (ω · ∆T )(v1 , w0 ) e´ igual a ω(T (v1 ), T (w0 )) = −ω(T (w0 ), T (v1 )) = −(ω · ∆T )(w0 , v1 ), donde (ω · ∆T )(v1 , w0 ) = −(ω · ∆T )(w0 , v1 ). Portanto, ω · ∆T e´ uma 2-forma constante em Rm , como desej´avamos mostrar. Nos pr´oximos par´agrafos generalizaremos tudo isto para 2-formas n˜ao constantes, definidas sobre uma regi˜ao aberta de Rn . 2.2. 2-formas diferenciais. Seja U uma regi˜ao de Rn . Uma 2-forma diferencial em U e´ uma aplicac¸a˜ o α : U × Rn × Rn → R, que satisfaz a` s seguintes condic¸o˜ es: (1) fixando p0 ∈ U , e considerando ω(p0 , v, w) como func¸a˜ o apenas de v e w, temos uma aplicac¸a˜ o bilinear alternada de Rn × Rn em R; (2) fixando v0 , w0 ∈ Rn , e considerando ω(p, v0 , w0 ) como func¸a˜ o apenas de p, temos uma func¸a˜ o diferenci´avel de U em R. Como no caso de 1-formas, optamos por uma definic¸a˜ o livre de coordenadas para as 2-formas diferenciais. Por isso devemos comec¸ar descobrindo como escrever uma 2-forma em termos de coordenadas; como, ali´as, j´a fizemos para o caso de dimens˜ao trˆes no §1.5. Seja p ∈ U . De acordo com a propriedade (1), a aplicac¸a˜ o ωp : Rn × Rn → R, definida por ωp (v, w) = ω(p, v, w), e´ uma 2-forma constante. Assumindo que os vetores v e w foram expressos em termos de suas coordenadas na base canˆonica, segue da equac¸a˜ o (2.4) que X ωp = aij (p)dxi ∧ dxj . 1≤i<j≤n
Por´em, como dxi ∧ dxj (ei , ej ) = 1, temos ω(p, ei , ej ) = aij (p). Portanto, pela propriedade (2) da definic¸a˜ o de 2-forma diferencial, aij : U → R, s˜ao func¸o˜ es diferenci´aveis definidas em U . Conclu´ımos, portanto, que toda 2-forma diferencial definida em uma regi˜ao U do Rn pode ser escrita na forma X ω= aij dxi ∧ dxj . 1≤i<j≤n
76
3. 2-FORMAS
onde aij = aij (x1 , . . . , xn ) s˜ao func¸o˜ es diferenci´aveis em U . Por outro lado, como e´ f´acil verificar, qualquer aplicac¸a˜ o da forma acima satisfaz (1) e (2). O conjunto das 2-formas diferenciais definidas em uma regi˜ao aberta U de Rn ser´a denotado por Ω2 (U ). H´a v´arias operac¸o˜ es que podemos definir em Ω2 (U ), a mais simples das quais e´ a soma. Sejam ω e θ 2-formas diferenciais em U , a soma ω + θ e´ definida em um ponto (p, v, w) ∈ U × Rn × Rn por (2.6)
(ω + θ)(p, v, w) = ω(p, v, w) + θ(p, v, w).
Para que esta definic¸a˜ o seja u´ til, e´ preciso que ω + θ tamb´em seja uma 2-forma diferencial em U , e n˜ao apenas uma aplicac¸a˜ o qualquer. Mas isto e´ f´acil de verificar usando as propriedades (1) e (2), como veremos a seguir. Fixando p ∈ U , podemos reescrever (2.6) na forma (ω + θ)(p, v, w) = (ωp + θp )(v, w). Por´em, como vimos no §2.1, a soma de 2-formas constantes e´ uma 2-forma constante. Portanto, ω + θ e´ bilinear alternada, o que prova (1). Passando, agora, a` segunda propriedade, fixamos dois vetores v0 e w0 do Rn , e consideramos (ω + θ)(p, v0 , w0 ) = ω(p, v0 , w0 ) + θ(p, v0 , w0 ), como func¸a˜ o de p. Mas ω(p, v0 , w0 ) e θ(p, v0 , w0 ) s˜ao ambas diferenci´aveis como func¸o˜ es de p, e a soma de func¸o˜ es diferenci´aveis e´ diferenci´avel. Assim, (ω+θ)(p, v0 , w0 ) e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel de p, o que prova (2). Um c´alculo simples mostra que se X X ω= aij dxi ∧ dxj e θ = bij dxi ∧ dxj , 1≤i<j≤n
1≤i<j≤n
ent˜ao ω+θ =
X
(aij + bij )dxi ∧ dxj
1≤i<j≤n
como, ali´as, seria de esperar. Procedendo de maneira semelhante, podemos mostrar que, se ω e´ uma 2forma diferencial em U e f ∈ O(U ), ent˜ao a aplicac¸a˜ o de U × Rn × Rn em R definida por (f ω)(p, v, w) = f (p)ω(p, v, w), onde p ∈ U e v, w ∈ Rn tamb´em e´ uma 2-forma diferencial. Mais uma vez, isto e´ facilmente expresso em termos de coordenadas pela f´ormula X fω = (f aij )dxi ∧ dxj . 1≤i<j≤n
Um caso particular da multiplicac¸a˜ o de uma 2-forma por uma func¸a˜ o ocorre quando a func¸a˜ o e´ constante. Neste caso o que temos e´ o produto de um escalar por uma 2-forma. Assim, podemos somar 2-formas diferenci´aveis e multiplic´alas por escalares. Com um pouco de paciˆencia e´ poss´ıvel verificar que estas operac¸o˜ es satisfazem todas as propriedades requeridas para fazer de Ω2 (U ) um espac¸o vetorial sobre R. Este e´ um fato que usaremos com freq¨ueˆ ncia ao
2. O CASO GERAL
77
longo deste livro; t˜ao frequentemente que raramente chamaremos a atenc¸a˜ o para o que estamos fazendo. 2.3. Produto exterior. Como j´a observamos no par´agrafo 1.5, a notac¸a˜ o dxi ∧ dxj sugere uma interpretac¸a˜ o desta 2-forma como um produto. Neste par´agrafo, introduzimos uma noc¸a˜ o de multiplicac¸a˜ o de formas que nos permitir´a formalizar esta interpretac¸a˜ o. Mais precisamente, dada uma regi˜ao U ⊆ Rn , desejamos inventar uma operac¸a˜ o que, a cada par de 1-formas em U , associa uma 2-forma, tamb´em definida em U . Sejam α e β 1-formas diferenciais definidas em U , definimos o produto exterior α ∧ β em um ponto (p, v, w) ∈ U × Rn × Rn pela f´ormula (α ∧ β)(p, v, w) = det
α(p, v) α(p, v) . β(p, w) β(p, w)
E´ importante vocˆe notar que h´a uma correlac¸a˜ o entre a ordem em que as 1-formas e os vetores aparecem em (α ∧ β)(p, v, w) e sua posic¸a˜ o no determinante. Afinal, qualquer variac¸a˜ o na ordem das linhas ou colunas far´a o determinante mudar de sinal. Por exemplo, α(p, w) α(p, w) α(p, v) α(p, w) (α ∧ β)(p, w, v) = det = − det β(p, v) β(p, v) β(p, v) β(p, w) que, por sua vez, e´ igual a −(α ∧ β)(p, v, w). Portanto, (α ∧ β)(p, w, v) = −(α ∧ β)(p, v, w). Em particular, α ∧ β e´ alternada. Para mostrar que α ∧ β e´ bilinear, suponhamos que v 0 e´ um outro vetor do n R e que k e´ um escalar, ent˜ao α(p, v + kv 0 ) α(p, w) (α ∧ β)(p, v + kv 0 , w) = det . β(p, v + kv 0 ) β(p, w) Pela linearidade de α e de β, (α ∧ β)(p, v + kv 0 , w) = det
α(p, v) + kα(p, v 0 ) α(p, w) . β(p, v) + kα(p, v 0 ) β(p, w)
Mas, este u´ ltimo determinante e´ igual a` soma α(p, v) α(p, w) α(p, v 0 ) α(p, w) det + k det . β(p, v) β(p, w) α(p, v 0 ) β(p, w) Transcrevendo esta equac¸a˜ o em termos de ∧, obtemos (α ∧ β)(p, v + kv 0 , w) = (α ∧ β)(p, v, w) + k(α ∧ β)(p, v 0 , w). Um argumento an´alogo, mostra que (α ∧ β)(p, v, w + kw0 ) = (α ∧ β)(p, v, w) + k(α ∧ β)(p, v 0 , w0 ). Portanto, α ∧ β satisfaz a propriedade (1).
78
3. 2-FORMAS
Por outro lado, se fixarmos v e w, as entradas do determinante passam a ser func¸o˜ es diferenci´aveis em U . Como somas e produtos de func¸o˜ es diferenci´aveis tamb´em s˜ao diferenci´aveis, o determinante e´ diferenci´avel como func¸a˜ o de p. Isto prova a propriedade (2). Como j´a hav´ıamos provado (1), podemos concluir que a aplicac¸a˜ o α ∧ β acima definida e´ uma 2-forma diferenci´avel em U . Portanto, o produto exterior define uma aplicac¸a˜ o Ω1 (U ) × Ω1 (U ) → Ω2 (U ), e, como tal, pode ser considerada como uma operac¸a˜ o, que a cada par de 1formas associa uma 2-forma. Tendo chegado a este ponto, podemos nos perguntar se a 2-forma dxi ∧ dxj , definida como o produto exterior de dxi por dxj coincide com a 2-forma de mesmo nome definida no §1.5. Para isto, basta mostrar que o produto de dxi por dxj satisfaz (1.12), j´a que isto define completamente o valor de uma 2-forma em qualquer par de vetores. Mas, por definic¸a˜ o, o produto exterior de dxi por dxj no par (ek , e` ) vale dxi (ek ) dxi (e` ) det . dxj (ek ) dxj (e` ) Escrevendo δik
( 1 = 0
se i = k se i = 6 k
temos que
δik δi` , δjk δj` j´a que dxi captura a i-´esima coordenada de um vetor, e dxj sua j-´esima coordenada. Mas, 1 se i = k e j = ` δik δj` − δi` δjk = −1 se i = ` e j = k 0 em qualquer outro caso det
como desej´avamos mostrar. 2.4. Propriedades do produto exterior. Agora que sabemos que ∧ e´ uma operac¸a˜ o que entrelac¸a duas 1-formas para produzir uma 2-forma; devemos nos perguntar quais s˜ao as propriedades de uma tal operac¸a˜ o. Comec¸amos com a comutatividade. Sejam α1 e α2 1-formas diferenciais definidas em uma regi˜ao U do Rn . Vamos calcular α2 ∧ α1 e compar´a-lo a α1 ∧ α2 . Se p ∈ U e v, w ∈ Rn , ent˜ao α2 (p, v) α2 (p, w) (α2 ∧ α1 )(p, v, w) = det . α1 (p, v) α1 (p, w) Como o determinante troca de sinal quando permutamos duas de suas linhas, α1 (p, v) α1 (p, w) (α2 ∧ α1 )(p, v, w) = − det , α2 (p, v) α2 (p, w)
2. O CASO GERAL
79
que e´ igual a −(α1 ∧ α2 )(p, v, w). Mas esta igualdade vale para qualquer escolha de p ∈ U e v, w ∈ R3 , de modo que podemos concluir que (2.7)
α2 ∧ α1 = −(α1 ∧ α2 ).
Em particular a operac¸a˜ o ∧ n˜ao e´ comutativa. Como nada pior que uma troca de sinal acontece, quando os termos s˜ao transpostos, dizemos que ∧ e´ anti-comutativa. A anti-comutatividade de ∧ tem um efeito colateral inesperado. Por exemplo, tomando α1 = α2 em (2.7), verificamos que α1 ∧ α1 = −(α1 ∧ α1 ). Mas isto s´o pode ocorrer se α1 ∧ α1 = 0. Portanto, (2.8)
α∧α=0
para toda 1-forma diferencial α. A segunda propriedade que abordaremos e´ a distributividade. Conservando a notac¸a˜ o anterior, seja α3 uma terceira 1-forma em U e k ∈ R, ent˜ao (α1 + kα2 )(p, v) (α1 + kα2 )(p, w) ((α1 + kα2 ) ∧ α3 )(p, v, w) = det α3 (p, v) α3 (p, w) Como (α1 + kα2 )(p, v) = α1 (p, v) + kα2 (p, v) para todo p ∈ U e v ∈ Rn , temos que α1 (p, v) + kα2 (p, v) α1 (p, w) + kα2 (p, w) ((α1 +kα2 )∧α3 )(p, v, w) = det . α3 (p, v) α3 (p, w) Mas este determinante e´ igual a α (p, v) α1 (p, w) α (p, v) α2 (p, w) det 1 + k det 2 , α3 (p, v) α3 (p, w) α3 (p, v) α3 (p, w) donde, ((α1 + kα2 ) ∧ α3 )(p, v, w) = (α1 ∧ α3 )(p, v, w) + k(α2 ∧ α3 )(p, v, w). Como esta igualdade vale para qualquer escolha de p ∈ U e v, w ∈ Rn , podemos concluir que (α1 + kα2 ) ∧ α3 = α1 ∧ α3 + k(α2 ∧ α3 ). Logo, ∧ e´ distributiva. H´a uma propriedade da operac¸a˜ o usual de multiplicac¸a˜ o que ainda n˜ao abordamos com relac¸a˜ o ao produto exterior. Trata-se da associatividade, que equivale a perguntar se (α1 ∧ α2 ) ∧ α3 = α1 ∧ (α2 ∧ α3 ). Contudo, α1 ∧ α2 e´ uma 2-forma que, do lado esquerdo da equac¸a˜ o, est´a sendo multiplicada pela 1-forma α3 . Entretanto, um tal produto nunca foi definido: tudo o que sabemos e´ multiplicar duas 1-formas. Portanto, pelo menos por
80
3. 2-FORMAS
enquanto, esta propriedade est´a fora do nosso alcance pela falta dos conceitos apropriados. 2.5. Diferencial de 1-formas. Podemos aproveitar o que fizemos na sec¸a˜ o anterior para definir a diferencial de uma 1-forma. Lembre-se que no §2.3 do cap´ıtulo 2 definimos a diferencial de uma func¸a˜ o como sendo uma certa 1-forma. Neste par´agrafo pretendemos estender este conceito, da maneira mais natural poss´ıvel, para as 1-formas: o resultado, naturalmente, ser´a uma 2forma. Mais precisamente, queremos construir uma aplicac¸a˜ o d : Ω1 (U ) → Ω2 (U ), onde U e´ uma regi˜ao de Rn . Usando o produto exterior, podemos escrever uma 1-forma α definida em U como n X (2.9) ai dxi , α= j=1
onde ai ∈ O(U ) para 1 ≤ i ≤ n. Como a diferencial de uma func¸a˜ o e´ uma transformac¸a˜ o linear, e´ razo´avel supor que a diferencial de uma 1-forma pelo menos se distribui sobre uma soma. Mas, isto implica que d(α) =
n X
d(ai dxi ),
j=1
de forma que basta definir d(ai dxi ) para cada 1 ≤ i ≤ n. Tomando como inspirac¸a˜ o os c´alculos do par´agrafo anterior, definiremos d(ai dxi ) = d(ai ) ∧ d(dxi ). Portanto, d(α) =
n X
d(ai ) ∧ d(dxi ),
j=1
e´ uma 2-forma em U como desej´avamos. Agora que temos uma definic¸a˜ o, resta-nos verificar se e´ satisfat´oria. Por exemplo, o que ocorre se calculamos a diferencial de f α, onde f ∈ O(U )? Vejamos: escrevendo α como na equac¸a˜ o (2.9), temos fα =
n X
(f ai )dxi ,
j=1
donde d(f α) =
n X
d(f ai )dxi .
j=1
Contudo, d(f ai ) = f dai + ai df para cada 1 ≤ i ≤ n.
2. O CASO GERAL
81
Assim, n X
d(f ai ) ∧ dxi =
j=1
n X
(f dai ∧ dxi + ai df ∧ dxi );
j=1
e pondo f e df em evidˆencia, n X
d(f ai ) ∧ dxi = f
j=1
n X
n X dai ∧ dxi + df ∧ ( ai dxi ).
j=1
j=1
Portanto, (2.10)
d(f α) = f dα + df ∧ α,
de forma que esta diferencial satisfaz uma relac¸a˜ o an´aloga a` f´ormula de Leibniz. Esta e´ uma boa not´ıcia porque, al´em da linearidade, a f´ormula de Leibniz foi a u´ nica propriedade da diferencial de func¸o˜ es que provamos no cap´ıtulo 2. Por falar em linearidade, ainda n˜ao sabemos se a diferencial e´ linear. E´ verdade que distribui sobre uma soma, j´a que esta propriedade foi usada implicitamente em sua definic¸a˜ o. Mas ser´a que respeita o produto por escalar? Para verificar isto, seja k ∈ R. Considerando k como uma func¸a˜ o constante, podemos usar (2.10), de modo que d(kα) = kd(α) + d(k) ∧ α. Levando em conta que d(k) = 0, temos d(kα) = kd(α); o que completa a prova da linearidade da diferencial. Estendendo a terminologia usada para 1-formas, dizemos que uma 2-forma em U e´ exata se pode ser escrita como dα, para algum α ∈ Ω1 (U ). Como j´a ocorreu no caso de 1-formas, n˜ao e´ verdade que toda 2-forma e´ exata. De fato, isto est´a muito longe de ser verdade. Entretanto, para poder provar que uma dada forma n˜ao e´ exata, precisamos de um teorema de que ainda n˜ao dispomos. Por isso vamos esperar o §5.7 para poder dar um exemplo de uma 2-forma que n˜ao e´ exata. Por falar em formas exatas, o que ocorre se calcularmos a diferencial de uma 1-forma exata? Para isto, considere f ∈ O(U ). Calculando sua diferencial, temos n X ∂f dxi ; df = ∂xi i=1 que, por sua vez, tem diferencial (2.11)
d(df ) =
n X i=1
d(
∂f ) ∧ dxi , ∂xi
Contudo, n
d(
X ∂2f ∂f )= dxj . ∂xi ∂xi ∂xj j=1
82
3. 2-FORMAS
Substituindo em (2.11), e levando em conta a anti-comutatividade do produto exterior, X ∂2f ∂2f d(df ) = − dxi ∧ dxj . ∂xi ∂xj ∂xj ∂xi 1≤i<j≤n
Por´em, como f e´ diferenci´avel em todas as ordens, temos que ∂2f ∂2f = ∂xi ∂xj ∂xj ∂xi para todo 1 ≤ i < j ≤ n; donde d(df ) = 0. Na linguagem da a´ lgebra linear, mostramos que toda 1-forma exata pertence ao n´ucleo da transformac¸a˜ o linear d : Ω1 (U ) → Ω2 (U ). Entretanto, nem sempre e´ verdade que o n´ucleo desta transformac¸a˜ o e´ sempre igual ao conjunto das 1-formas exatas. Por isso, precisamos de uma palavra diferente para designar as 1-formas que pertencem ao n´ucleo de d; diremos que s˜ao formas fechadas. Nesta terminologia, mostramos que toda forma exata e´ fechada. Por outro lado, embora seja f´acil dar exemplos de formas fechadas que n˜ao s˜ao exatas, esbarramos novamente com a falta de uma ferramenta adequada para provar que uma dada forma n˜ao e´ exata. Por isso, este exemplo tamb´em vai ter que esperar at´e o §5.7. J´a no §5.6 provaremos que toda forma fechada definida em uma regi˜ao convexa e´ exata. Resumindo, estendemos neste par´agrafo a noc¸a˜ o de diferencial para o caso de 1-formas. Mais precisamente, definimos uma transformac¸a˜ o linear d : Ω1 (U ) → Ω2 (U ). que satisfaz d(f α) = df ∧ α. De fato, esta propriedade, juntamente com a linearidade deerminam completamente a aplicac¸a˜ o d. Vimos tamb´em que o n´ucleo de d cont´em o conjunto formado por todas as 1-formas exatas, e afirmamos (sem contudo dar exemplos) que estes dois conjuntos nem sempre s˜ao iguais. 2.6. Imagem inversa. E´ chegada a hora de introduzir o conceito de imagem inversa de uma 2-forma por uma aplicac¸a˜ o diferencial. Antes, por´em, precisamos de um resultado de a´ lgebra linear elementar. Seja V uma regi˜ao de Rm , e seja φ : V → Rn uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel. Escrevendo φ em termos de suas func¸o˜ es coordenadas, temos que φ(p) = (φ1 (p), . . . , φn (p)), para todo p ∈ V . Sabemos que φ e´ diferenci´avel se, e somente se, cada uma das func¸o˜ es coordenadas φj : V → R para 1 ≤ j ≤ n, e´ diferenci´avel. A derivada de φ em um ponto p ∈ V corresponde a` matriz jacobiana Jp (φ).
2. O CASO GERAL
83
Generalizando o roteiro j´a utilizado no §1.5, definimos uma func¸a˜ o Gφ : V × Rm × Rm → Rn × Rn × R n , por Gφ (p, v, w) = (φ(p), Jp (φ)v, Jp (φ)w), onde p ∈ V e v, w ∈ Rm . Note que Gφ e´ diferenci´avel como func¸a˜ o de suas m primeiras coordenadas e linear como func¸a˜ o das 2m u´ ltimas coordenadas. Suponha, agora, que a imagem de φ est´a contida em uma regi˜ao U de Rn , na qual est´a definida uma 2-forma diferencial ω. Neste caso a imagem de Gφ est´a contida em U × Rn × Rn , de modo que faz sentido calcular a composta de ω com Gφ . A imagem inversa de ω por φ, denotada por φ∗ (ω), e´ definida por φ∗ (ω) = ω · Gφ . Portanto, se p ∈ U e v, w ∈ Rm , φ∗ (ω)(p, v, w) = ω(φ(p), Jp (φ)v, Jp (φ)w). Pela definic¸a˜ o de composta, φ∗ (ω) e´ uma aplicac¸a˜ o de V × Rm × Rm em R. Mas ainda precisamos mostrar que e´ uma 2-forma diferencial em V . Para isto, basta verificar as condic¸o˜ es (1) e (2) da definic¸a˜ o de 2-forma enunciada no §2.2. Digamos que o ponto p0 ∈ V foi fixado. Ent˜ao, quaisquer que sejam v, w ∈ Rm temos φ∗ (ω)(p0 , v, w) = (ωp0 ) · ∆Jp0 (φ) (v, w). Mas, fixado p0 , ω|φ(p0 ) e´ uma 2-forma constante, de forma que (1) e´ conseq¨ueˆ ncia da proposic¸a˜ o da sec¸a˜ o 2. Por outro lado, fixando os vetores v0 , w0 ∈ Rm , temos que φ∗ (ω)(p, v0 , w0 ) = ω(p, Jp (φ)v0 , Jp (φ)w0 ), qualquer que seja p ∈ V . Podemos considerar esta express˜ao como sendo a composta de ω com hφ , a aplicac¸a˜ o de V em U × Rm × Rm definida pela regra hφ (p) = Gφ (p, v0 , w0 ) = (φ(p), Jp (φ)v0 , Jp (φ)w0 ). Como a jacobiana e´ diferenci´avel como func¸a˜ o de p, o mesmo vale para hφ . Contudo, ω e´ diferenci´avel em func¸a˜ o de p, e linear nas outras entradas, de modo que e´ diferenci´avel como aplicac¸a˜ o em U ×Rm ×Rm . Como a composta de aplicac¸o˜ es diferenci´aveis e´ diferenci´avel, podemos concluir que a propriedade (2) vale para φ∗ (ω). Em particular, φ∗ (ω) e´ uma 2-forma diferencial em V. E´ claro que, se φ definir uma superf´ıcie parametriz´avel, ent˜ao esta definic¸a˜ o coincide com a do §1.5. Outro exemplo importante e´ o da imagem inversa de dxi ∧ dxj por uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel qualquer, onde x1 , . . . , xn s˜ao as coordenadas de Rn . Mais uma vez, seja V um aberto de Rm e φ : V → Rn uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel. Por definic¸a˜ o, Gφ (p, er , es ) = (φ(p), Jp (φ)er , Jp (φ)es ),
84
3. 2-FORMAS
onde p ∈ V e er e es s˜ao vetores da base canˆonica de Rm . Mas isto implica que (2.12) φ∗ (dxi ∧ dxj )(p, er , es ) = (dxi ∧ dxj )(Jp (φ)er , Jp (φ)es ). Contudo, denotando por y1 , . . . , ym as coordenadas de Rm relativamente a` sua base canˆonica, temos que ∂φi /∂yr e´ a i-´esima coordenada de Jp (φ)er e ∂φj /∂ys a j-´esima coordenada de Jp (φ)es . Substituindo isto em (2.12), obtemos ∂φj ∂φi ∂φj ∂φi (p) (p) − (p) (p) dyr ∧ dys . φ∗ (dxi ∧ dxj )(p, er , es ) = ∂yr ∂ys ∂ys ∂yr Supondo que p e´ constante, podemos usar (2.4) para escrever X ∂φi ∂φj ∂φi ∂φj φ∗ (dxi ∧ dxj )|p = (p) (p) − (p) (p) dyr ∧ dys , ∂yr ∂ys ∂ys ∂yr 1≤r<s≤m
donde (2.13)φ∗ (dxi ∧ dxj ) =
X 1≤r<s≤m
∂φi ∂φj ∂φi ∂φj − ∂yr ∂ys ∂ys ∂yr
dyr ∧ dys .
Utilizando o produto exterior, podemos reescrever esta f´ormula de maneira muito mais compacta. De fato como n n X X ∂φi ∂φi dφi = dyr e dφj = dys , ∂yr ∂ys i=1 i=1 temos que dφi ∧ dφj e´ igual ao lado direito de (2.13), donde (2.14)
φ∗ (dxi ∧ dxj ) = dφi ∧ dφj .
2.7. Propriedades da imagem inversa. Seja φ : V → U uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel, onde V e U s˜ao regi˜oes de Rm e Rn , respectivamente. Usando a notac¸a˜ o introduzida no §2.2 para o espac¸o das 2-formas diferenciais sobre uma regi˜ao, podemos dizer que a imagem inversa nos d´a uma aplicac¸a˜ o φ∗ : Ω2 (U ) → Ω2 (V ). Observe que φ tem V como dom´ınio e U como contradom´ınio, ao passo que em φ∗ estas duas regi˜oes aparecem com suas posic¸o˜ es trocadas, como j´a acontecia no caso de 1-formas. Como Ω2 (U ) e Ω2 (V ) s˜ao espac¸os vetoriais, e´ razo´avel perguntar se φ∗ e´ uma transformac¸a˜ o linear. A resposta e´ sim, como e´ f´acil de verificar. Se ω1 e ω2 s˜ao 2-formas diferenciais em U e k e´ um escalar, ent˜ao φ∗ (ω1 + kω2 ) = (ω1 + kω2 ) · Gφ . Mas, da definic¸a˜ o de soma de formas, isto e´ igual a ω1 · Gφ + k(ω2 · Gφ ); que pode ser reescrito como φ∗ (ω1 ) + kφ∗ (ω2 ),
2. O CASO GERAL
85
provando, assim, a linearidade de φ∗ . O produto de uma 2-forma por um escalar e´ apenas um caso especial do produto por uma func¸a˜ o. Como vimos em 2.1, se g : U → R e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel e ω uma 2-forma na regi˜ao U , ent˜ao a f´ormula (2.15) (gω)(p, v, w) = g(p)ω(p, v, w), para todo p ∈ U e v ∈ Rn , define uma nova 2-forma diferencial em U . Vejamos o que acontece se calculamos a imagem inversa de gω pela aplicac¸a˜ o diferenci´avel φ : V → U dada acima. Por definic¸a˜ o, temos que φ∗ (gω)(p, v, w) = (gω)(φ(p), Jp (φ)v, Jp (φ)w). Mas, pela f´ormula (2.15), (gω)(φ(p), Jp (φ)v, Jp (φ)w) = g(φ(p))ω(φ(p), Jp (φ)v, Jp (φ)w); isto e´ , (gω)(φ(p), Jp (φ)v, Jp (φ)w) = (g · φ)(p)φ∗ (ω)(p, v, w). Como φ∗ (g) = g · φ, φ∗ (gω) = φ∗ (g)φ∗ (ω), onde a justaposic¸a˜ o indica o produto da func¸a˜ o φ∗ (g) pela 2-forma φ∗ (ω), ambas definidas sobre V . As propriedades descritas at´e aqui nos permitem dar uma f´ormula bastante compacta, al´em de muito u´ til, para a imagem inversa de uma 2-forma em termos de coordenadas. Digamos que x1 , . . . , xn s˜ao as coordenadas de Rn , e que φ1 , . . . , φn s˜ao as func¸o˜ es coordenadas de φ. Neste caso, se a 2-forma diferencial ω se escreve como X ω= aij dxi ∧ dxj , 1≤i<j≤n
ent˜ao, temos que φ∗ (ω) =
X
φ∗ (aij )φ∗ (dxi ∧ dxj )
1≤i<j≤n
pela linearidade da imagem inversa. Mas, por (2.14), φ∗ (dxi ∧ dxj ) = φ∗ (dxi ) ∧ φ∗ (dxj ). Combinando isto com a equac¸a˜ o (2.5) da p´agina 84, obtemos φ∗ (dxi ∧ dxj ) = dφi ∧ dφj . Finalmente, (2.16)
φ∗ (ω) =
X
φ∗ (aij )dφi ∧ dφj ,
1≤i<j≤n
que e´ a f´ormula desejada. J´a identificamos como a imagem inversa de 2-formas se comporta com relac¸a˜ o a` soma e ao produto por uma func¸a˜ o. Precisamos, agora, descobrir como se relaciona com o produto exterior.
86
3. 2-FORMAS
˜ . Sejam U ⊆ Rn e V ⊆ Rm regi˜oes abertas. Se α e β s˜ao P ROPOSIC¸ AO 1-formas definidas em U e φ : V → U e´ uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel, ent˜ao φ∗ (α ∧ β) = φ∗ (α) ∧ φ∗ (β). ˜ . Como vimos no §2.1, as 1-formas α e β podem ser D EMONSTRAC¸ AO escritas como n n X X α= ai dxi e β = bi dxi , i=1
i=1
onde ai , bi ∈ O(U ) para 1 ≤ i ≤ n. Multiplicando estas formas X α∧β = (ai bj − aj bi )dxi ∧ dxj . 1≤i<j≤n
Por (2.16), a imagem inversa desta 2-forma por φ e´ X φ∗ (α ∧ β) = (φ∗ (ai )φ∗ (bj ) − φ∗ (aj )φ∗ (bi ))dφi ∧ dφj , 1≤i<j≤n
que, por sua vez e´ igual a n n X X ( φ∗ (ai )dφi ) ∧ ( φ∗ (bj )dφj ). i=1
j=1
Mas esta express˜ao e´ igual a φ∗ (α) ∧ φ∗ (β), completando, assim, a demonstrac¸a˜ o da proposic¸a˜ o.
A u´ ltima propriedade diz respeito a` imagem inversa por uma aplicac¸a˜ o composta. Sejam ψ:W →V e φ:V →U aplicac¸o˜ es diferenci´aveis, onde W , V e U s˜ao regi˜oes de Rk , Rm e Rn , respectivamente. Queremos calcular (φ · ψ)∗ (ω), onde ω e´ uma 2-forma definida em U . Mas, (φ · ψ)∗ (ω)(p, v, w) = ω((φ · ψ)(p), Jp (φ · ψ)(v), Jp (φ · ψ)(w)). Contudo, pela regra da cadeia para func¸o˜ es de mais de uma vari´avel Jp (φ · ψ) = Jψ(p) (φ)Jp (ψ). Assim, (φ · ψ)∗ (ω)(p, v, w) = ω((φ · ψ)(p), Jψ(p) (φ)Jp (ψ)(v), Jψ(p) (φ)Jp (ψ)(w)) que e´ igual a φ∗ (ω)(ψ(p), Jp (ψ)(v), Jp (ψ)(w)); que, por sua vez, e´ ψ ∗ (φ∗ (ω))(p, v, w). Portanto, (φ · ψ)∗ (ω) = ψ ∗ (φ∗ (ω)).
˜ DE 2-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
87
Note a invers˜ao das posic¸o˜ es de φ e ψ quando passamos de um lado para o outro da equac¸a˜ o como, ali´as, j´a acontecia para 1-formas. Vamos encerrar enunciando, de maneira sistem´atica, todas as propriedades da imagem inversa de formas. Seja φ : U → V uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel entre regi˜oes U ⊆ Rm e V ⊆ Rn . Propriedade 1: A imagem inversa φ∗ : Ω2 (U ) → Ω2 (V ) e´ uma transformac¸a˜ o linear entre espac¸os vetoriais. Propriedade 2: Se ω ∈ Ω1 (U ) e f : U → R e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel, ent˜ao φ∗ (f ω) = φ∗ (f )φ∗ (ω). Propriedade 3: Se ω, η ∈ Ω1 (U ), ent˜ao φ∗ (ω ∧ η) = φ∗ (ω) ∧ φ∗ (η). Propriedade 4: Se ψ : W → U e´ uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel em uma regi˜ao aberta W ⊆ Rk e ω ∈ Ω2 (V ), ent˜ao (φ · ψ)∗ (ω) = ψ ∗ (φ∗ (ω)). ˜ de 2-formas 3. Integrac¸ao J´a estamos de posse de toda a maquinaria necess´aria para definir a integral de uma 2-forma diferencial qualquer sobre uma superf´ıcie. ´ 3.1. 2-celulas e fronteiras. E´ hora de formalizar a noc¸a˜ o de superf´ıcie parametrizada. Sejam a < a0 , b < b0 e > 0 n´umeros reais e R = [a, a0 ] × [b, b0 ], um retˆangulo fechado. Uma 2-c´elula de Rn e´ uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel σ : (a − , a0 − ) × (b − , b0 − ) → Rn , onde > 0 e´ um n´umero real. Como de h´abito, n˜ao distinguiremos claramente entre a aplicac¸a˜ o σ e a imagem de R por σ. Para os prop´ositos deste livro uma superf´ıcie e´ simplesmente uma 2-c´elula, e os dois termos ser˜ao usados de maneira intercambi´avel de agora em diante. Todos temos uma noc¸a˜ o intuitiva do que significa a fronteira (tamb´em conhecida como margem ou borda) de uma superf´ıcie. Sabemos tamb´em que nem toda superf´ıcie tem fronteira: um plano, porque se estende infinitamente em todas as direc¸o˜ es; uma esfera, porque e´ fechada. Nossa meta e´ formalizar este conceito para o caso de 2-c´elulas. Vamos comec¸ar com o pr´oprio retˆangulo de parˆametros R = [a, a0 ] × [b, b0 ].
88
3. 2-FORMAS
Um ponto est´a na fronteira de R se pertence a um dos quatro lados do retˆangulo, a saber L1 = [a, a0 ] × {b} L2 = {a0 } × [b, b0 ] L3 = [a, a0 ] × {b0 } L4 = {a} × [b, b0 ].
(3.1)
Cada um destes lados corresponde a um intervalo da reta real que foi transladado de sua posic¸a˜ o sobre o eixo, e podemos parametriz´a-los facilmente, como mostra a tabela abaixo Com isto, fizemos com que cada lado de R se tornasse Segmento Parametrizac¸a˜ o Valores dos parˆametros L1 (t, b) a ≤ t ≤ a0 0 L2 (a , t) b ≤ t ≤ b0 0 L3 (t, b ) a ≤ t ≤ a0 L4 (a, t) b ≤ t ≤ b0 uma 1-c´elula. Encadeando estas 1-c´elulas, obteremos uma parametrizac¸a˜ o de toda a fronteira. Contudo, para que o encadeamento seja cont´ınuo, o ponto inicial de uma 1-c´elula deve ser igual ao final da c´elula seguinte. Infelizmente isto n˜ao e´ verdade no caso das parametrizac¸o˜ es acima. Por exemplo, L2 acaba no ponto (a0 , b0 ), ao passo que L3 comec¸a em (a, b0 ). O problema e´ que a parametrizac¸a˜ o de L3 induzida pela ordenac¸a˜ o natural dos n´umeros reais no segmento [a, a0 ], percorre o segmento no sentido contr´ario ao desejada. De fato, L3 termina em (a0 , b0 ), que deveria ser seu ponto inicial. Mas este problema e´ f´acil de resolver: basta percorrer L3 no sentido inverso ao que e´ dado pela parametrizac¸a˜ o induzida da ordenac¸a˜ o natural em R. Observe que o mesmo problema se d´a com L4 . Denotando por ∂R a fronteira de R considerada como 1-encadeamento, podemos concluir que ∂R = L1 + L2 − L3 − L4 . O sentido em que cada um dos lados de R deve ser percorrido para que a fronteira seja este 1-encadeamento e´ ilustrado na figura abaixo. ·o
−L3
·O
−L4
L2
·
L1
·/
Observe, entretanto, que esta n˜ao e´ a u´ nica maneira poss´ıvel de se obter um encadeamento cont´ınuo a partir dos lados de R. A outra possibilidade est´a ilustrada na figura abaixo.
˜ DE 2-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
·O
L3
89
·/ −L2
L4
·o
−L1
·
Em nossa escolha original do sentido em que a fronteira de R e´ percorrida, avanc¸amos ao longo do eixo x, e s´o depois subimos ao longo de y. Desta forma, a ordenac¸a˜ o das coordenadas e´ respeitada (primeiro vem x, depois vem y). Por isso, podemos arg¨uir que esta maneira de encadear os lados e´ ‘mais natural’ que aquela em que os lados s˜ao percorridos no sentido inverso. Por isso, assumiremos, de agora em diante, que considerando R como conjunto de parˆametros, e assumindo que todos os seus lados s˜ao percorridos no sentido natural de crescimento dos n´umeros reais, sua fronteira ser´a ∂R = L1 + L2 − L3 − L4 . Naturalmente, R tamb´em pode ser encarado como uma 2-c´elula. Por´em, antes de tratar deste caso, precisamos definir o que e´ a fronteira de uma 2-c´elula qualquer. Seja σ : R → Rn uma 2-c´elula. A fronteira de σ e´ a forma reduzida do 1-encadeamento σ(L1 ) + σ(L2 ) − σ(L3 ) − σ(L4 ), e vamos denot´a-la por ∂σ. Note que, na definic¸a˜ o da fronteira do retˆangulo de parˆametros n˜ao aparecia a express˜ao ‘forma reduzida’. A raz˜ao e´ simples: n˜ao existe a possibilidade de cancelamento entre as v´arias 1-c´elulas na fronteira de R. Entretanto, como veremos adiante, isto freq¨uentemente ocorre no caso geral. Vejamos alguns exemplos. Se a 2-c´elula for o parabol´oide z = x2 + y 2 , com a parametrizac¸a˜ o σp descrita em (1.10), ent˜ao os lados do retˆangulo s˜ao dados por (3.2)
L1 = [0, 1] × {0} L2 = {1} × [0, 2π] L3 = [0, 1] × {2π} L4 = {0} × [0, 2π].
Contudo, σp (L4 ) = (0, 0, 0), de modo que a fronteira de σp seria σp (L1 ) + σp (L2 ) − σp (L3 ). Isto nos d´a uma curva em 3 partes, quando est´avamos esperando apenas uma: a circunferˆencia de raio 1 e centro em (0, 0, 1), contida no plano z = 1. E´ f´acil ver que esta circunferˆencia corresponde a σp (L2 ), uma vez que em L2
90
3. 2-FORMAS
o parˆametro r assume, apenas, o valor constante 1. J´a L1 e L3 apresentam o fenˆomeno oposto: o aˆ ngulo est´a fixo e o raio varia. Portanto, as imagens destes dois lados nos d˜ao um arco de par´abola no plano y = 0, contido entre os planos z = 0 e z = 1. Entretanto, σp (L1 ) percorre o arco de baixo para cima, ao passo que −σp (L3 ) percorre o mesmo arco de cima para baixo. Portanto, estas c´elulas se cancelam, deixando apenas σp (L2 ) como fronteira para o parabol´oide. Uma situac¸a˜ o um pouco diferente ocorre com o cilindro x2 + y 2 = 1, que pode ser parametrizado pela aplicac¸a˜ o σc : [0, 2π] × [0, 1] → R3 , definida por σc (θ, z) = (cos(θ), sen(θ), z). Neste caso os lados do retˆangulo de parˆametros s˜ao L1 = [0, 2π] × {0} L2 = {2π} × [0, 1] L3 = [0, 2π] × {1} L4 = {0} × [0, 1]. Portanto, a fronteira deveria ser σc (L1 ) + σc (L2 ) − σc (L3 ) − σc (L4 ). Desta vez nenhum dos trˆes lados se reduz a um ponto. Pelo contr´ario, σc (L1 ) e σc (L3 ) representam circunferˆencias; a primeira no plano z = 0, a segunda em z = 1. Olhando de um ponto acima do plano z = 0 ver´ıamos ambas estas circunferˆencias sendo percorridas em sentido anti-hor´ario. Por outro lado, σc (L2 ) e σc (L4 ) representam o segmento de reta que vai de (1, 0, 0) a (1, 0, 1), e que est´a contido na superf´ıcie do cilindro. Como estes segmentos est˜ao sendo percorridos em sentidos opostos, podemos cancel´a-los, obtendo σc (L1 ) − σc (L3 ) como fronteira para o cilindro. Portanto, a fronteira do cilindro e´ formada por duas circunferˆencias; a de baixo percorrida no sentido anti-hor´ario, a de cima no sentido hor´ario. ´ 3.2. Orientando uma 2-celula. Antes de poder definir encadeamentos de 2-c´elulas, precisamos decidir o que significa orientar uma tal c´elula. S´o assim podemos falar de “menos” uma 2-c´elula. A sa´ıda mais simples e´ recorrer a` orientac¸a˜ o da fronteira da c´elula, que e´ induzida a partir da orientac¸a˜ o da fronteira do seu retˆangulo de parˆametros. Esta u´ ltima, contudo, e´ sempre feita de uma maneira padronizada, como convencionamos no par´agrafo anterior. Antes de formalizar isto, vejamos o que ocorre quando a 1-c´elula e´ o pr´oprio retˆangulo de parˆametros. Por´em, quando consideramos o retˆangulo
˜ DE 2-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
91
como como 1-c´elula, devemos parametriz´a-lo. A maneira natural de fazer isto e´ dada pela f´ormula s(1, 0) + t(0, 1), onde (s, t) ∈ R = [a, a0 ] × [b, b0 ]. Sob esta parametrizac¸a˜ o, L1 e L2 s˜ao percorridos no sentido positivo do eixo, de modo que a fronteira desta 1-c´elula e´ a mesma de R. Para obter uma parametrizac¸a˜ o cuja fronteira e´ percorrida no sentido oposto basta forc¸ar um dos lados do retˆangulo a ser percorrido no sentido oposto ao usual; por exemplo, (a + a0 − s)(1, 0) + t(0, 1), onde (s, t) ∈ R = [a, a0 ] × [b, b0 ]. Desta vez, s´o obtemos uma fronteira cont´ınua a partir do ponto (a, b), se comec¸armos subindo pelo eixo y antes de avanc¸ar pela horizontal. Assim, a fronteira desta 1-c´elula e´ percorrida no sentido oposto ao do retˆangulo R. Em outras palavras, considerando o retˆangulo como 1-c´elula, sua fronteira sob esta nova parametrizac¸a˜ o e´ L3 + L4 − L2 − L1 = −∂R. Por isso, convencionaremos chamar de −R o retˆangulo [a, a0 ] × [b, b0 ] considerado como 1-c´elula sob esta parametrizac¸a˜ o. J´a R designar´a o retˆangulo sob a parametrizac¸a˜ o usual. Com isto, R est´a representando duas coisas diferentes: o retˆangulo de parˆametros [a, a0 ] × [b, b0 ], e o mesmo retˆangulo visto como 1-c´elula sob a parametrizac¸a˜ o natural. Como a fronteira e´ a mesmo nos dois casos, n˜ao corremos nenhum risco, apesar da ambig¨uidade da notac¸a˜ o. Passando ao caso geral, seja σ : R → Rn uma 2-c´elula e ∂σ = σ(L1 ) + σ(L2 ) − σ(L3 ) − σ(L4 ), sua fronteira. Tomando o caso do retˆangulo como inspirac¸a˜ o, definimos −σ : R → Rn como sendo a 2-c´elula em R = [a, a0 ] × [b, b0 ] para a qual σ(s, t) = σ(a + a0 − s, t). Obedecendo a` convenc¸a˜ o que determina como R deve ser percorrido, verificamos que ∂(−σ) = σ(L3 ) + σ(L4 ) − σ(L1 ) − σ(L2 ), como seria de esperar. Por isso, diremos que −σ tem a orientac¸a˜ o inversa de σ. A orientac¸a˜ o de uma 2-c´elula est´a relacionada ao seu vetor normal, como e´ f´acil de ver no caso de um retˆagulo parametrizado S. Denotaremos por vj (S) o vetor unit´ario paralelo ao lado Lj de S, cujo sentido coincide com aquele
92
3. 2-FORMAS
segundo o qual o lado e´ percorrido na orientac¸a˜ o definida pela parametrizac¸a˜ o de S. Com isto, v1 (R) = −v3 (R) = e1 e v2 (R) = −v4 (R) = e2 , ao passo que v1 (−R) = −v3 (−R) = −e1 e v2 (−R) = v4 (−R) = e2 . Esboc¸ando estes vetores com centro na origem, obtemos O O v2
v2
o
v3
v1
·
/ o
v1
v4
A regra da m˜ao direita nos d´a,
v3
·
/
v4
vj (R) × vj+1 (R) = e3 , ao passo que, vj (−R) × vj+1 (−R) = −e3 , qualquer que seja 1 ≤ j ≤ 4. Isto pode ser formulado de uma maneira mais f´acil de lembrar observando simplesmente que, se os dedos da m˜ao direita percorrem a fronteira de S, ent˜ao o polegar vai apontar sempre no sentido vj (S) × vj+1 (S), quaisquer que sejam S e 1 ≤ j ≤ 4. Podemos facilmente estender estas observac¸o˜ es a uma 2-c´elula geral σ : R → Rn . Lembre-se que os vetores ∂σ ∂σ (p) e (p), ∂s ∂t s˜ao tangentes a σ em um ponto p ∈ R, desde que n˜ao se anulem neste ponto. Portanto, sob a hip´otese de que os vetores n˜ao se anulam em p, temos que o produto vetorial ∂σ ∂σ Np (σ) = (p) × (p), ∂s ∂t e´ perpendicular ao plano tangente a σ em p. Diremos que se trata de um vetor normal a σ em p. Como ∂σ ∂(−σ) ∂σ ∂(−σ) (p) = − (p) e (p) = (p), ∂u ∂s ∂v ∂t temos que Np (−σ) = −Np (σ). Geometricamente isto significa que o vetor normal agora aponta para o lado oposto da superf´ıcie. Para poder relacionar o vetor normal a` fronteira, como fizemos no caso do retˆangulo, redefinimos vj como sendo o vetor tangente a` 1-c´elula σ(Lj ).
˜ DE 2-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
93
Parametrizando os lados de R como L1 = (0, 0) + t1 (1, 0) L2 = (0, 0) + t2 (0, 1) L3 = (0, b0 ) + (a0 + a − t1 )(1, 0) L4 = (a0 , 0) + (b0 + b − t2 )(0, 1) onde t1 ∈ [a, a0 ] e t2 ∈ [b, b0 ] e assumindo que p ∈ Lj , sejam ∂σ(Lj ) ∂σ(Lj+1 ) (p) e vj+1 (σ, p) = (p) ∂t1 ∂t2 para j = 1, 3. Observe que estes vetores apontam no sentido em que a fronteira de σ e´ percorrida. Como −σ(t1 , t2 ) = σ(a + a0 − t1 , t2 ) temos vj (σ, p) =
vj (−σ, p) = −
∂σ(Lj ) ∂σ(Lj+1 ) (p) e vj+1 (−σ, p) = (p) ∂t1 ∂t2
para j = 1, 3. Portanto, vj (−σ, p) = vj (σ, p) e vj+1 (−σ, p) = vj+1 (σ, p). Supondo, agora, que p ∈ Lj ∩ Lj+1 , para j = 1, 3, conclu´ımos que se Nj (σ, p) = vj (σ, p)×vj+1 (σ, p) = −(vj (−σ, p)×vj+1 (−σ, p)) = Nj (−σ, p). Um argumento semelhante se aplica aos outros dois pontos de intersec¸a˜ o de lados da fronteira de R. Resumindo: se, na vizinhanc¸a de um ponto dado, o movimento da m˜ao direita acompanha a direc¸a˜ o em que a fronteira de σ e´ percorrida, ent˜ao o polegar aponta na direc¸a˜ o do vetor normal a σ naquele ponto. ˜ de 2-formas. Neste par´agrafo veremos como integrar 3.3. Integrac¸ao uma 2-forma em 2-c´elulas. Comec¸aremos com o caso mais simples poss´ıvel: uma 2-forma definida em um retˆagulo de R2 . Seja U uma regi˜ao do plano, e digamos que R = [a, a0 ] × [b, b0 ] ⊆ U. Dada η ∈ Ω2 (U ), queremos definir a integral de η no retˆangulo R. Se s e t s˜ao as coordenadas em R2 , podemos escrever η = f (s, t)ds ∧ dt. Definimos, ent˜ao, a integral de η em R como sendo a integral da func¸a˜ o f neste mesmo retˆangulo; isto e´ Z Z a0 Z b0 f dsdt. η= R
a
b
Esta e´ a base de nossa definic¸a˜ o: o caso geral e´ reduzido a este caso particular atrav´es do c´alculo de uma imagem inversa. Em outras palavras, se σ : R → Rn ,
94
3. 2-FORMAS
e´ uma 2-c´elula cuja imagem est´a contida em uma regi˜ao U de Rn , definimos a integral de ω em σ por Z Z ω= (3.3) σ ∗ (ω). σ
R
Precisamos descobrir de que maneira a orientac¸a˜ o da 2-c´elula afeta o c´alculo da integral. Para isto, consideramos uma 2-c´elula σ, definida sobre o retˆangulo R = [a, a0 ] × [b, b0 ] cuja imagem est´a contida em uma regi˜ao U de Rn . Digamos que s1 es2 s˜ao os parˆametros de σ. Se ω ∈ Ω2 (U ), ent˜ao −σ tem dom´ınio R e e´ definida por −σ(t1 , t2 ) = σ(a + a0 − t1 , t2 ). Desta forma (−σ)∗ (ω)(q) = ω(σ(q), −Jq (σ)e1 , Jq (σ)e2 )dt1 ∧ dt2 , onde q = (t1 , t2 ). Portanto, (−σ)∗ (ω)(q) = −ω(σ(q), Jq (σ)e1 , Jq (σ)e2 )dt1 ∧ dt2 = −(σ)∗ (ω)(q), j´a que a troca de entradas em ω leva a uma troca de sinal da imagem inversa. Assim, Z Z (−σ)∗ (ω) = −
(σ)∗ (ω),
Rt
R
que e´ equivalente a dizer que Z
Z ω=−
−σ
ω. σ
3.4. 2-encadeamento. Com o que vimos estamos aptos a definir um 2-encadeamento como sendo uma express˜ao da forma E = c1 σ1 + · · · + cm σm ,
(3.4)
onde os cs s˜ao n´umeros inteiros e os σs s˜ao 2-c´elulas contidas em uma regi˜ao U de Rn . O sinal do coeficiente nos diz se a c´elula est´a sendo percorrida no sentido dado por sua parametrizac¸a˜ o, ou no sentido oposto. Se ω ∈ Ω1 (U ), definimos Z Z Z ω + · · · + cm
= c1 E
σ1
ω. σm
Como no caso de 1-encadeamentos, a definic¸a˜ o de integral sobre um encadeamento justifica a utilizac¸a˜ o das seguintes propriedades da adic¸a˜ o de 2-c´elulas. Se σ1 , σ2 e σ3 s˜ao 2-c´elulas em U e k ∈ Z, ent˜ao: • • • • •
(σ1 + σ2 ) + σ3 ≡ σ1 + (σ2 + σ3 ); σ1 + σ 2 ≡ σ 2 + σ 1 ; kσ1 + σ1 ≡ (k + 1)σ1 ; 0σ1 ≡ 0; se a imagem de σ1 e´ uma curva, ent˜ao σ1 ≡ 0.
˜ DE 2-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
95
Usamos ≡ em lugar de um simples sinal de igualdade para deixar claro que cada uma destas propriedades e´ derivada do comportamento de uma integral calculada sobre um encadeamento. Na u´ ltima das propriedades acima, o que era ponto no caso de 1-c´elula virou curva, agora que nossas c´elulas tˆem dimens˜ao dois. Diremos que um encadeamento est´a em forma reduzida se eliminamos todas as parcelas que correspondem a pontos, e cancelamos todos os pares de c´elulas iguais com sinais opostos. Em princ´ıpio estamos admitindo 2-c´elulas quaisquer entre os σs. Na pr´atica, por´em, o u´ nico caso que nos interessa e´ aquele em que as c´elulas s˜ao disjuntas ou se intersectam apenas em pontos da fronteira. Neste u´ ltimo caso, podemos considerar (3.4) como uma colec¸a˜ o de 2-c´elulas a` s quais estamos associando multiplicidades que nos dizem em que sentido, e quantas vezes, aquela 2-c´elula est´a sendo percorrida. A fronteira do 2-encadeamento E descrito em (3.4) e´ definida pela f´ormula ∂E ≡ c1 ∂(S1 ) + · · · + cm ∂(Sm ), onde, como sempre, estaremos considerando a forma reduzida da express˜ao a` direita. Considere, por exemplo, a superf´ıcie correspondente a` colagem da trˆes faces de um cubo de lado um que est˜ao contidas nos planos coordenados, como mostra a figura. Queremos representar esta colagem como um 2-encadeamento. Digamos que 1 ≤ i < j ≤ 3. A face σij , contida no plano xi xj , pode ser parametrizada como σij (s, t) = sei + tej , onde ei , ej ∈ ε, a base canˆonica de R3 . Por causa de nossa convenc¸a˜ o de que i < j, o vetor normal Nij a σij , satisfaz ( ek Nij = ei × ej = −ek
se (i, j) = (1, 2), (2, 3) se (i, j) = (1, 3)
onde k 6= i, j. O problema e´ que, se encadearmos as 2-c´elulas assim parametrizadas, a fronteira n˜ao ser´a a esperada. Por exemplo, σ13 e σ23 tˆem um lado comum ` sobre o eixo x3 . Como este lado e´ interno a` colagem das faces, n˜ao deve fazer parte da fronteira do encadeamento. Entretando, ` est´a orientado no mesmo sentido, tanto em σ13 , quanto em σ23 , de forma que n˜ao ser´a cancelado na fronteira de σ12 + σ13 + σ23 . Para evitar isto, precisamos reorientar algumas destas 2-c´elulas, o que nos obriga a listar os lados de cada face; isto e´ , as arestas do cubo. Escreveremos aii para a aresta que est´a ao longo do eixo xi . A aresta oposta a aii na face σij ser´a denotado por aji . Em ambos os casos vamos assumir que a 1-c´elula correspondente aponta no sentido do eixo xi . Usando esta notac¸a˜ o, os lados de
96
3. 2-FORMAS
σ12 podem ser enumerados como na figura. ·o
−a21
·O
σ12
−a22
·
a11
a12
·/
Assim, ∂σ12 = a11 + a12 − a21 − a22 . Procedendo de maneira semelhante para as outras faces, constatamos que ∂σ23 = a22 + a23 − a32 − a33
e que
∂σ13 = a11 + a13 − a31 − a33 .
As arestas que devem se cancelar no encadeamento destas trˆes faces do cubo s˜ao a11 , a22 e a33 . Mas, para que isto ocorra quando somamos as fronteiras acima, basta inverter o sinal de σ13 . Portanto, o encadeamento desejado e´ E = σ12 + σ23 − σ13 , que tem como fronteira a12 − a21 + a23 − a32 − a13 + a31 . Voltando aos vetores normais, constatamos que apenas N13 n˜ao aponta para dentro do cubo – caso o cubo estivesse fechado, e´ claro. Isto nos d´a uma maneira f´acil de lembrar como orientar as faces para obter o 2-encadeamento correto: basta que todas as faces tenham o vetor orientado para dentro do cubo, ou para fora do cubo. No primeiro caso, temos o 2-encadeamento E acima; no segundo caso, obtemos −E. o O cubo que vimos considerando tem outras trˆes faces. Escrevendo σij para a face oposta a σij , verificamos que tanto o o o E 0 = −σ12 − σ23 + σ13 ,
quanto −E 0 produzem um 2-encadeamento com a fronteira correta. Contudo, os vetores normais em E 0 apontam todos para dentro do cubo, e ∂E 0 = −∂E. Portanto, ∂(E + E 0 ) = 0, de modo que n˜ao h´a fronteira neste caso. Isto n˜ao e´ surpreendente, afinal um cubo n˜ao tem mesmo fronteira. 3.5. Encadeamentos fechados. Diremos que um 2-encadeamento cuja fronteira e´ zero e´ fechado. J´a vimos que isto ocorre no caso do cubo, outro exemplo, e´ o 2-encadeamento do parabol´oide σp , definido no §3.1, com o disco σd definido, sobre o mesmo retˆangulo de parˆametros R de σp , por σd (r, θ) = (r cos(θ), r sen(θ), 1).
˜ DE 2-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
97
Neste caso, os pontos de intersec¸a˜ o de σp com σd coincidem com os pontos da fronteira de ambas as c´elulas, e formam a circunferˆencia de raio 1 e centro em (0, 0, 1). Como σp (L4 ) = (0, 0, 0), ∂σp ≡ σp (L1 ) + σp (L2 ) − σp (L3 ) ≡ σp (L2 ). J´a no caso do disco, σd (L4 ) degenera em um ponto (a origem), ao passo que σd (L1 ) e σd (L3 ) correspondem ao segmento de reta que vai da origem ao ponto (1, 0, 1), percorrido em sentidos opostos. Com isso, ∂σd ≡ σp (L2 ). Portanto, σp +σd n˜ao e´ fechada, ao passo que −σp +σd e σp −σd s˜ao fechadas. Naturalmente o conceito de encadeamento fechado tamb´em se aplica a uma u´ nica 2-c´elula; como e´ o caso da esfera. Contudo, neste caso nos deparamos com a necessidade de orientar a fronteira de uma superf´ıcie sem fronteira. Nem podemos descartar este caso sumariamente, assumindo, por exemplo, que se n˜ao h´a fronteira, n˜ao h´a necessidade de nos preocuparmos com a orientac¸a˜ o da superf´ıcie. Afinal, a orientac¸a˜ o da c´elula afeta o sinal da integral. H´a duas maneiras de contornar este problema. A primeira, consiste em recorrer a` relac¸a˜ o entre orientac¸a˜ o da fronteira e vetor normal a` c´elula. Como vimos no §(3.2), ao decidir qual o sentido no qual a fronteira do retˆangulo de parˆametros est´a sendo percorrida, fizemos uma escolha entre um dos dois vetores normais a` 2-c´elula. Como isto depende apenas da parametrizac¸a˜ o da c´elula e da orientac¸a˜ o da fronteira do retˆangulo, podemos utilizar esta definic¸a˜ o mesmo se a fronteira da 2-c´elula for zero. Neste caso, adotaremos a convenc¸a˜ o: a escolha da orientac¸a˜ o de uma superf´ıcie fechada deve ser feita de modo que o vetor normal sempre aponte para fora da superf´ıcie. Considere, por exemplo, o que acontece com a esfera σe de raio 1 e centro na origem. Utilizaremos a parametrizac¸a˜ o de σe em coordenadas esf´ericas σe (φ, θ) = (cos(θ) sen(φ), sen(θ) sen(φ), cos(φ)). definida no retˆangulo R = [0, π] × [0, 2π]. Neste caso, o vetor normal ser´a dado por Np (σe ) =
∂σe ∂σe (p) × (p). ∂φ ∂θ
Um c´alculo simples mostra que Np (σe ) = sen(φ)σe (θ, φ). Como o seno e´ positivo para 0 ≤ φ ≤ π, temos que Np (σe ) aponta sempre no mesmo sentido que σe (θ, φ); isto e´ , para fora da superf´ıcie. Podemos chegar ao mesmo resultado representando uma superf´ıcie fechada como encadeamento de duas ou mais c´elulas, cada uma das quais tem
98
3. 2-FORMAS
uma fronteira n˜ao nula. Naturalmente a orientac¸a˜ o de cada uma destas duas c´elulas precisa ser feita de maneira que: • as fronteiras de c´elulas adjacentes tenham orientac¸o˜ es opostas, e • o vetor normal aponte para fora em cada uma das c´elulas em que a superf´ıcie foi subdividida. Por exemplo, a esfera σe pode ser subdividida em duas c´elulas com fronteira, cada uma delas correspondendo a um hemisf´erio. Neste caso, o hemisf´erio superior Hs e´ obtido restringindo-se a parametrizac¸a˜ o σe da esfera definida no retˆangulo [0, π/2] × [0, 2π]. Hs tem fronteira ∂(Hs ) ≡ Hs (L1 ) + Hs (L2 ) − Hs (L3 ) − Hs (L4 ), onde os Ls correspondem aos lados do retˆangulo [0, π/2] × [0, 2π] enumerados da maneira usual. Contudo, Hs (L1 ) ≡ −Hs (L3 ) e Hs (L4 ) ≡ 0, de modo que ∂(Hs ) ≡ Hs (L2 ). Mas esta curva corresponde a` circunferˆencia da base do hemisf´erio, percorrida no sentido anti-hor´ario. Portanto, neste caso, o vetor normal aponta sempre para fora do hemisf´erio Hs . Restringindo, agora, σe ao retˆangulo [π, π/2] × [0, 2π], obtemos o hemisf´erio inferior Hi , parametrizado de modo que o vetor normal aponte para fora (ou para baixo, se vocˆe preferir), e com fronteira ∂(Hi ) ≡ −Hs (L2 ). Encadeando os dois hemisf´erios assim orientados, obtemos a orientac¸a˜ o desejada para a esfera. Mesmo no caso em que a superf´ıcie n˜ao e´ fechada, usaremos as express˜oes lado de fora e lado de dentro da superf´ıcie. Neste caso, o lado de fora designa apenas aquele para o qual aponta o vetor normal. Por exemplo, parametrizando o cilindro σc como no §3.1, temos um vetor normal que aponta para o que normalmente chamamos de parte de dentro do cilindro. Portanto, uma parametrizac¸a˜ o mais natural seria dada por −σc . Encerramos este par´agrafo com a surpreendente revelac¸a˜ o de que certos objetos que chamamos de superf´ıcies n˜ao admitem um lado de dentro, nem um lado de fora. O exemplo mais simples e´ a chamada faixa de M¨obius. Para constru´ı-la, tome uma faixa de papel de uns 5 cm de largura e uns 20 cm de comprimento. Escolha um dos lados deste retˆangulo de papel, que chamaremos de lado de cima, e desenhe sobre ele a orientac¸a˜ o anti-hor´aria da fronteira. Para obter uma superf´ıcie com um lado de cima e um lado de baixo, precisar´ıamos colar as extremidades da fita de maneira que estivessem orientadas em sentidos opostos. Se fiz´essemos isto neste caso, obter´ıamos um cilindro. Ao inv´es disto,
˜ DE 2-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
99
faremos a colagem de modo que as orientac¸o˜ es nas extremidades coincidam. Para que isto seja poss´ıvel vocˆe precisar´a torcer a fita de papel. O resultado e´ uma faixa como a da figura 1, que e´ usada como logotipo pelo IMPA.
F IGURA 1. Logotipo do IMPA A raz˜ao pela qual esta fita n˜ao tem um lado de dentro, e um lado de fora, e´ que n˜ao h´a dois lados, mas apenas um. Imagine uma formiga que comec¸asse a caminhar pelo lado que convencionamos chamar “de cima” no retˆangulo original. No momento em que a formiga inicia sua caminhada transformarmos o retˆangulo na faixa. Como as extremidades da faixa foram emendadas, a formiga poder´a continuar sua caminhada. Entretanto, ao fazer isto sobre a faixa de M¨obius ela ter´a passado para o que era o “lado de baixo” no retˆangulo original. Vocˆe pode facilmente simular o comportamento da formiga trac¸ando um caminho sobre o papel da fita. N˜ao podemos integrar formas sobre superf´ıcies deste tipo porque, como veremos no pr´oximo par´agrafo, precisamos saber para que lado a normal a` superf´ıcie aponta. Como fenˆomenos como o da fita de M¨obius n˜ao podem ocorrer sobre 2-c´elulas, n˜ao precisamos nos preocupar mais com este tipo de problema. Vamos calcular alguns exemplos como ilustrac¸a˜ o. Considere, em primeiro lugar, o encadeamento σd − σp , do parabol´oide com o disco definido no §3.4. Dada ω = x2 dy ∧ dz, calcularemos Z ω. σd −σp
Como esta integral e´ igual a Z
Z ω−
σd
ω, σp
basta determinar cada uma destas, separadamente, e subtra´ı-las. Usando as parametrizac¸o˜ es definidas no §3.1, temos que σp (r, θ) = (r cos(θ), r sen(θ), r2 ), ao passo que σd (r, θ) = (r cos(θ), r sen(θ), 1), ambas definidas em R = [0, 1] × [0, 2π].
100
3. 2-FORMAS
Comec¸ando pelo parabol´oide, σp∗ (ω) = r2 cos2 (θ)d(r sen(θ) ∧ d(r2 )). Como d(r sen(θ) ∧ d(r2 )) = (r cos(θ)dθ + sen(θ)dr) ∧ 2rdr, e dr ∧ dr = 0, conclu´ımos que σp∗ (ω) = (2r4 cos2 (θ) cos(θ))dθ ∧ dr. Assim, Z
Z
2π
Z
1
ω= σp
0
2r4 cos3 (θ)dθdr.
0
Calculando a integral, 2π Z Z 2 2π 2 (cos2 (θ) + 2) sen(θ) ω= cos3 (θ) = = 0. 5 0 5 3 σp 0 Passando, agora, ao disco σp∗ (ω) = 0, j´a σp∗ (dz) = 0. Com isto, Z
Z
σd −σp
Z ω−
ω= σd
ω = 0. σp
Como um segundo exemplo, calcularemos a integral Z 1 dx ∧ dy, 2 z S onde S e´ a superf´ıcie esf´erica de raio unit´ario e centro na origem. O primeiro impulso e´ pensar em usar coordenadas esf´ericas. Neste caso ter´ıamos, simplesmente, a integral de uma 2-forma em uma 2-c´elula. Contudo, neste exemplo em particular, os c´alculos ficam mais f´aceis se usarmos coordenadas cil´ıdricas. O u´ nico problema e´ que, para fazer isto, precisamos parametrizar cada hemisf´erio separadamente. Assim, acabamos tendo que tratar a esfera como um encadeamento de seus dois hemisf´erios. Comec¸amos por parametrizar os hemisf´erios sobre o retˆangulo R = [0, 1] × [0, 2π], o que nos d´a p Hs (r, θ) = (r cos(θ), r sen(θ), 1 − r2 ), para o hemisf´erio superior, e p Hi (r, θ) = (r cos(θ), r sen(θ), − 1 − r2 ), para o inferior. Os lados de R s˜ao os mesmos de (3.2), e e´ f´acil ver que Hs (L1 ) e Hs (L3 ) correspondem ao arco que vai de (0, 0, 1) a (1, 0, 0), percorridos em sentidos opostos. J´a Hs (L2 ) e´ a circunferˆencia que representa a intersec¸a˜ o da esfera com o plano z = 0. Finalmente, Hs (L4 ) e´ apenas o ponto (0, 0, 1). Isto significa que ∂Hs ≡ Hs (L2 ).
˜ DE 2-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
101
Um argumento semelhante mostra que ∂Hi ≡ H( L2 ). Como a circunferˆencia gira para no mesmo sentido em ambas as parametrizac¸o˜ es, conclu´ımos que S = H s − Hi , para que a normal sempre aponte para fora da esfera, como convecionamos fazer no §3.4. Temos, assim, que Z Z Z 1 1 1 dx ∧ dy = dx ∧ dy − dx ∧ dy. 2 2 2 z z z S Hs Hi Contudo, Hs∗ (
p 1 dx ∧ dy) = 1 − r2 d(r cos(θ)) ∧ d(r sen(θ)). z2
Mas, d(r cos(θ))∧ d(r sen(θ)) = (−r sen(θ)dθ+cos(θ)dr)∧(r cos(θ)dθ+ sen(θ)dr), e´ igual a −rdθ ∧ dr uma vez que sen(θ)2 + cos(θ)2 = 1. Portanto, r 1 dθ ∧ dr Hs∗ ( dx ∧ dy) = − √ z 1 − r2 Como a u´ nica diferenc¸a entre as parametrizac¸o˜ es Hs e Hi est´a no sinal da u´ ltima coordenada, teremos que r Hi∗ (zdx ∧ dy) = √ dθdr 1 − r2 Calculando a integral Z
Z zdx ∧ dy =
Hs
Hs∗ (zdx ∧ dy)
R
obtemos Z 0
1
Z
2π
√
0
1 p r dθdr = −2π 1 − r2 = 2π; 0 1 − r2
donde Z −
Z zdx ∧ dy =
Hi
Mas isto significa que Z Z zdx ∧ dy = S
zdx ∧ dy = 2π. Hs
Hs
Z zdx ∧ dy −
zdx ∧ dy = 4π. Hi
102
3. 2-FORMAS
3.6. Propriedades da integral de uma 2-forma. H´a algumas propriedades elementares das integrais de 2-formas que precisamos considerar. Suponha que U seja uma regi˜ao de Rn . Dadas 2-formas diferenciais ω e η em U , e um escalar k ∈ R, queremos calcular Z (ω + kη), σ
onde S e´ uma 2-c´elula sobre um retˆangulo R do plano, cuja imagem est´a contida em U . Por definic¸a˜ o Z Z (ω + kη) = σ ∗ (ω + kη). σ
R
Assim, das propriedades da imagem inversa, segue que Z Z (ω + kη) = σ ∗ (ω) + kσ ∗ (η). σ
R
Mas, do lado direito desta equac¸a˜ o, temos a integral dupla de func¸o˜ es de duas vari´aveis. Logo, Z Z Z σ ∗ (ω) + kσ ∗ (η) = σ ∗ (ω) + k σ ∗ (η). R
R
R
Reescrevendo tudo isto em termos de integrais ao longo de σ temos Z Z Z (ω + kη) = ω + k η, σ
σ
σ
como, ali´as, seria de esperar. Como a integral sobre um encadeamento e´ igual a` soma das integrais sobre suas parcelas (respeitado sentido da fronteira), segue dos c´alculos acima que Z Z Z (ω + kη) = ω+k η, E
E
E
para qualquer encadeamento E cuja imagem est´a contida em U . As outras propriedades que desejamos estudar est˜ao relacionadas a mudanc¸as nas 2-c´elulas. Em primeiro lugar, que efeito tem uma reparametrizac¸a˜ o da 2-c´elulas sobre a integral? Antes de formular esta pergunta com exatid˜ao, e´ conveniente introduzir a seguinte definic¸a˜ o. Para manter a coerˆencia com a noc¸a˜ o de superf´ıcie descrita no §3.1, usaremos a express˜ao a aplicac¸a˜ o diferenci´avel γ : [a, a0 ] × [b, b0 ] → [c, c0 ] × [k, k 0 ] para designar uma func¸a˜ o diferenci´avel γ : (a − , a0 + ) × (b − , b0 + ) → (c − , c0 + ) × (k − , k 0 + ) onde e´ um n´umero real positivo. Suponhamos, al´em disso, que: • γ e´ bijetiva e • leva o interior de [a, a0 ] × [b, b0 ] no interior de [c, c0 ] × [k, k 0 ].
˜ DE 2-FORMAS 3. INTEGRAC¸AO
103
Se σ e γ s˜ao como acima, ent˜ao, σ · γ define uma parametrizac¸a˜ o diferente da 2-c´elula σ. Isto e´ , σ · γ e´ uma superf´ıcie cuja imagem e´ a mesma de σ. A pergunta pode, ent˜ao, ser reformulada como: qual a relac¸a˜ o entre a integral de uma 2-forma ω ∈ Ω2 (U ) na 2-c´elula σ · γ com a integral da mesma forma ao longo de σ? Para responder a esta pergunta, calculamos a integral desejada usando as v´arias propriedades que j´a conhecemos. Como, Z Z a0 Z b0 ω= (σ · γ)∗ ω, σ·γ
a
b
devemos calcular primeiro a imagem inversa (σ · γ)∗ ω. Usando a propriedade 4 do final do §2.7, temos que (σ · γ)∗ ω = γ ∗ (σ ∗ (ω)). Como σ ∗ (ω) e´ uma 2-forma no plano, podemos escrevˆe-la como gds1 ∧ ds2 , onde g e´ uma func¸a˜ o dos parˆametros s1 e s2 de σ. Nesta notac¸a˜ o, γ ∗ (σ ∗ (ω)) = γ ∗ (gds1 ∧ ds2 ) = (g · γ)dγ1 ∧ dγ2 , onde γ1 e γ2 s˜ao as func¸o˜ es coordenadas de γ. Um c´alculo simples mostra que ∂γ2 ∂γ1 ∂γ1 ∂γ2 (3.5) − ds1 ∧ ds2 . dγ1 ∧ dγ2 = ∂s1 ∂s2 ∂s1 ∂s2 Contudo, o jacobiano de γ e´ ∂γ1 /∂s1 ∂γ1 /∂s2 J(γ) = ; ∂γ2 /∂s1 ∂γ2 /∂s2 de forma que (3.5) pode ser reescrita como dγ1 ∧ dγ2 = det(J(γ))ds1 ∧ ds2 . Portanto, Z
Z
a0
Z
σ·γ
b0
(g · γ) det(J(γ))ds1 ds2 .
ω= a
b
Mas, se det(J(γ))(p) > 0 para todo p ∈ [a, a0 ] × [b, b0 ], ent˜ao, pela f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis em integrais duplas, Z a0 Z b0 Z c0 Z k0 (g · γ) det(J(γ))ds1 ds2 = gdt1 dt2 . a
b
c
k
Contudo esta u´ ltima integral e´ , por definic¸a˜ o, a integral de ω sobre σ. Provamos, portanto, a seguinte f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis para integrais de 2-formas. ´ ´ F ORMULA DE MUDANC ¸ A DE VARI AVEIS . Sejam R e R0 retˆangulos do 0 plano e γ : R → R uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel bijetora para a qual: • o determinante do jacobiano e´ sempre positivo em todo ponto de R, e • o interior de R e´ levado por γ no interior de R0 .
104
3. 2-FORMAS
Se σ : R → U, e´ uma 2-c´elula contida em uma regi˜ao U de Rn , ent˜ao Z Z ω. ω= σ
σ·γ
Em outras palavras, a reparametrizac¸a˜ o de uma superf´ıcie por uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel cujo determinante jacobiano e´ positivo n˜ao altera o valor da integral de uma 2-forma ao longo daquela superf´ıcie. Como conseq¨ueˆ ncia desta f´ormula mostraremos que, ao provar um resultado sobre integrac¸a˜ o de 2-formas, sempre podemos supor que a superf´ıcie tem o retˆangulo [0, 1]2 como espac¸o de parˆametros. ˜ . Seja R = [a, a0 ] × [b, b0 ] um retˆangulo e ω uma 2-forma P ROPOSIC¸ AO definida em uma regi˜ao aberta do plano que cont´em R. Ent˜ao existe uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel γ : [0, 1]2 → R, tal que Z Z ω= γ ∗ (ω). [0,1]2
R
˜ . Defina γ : [0, 1]2 → R por γ(s, t) = (a, b) + s(a0 − D EMONSTRAC¸ AO 0 a, 0) + t(0, b − b). Temos que 0 a −a 0 J(γ) = ; 0 b0 − b donde det(J(γ)) = (a0 − a)(b0 − b) > 0, pois a0 > a e b0 > b. A proposic¸a˜ o segue imediatamente da f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis. 4. Teorema de Stokes Nesta sec¸a˜ o provamos nossa primeira vers˜ao do teorema de Stokes. T EOREMA DE S TOKES . Seja α uma 1-forma diferencial definida em uma regi˜ao U de Rn . Se E e´ um encadeamento de superf´ıcies contido em U , ent˜ao Z Z α= ∂E
dα. E
Dividiremos a demonstrac¸a˜ o em duas partes. Na primeira parte provamos o teorema para 2-formas do plano, integradas sobre um retˆangulo; na segunda reduzimos o caso geral a este caso especial. ˜ do teorema de Stokes no plano. Comec¸amos 4.1. Demonstrac¸ao tratando o caso mais simples em que a 1-forma gds e´ integrada no retˆangulo [0, 1]2 . P RIMEIRA PARTE : demonstrac¸a˜ o do teorema para a 1-forma gds em [0, 1]2 , onde g ∈ O(U ).
4. TEOREMA DE STOKES
Como d(α) = (
105
∂g ∂g − )ds ∧ dt ∂s ∂t
temos que 1
Z
Z
1
Z
(
dα = 0
R
Isto e´
1
0
∂g ∂g − )dsdt. ∂s ∂t
1
Z 1Z 1 ∂g ∂g dsdt − dsdt; R 0 0 ∂s 0 0 ∂t Contudo, pelo teorema fundamental do c´alculo, Z 1Z 1 Z 1 ∂g dsdt = (g(1, t) − g(0, t))dt, 0 0 0 ∂s Analogamente, Z 1 Z 1Z 1 ∂g )dsdt = (g(s, 1) − g(s, 0))ds. 0 0 0 ∂t Assim, Z Z 1 Z 1 dα = (g(1, t) − g(0, t))dt − (g(s, 1) − g(s, 0))ds, Z
Z
Z
dα =
R
0
0
que pode ser reescrito como Z Z 1 Z dα = g(s, 0)ds + (4.1) R
0
1
Z g(1, t)dt −
0
1
g(s, 1)ds − g(0, t)dt. 0
Entretanto, R tem lados L1 = [0, 1] × {0} L2 = {1} × [0, 1] L3 = [0, 1] × {1} L4 = {0} × [0, 1]. Parametrizando L1 na forma (0, 0) + s(1, 0), vemos que Z Z 1 Z 1 gds = g((0, 0) + s(1, 0))ds = g(s, 0)ds, L1
0
0
que e´ igual a` primeira parcela na soma (4.1). C´alculos semelhantes mostram que Z Z α= gds Lj
Lj
corresponde a` j-´esima parcela daquela soma. Portanto, Z Z Z Z Z dα = α+ α− α− R
L1
L2
L3
Por´em, a fronteira de R e´ ∂R = L1 + L2 − L3 − L4 ,
L4
α.
106
3. 2-FORMAS
de sorte que Z
Z
Z
α=
Z α−
α+
∂R
L1
Z α−
L2
Mas isto nos permite concluir que Z
L3
α. L4
Z dα =
α,
R
∂R
provando assim que o teorema de Stokes neste caso bastante particular. S EGUNDA PARTE : demonstrac¸a˜ o do teorema para a 1-forma g1 ds + g2 dt em [0, 1]2 , onde g1 , g2 ∈ O(U ). Por um lado, Z
Z
Z
α=
g1 ds +
∂R
g2 dt,
∂R
∂R
ao passo que Z
Z dα =
R
Z d(g1 ds) +
d(g2 dt),
R
R
j´a que d e´ uma transformac¸a˜ o linear. Entretanto, pela primeira parte, Z Z Z Z d(g1 ds) = g1 ds e que d(g2 dt) = g2 dt. R
∂R
R
∂R
Combinando estas igualdades obtemos o resultado desejado. T ERCEIRA PARTE : demonstrac¸a˜ o do teorema para a 1-forma g1 ds + g2 dt em um retˆangulo qualquer R, onde g1 , g2 ∈ O(U ). Pela proposic¸a˜ o do §3.6 Z Z (4.2) ω=
ω.
[0,1]2
R
Digamos que os lados de [0, 1]2 sejam enumerados consecutivamente por L1 , L2 , L3 e L4 . Assim, o lado de R correspondente a Li e´ γ(Li ). Pela f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis para integrais de 1-formas Z Z (4.3) α= α. ∂[0,1]2
∂R
Mas, pela segunda parte, Z
Z ω=
[0,1]2
α. ∂[0,1]2
Combinando esta igualdade com (4.2) e (4.3), conclu´ımos que Z Z Z Z Z ω= α+ α− α− α, R
γ(L1 )
γ(L2 )
que e´ o teorema de Stokes sobre R.
γ(L3 )
γ(L4 )
˜ 5. APLICAC¸OES
107
˜ do teorema de Stokes em Rn . Levando em 4.2. Demonstrac¸ao conta que • a fronteira de um encadeamento e´ igual ao encadeamento das fronteiras de suas parcelas; • a integral sobre um encadeamento e´ igual a` soma das integrais sobre cada parcela do encadeamento; vemos que basta provar o resultado no caso em que E e´ uma 2-c´elula. Sejam, ent˜ao, R = [a, a0 ] × [b, b0 ], σ : R → Rn uma 2-c´elula, e L1 = [a, a0 ] × {b} L2 = {a0 } × [b, b0 ] L3 = [a, a0 ] × {b0 } L4 = {a} × [b, b0 ]. os lados do retˆangulo R. Ent˜ao a fronteira de σ e´ dada por ∂σ = σ(L1 ) + σ(L2 ) − σ(L3 ) − σ(L4 ). Se α ∈ Ω1 (U ) ent˜ao, σ ∗ (α) ∈ Ω1 (V ), onde V ⊂ R2 e´ um retˆangulo aberto que cont´em R. Mas, Z Z α= σ ∗ (α). ∂σ
∂R
Contudo, j´a sabemos do §4.1 que o teorema de Stokes se aplica a esta u´ ltima integral, donde Z Z σ ∗ (α) =
∂R
d(σ ∗ (α)).
R
Entretanto, pela definic¸a˜ o de integral de uma 2-forma Z Z dα = σ ∗ (dα). σ ∗
R
∗
Como σ (dα) = dσ (α), podemos concluir que Z Z dα = α, σ
∂σ
provando, assim, o teorema de Stokes no comec¸o da sec¸a˜ o. ˜ 5. Aplicac¸oes Nesta sec¸a˜ o consideraremos v´arias aplicac¸o˜ es do teorema de Stokes e das 2formas a problemas de f´ısica.
108
3. 2-FORMAS
˜ e rotacional. Seja F : U → Rn um campo vetorial 5.1. Circulac¸ao definido em uma regi˜ao U do plano. Comec¸amos relembrando as definic¸o˜ es das formas associada a este campo. A 1-forma associada a F e´ τF = F1 dx1 + F2 dx2 + F3 dx3 , e a 2-forma, utilizada para calcular o fluxo e´ ΦF = F1 dx2 ∧ dx3 − F2 dx1 ∧ dx3 + F3 dx1 ∧ dx2 . Calculando a diferencial de τF , obtemos X ∂Fi ∂Fj − dxi ∧ dxj , dτF = ∂xj ∂xi 1≤i<j≤3
que, por sua vez, corresponde a` 2-forma do fluxo do campo ∂F3 ∂F3 ∂F1 ∂F1 ∂F2 ∂F2 − , − , − . ∂x3 ∂x2 ∂x1 ∂x3 ∂x2 ∂x1 Este u´ ltimo campo e´ conhecido como o rotacional de F , e e´ denotado por rot(F ). Portanto, (5.1)
dτF = Φrot(F ) .
Esta igualdade nos permite enunciar o teorema de Stokes na vers˜ao que ser´a utilizada na maioria das aplicac¸o˜ es. T EOREMA DE S TOKES . Seja σ uma 2-c´elula e F um campo vetorial definido em uma regi˜ao aberta do plano que cont´em σ, ent˜ao Z Z τF = Φrot(F ) . ∂σ
σ
Para entender o significado f´ısico do rotacional, lembre-se que a circulac¸a˜ o de F em uma curva fechada C, totalmente contida em U , foi definida no §5.1 como Z ΓF (C) =
F. C
Supondo que C e´ igual a` fronteira de uma 2-c´elula σ totalmente contida em U , o teorema de Stokes nos d´a Z Z ΓF (C) = τF = dτF ; ∂σ
Isto e´
σ
Z ΓF (C) =
Φrot(F ) . σ
Portanto, se F tem rotacional zero, ent˜ao sua circulac¸a˜ o e´ zero ao longo de qualquer curva fechada que seja fronteira de uma 2-c´elula inteiramente contida em U . A parte da frase em it´alico e´ extremamente importante, e voltaremos a ela ao final do par´agrafo. Como o rotacional ser zero implica que a circulac¸a˜ o e´ zero – ao menos sob certas hip´oteses – deve haver alguma ligac¸a˜ o entre o rotacional e o fato do campo n˜ao ter redemoinhos; veja §5.1.
˜ 5. APLICAC¸OES
109
Para entender isto melhor, vamos tentar relacionar o rotacional diretamente a` existˆencia de movimento angular em um campo, sem recorrer a` circulac¸a˜ o. Digamos que V representa o campo de velocidades de um fluxo bidimensional. Vocˆe pode imaginar isto como uma aproximac¸a˜ o do que ocorre quando uma lˆamina muito fina de a´ gua que escorre sobre uma superf´ıcie plana. Ent˜ao, V(x1 , x2 , x3 ) = (v1 (x1 , x2 , x3 ), v2 (x1 , x2 , x3 ), 0), uma vez que o campo e´ bidimensional. Calculando o rotacional, obtemos rot = (0, 0, ω), onde ∂v1 ∂v2 − . ω= ∂x ∂y Para descobrir o que ω representa consideremos fiapo de nylon, na forma de um aˆ ngulo reto, totalmente imerso no fluido. q2O δy
p
δy
/ q1
Denotaremos por p o v´ertice do aˆ ngulo, e por q1 e q2 as extremidades de cada um dos segmentos que formam o fiapo. Para facilitar os c´alculos, digamos que estamos considerando o fiapo no exato momento em que pq1 e´ paralelo ao eixo x e pq2 e´ paralelo ao eixo y. Como o fiapo e´ muito pequeno, os segmentos s˜ao muito curtos: pq1 tem comprimento δx e pq2 tem comprimento δy. A diferenc¸a entre a componente da velocidade ao longo do eixo y em q1 e em p e´ igual a v2 (p + δx) − v2 (p). Como δx e´ muito pequeno, esta diferenc¸a est´a muito pr´oxima de ∂v2 · δx. ∂x Isto significa que, em um tempo muito curto δt, o ponto q1 percorre a distˆancia ∂v2 · δxδt ∂x na direc¸a˜ o y. Como a distˆancia de p a q1 e´ igual a δx, o ponto q1 percorre um aˆ ngulo ∂v2 arctan δt ∂x com centro em p. Entretanto, se θ e´ muito pequeno, arctan(θ) e´ aproximadamente igual a θ. Assumindo que este e´ o caso acima –j´a que δt e´ um tempo muito curto – vemos que o aˆ ngulo percorrido por q1 , relativamente a` p, e´ aproximadamente igual a ∂v2 δt. ∂x
110
3. 2-FORMAS
Portanto, a velocidade angular instantˆanea de pq1 em torno do eixo z e´ aproximadamente igual a ∂v2 . ∂x Um c´alculo similar mostra que a velocidade angular instantˆanea de pq2 em torno do eixo z e´ aproximadamente igual a −
∂v1 . ∂y
Portanto, a velocidade angular m´edia do fiapo em forma de aˆ ngulo reto e´ igual a 1 1 ω = rot(V). 2 2 Se V e´ o campo de velocidades de um fluido, a quantidade ω = rot(V), e´ conhecida como a vorticidade de V, e mede a tendˆencia que um pequeno fiapo tem de rodar no fluido. Um campo de velocidades cuja vorticidade e´ nula e´ chamado de irrotacional ou solenoidal. Note que o fato de um fluido ter vorticidade n˜ao nula n˜ao implica que tenha um movimento rotat´orio global; isto e´ , que haja redemoinhos no fluido. Por exemplo, V = (y, 0, 0) n˜ao exibe redemoinhos. Por´em, a componente da velocidade ao longo do eixo x aumenta com a distˆancia entre o ponto e o eixo x. Isto faz com que um fiapo de nylon paralelo a y tenda a rodar enquanto e´ arrastado pelo fluido. De fato, um c´alculo simples, que ser´a deixado exerc´ıcio, mostra que este fluido tem vorticidade −1. Contudo, a relac¸a˜ o entre rotacional e circulac¸a˜ o e´ mais sutil do que nossos coment´arios acima podem sugerir. Por exemplo, se h´a uma haste perpendicular ao fluxo, podemos ter rotacional zero em todo lugar acompanhado de circulac¸a˜ o n˜ao nula sobre curvas fechadas que d˜ao a volta ao cilindro. E´ por isso que precisamos acrescentar a hip´otese de que a curva fosse fronteira de uma 2-c´elula inteiramente contida em U , nas considerac¸o˜ es que fizemos acima. Se h´a um obst´aculo no fluido, ela est´a fora da 2-c´elula. Veremos um exemplo de um campo com estas propriedades no §5.7. 5.2. A integral de superf´ıcie. Ao contr´ario do que fizemos at´e aqui, vamos considerar neste par´agrafo uma superf´ıcie S de R3 descrita como o conjunto de zeros de uma func¸a˜ o diferenci´avel. Mais precisamente, seja U uma regi˜ao de R3 e f ∈ O(U ). Definimos Sf = {p ∈ R3 : f (p) = 0}; cf. exerc´ıcio 20 da p´agina 20. Muitas superf´ıcies bem conhecidas, e j´a utilizadas neste livro, podem ser descritas desta maneira, entre elas a esfera, o
˜ 5. APLICAC¸OES
111
cone, o parabol´oide e o cilindro. Todos os exemplos de superf´ıcies mencionados acima tamb´em podem ser descritos a partir de uma parametrizac¸a˜ o, e e´ esta exatamente a situac¸a˜ o que queremos estudar neste par´agrafo: uma superf´ıcie Sf , para algum f ∈ O(U ), que admite uma parametrizac¸a˜ o σ : R → U , onde R e´ um retˆangulo de R2 . Supondo que o gradiente de f n˜ao se anula em U , podemos definir o campo ∇f nf = k∇f k na regi˜ao U . No caso particular em que ` e´ uma func¸a˜ o linear, a superf´ıcie S` e´ um plano, e tem gradiente constante. Se u e v forem dois paralelos a este plano e p ∈ S` , ent˜ao ΦG` (p, u, v) e´ o volume do s´olido determinado por u, v e pelo vetor (∇`)(p) G` (p) = . k(∇`)(p)k Como este u´ ltimo vetor e´ normal a Sf e tem norma 1, o volume do s´olido coincide com a a´ rea do paralelogramo definido por u e v. Por isso, a forma diferencial ΦGf e´ conhecida como elemento de a´ rea e denotada por dA. Note, contudo, que trata-se apenas de uma notac¸a˜ o: dA n˜ao corresponde, em geral, a` diferencial total de nenhuma func¸a˜ o. Em geral, os vetores do campo G s˜ao unit´arios e normais a Sf em cada ponto desta superf´ıcie. Portanto, o fluxo deste campo por Sf deve ser igual a a´ rea de Sf . Em outras palavras, Z a´ rea de Sf = dA, σ
onde dA = Φ∇f /k∇f k e σ e´ uma parametrizac¸a˜ de Sf . Considere, por exemplo, a esfera x2 +y 2 +z 2 = a2 . Neste caso, f = x2 + y 2 + z 2 − a2 , de modo que 1 nf = (x, y, z), r p 2 e´ um campo central, onde r = x + y 2 + z 2 , como usual. Parametrizando Sf em coordenadas esf´ericas σe (x, y, z) = (a cos(θ) sen(φ), a sen(θ) sen(φ), a cos(φ)), onde a e´ o raio (constante!) da esfera. Da´ı, σe∗ (dx ∧ dy) = a2 sen(φ) cos(φ)dθ ∧ dφ σe∗ (dx ∧ dz) = −a2 sen(θ) sen2 (φ)dθ ∧ dφ σe∗ (dy ∧ dz) = a2 cos(θ) sen2 (φ)dθ ∧ dφ. Portanto, ap´os os devidos cancelamentos, σe∗ (dA) = a2 sen(φ)dθ ∧ dφ.
112
3. 2-FORMAS
Logo, a a´ rea da esfera e´ igual a Z Z 2π Z dA =
2π
σe
a2 sen(φ)dθ ∧ dφ = 4πa2 ,
0
0
como seria de esperar. Suponha, agora, que h´a outra func¸a˜ o ψ, definida na mesma regi˜ao U . Multiplicando ψ por dA obtemos uma nova 2-forma em U , cuja integral Z ψdA σ
e´ conhecida como a integral de superf´ıcie de ψ em em Sf . Como ψ e´ uma func¸a˜ o que toma valores reais, ψdA = Φψ∇f /k∇f k . Vejamos o que acontece quando F ∈ X(U ), f ∈ O(U ) e ψ e´ igual ao produto escalar dos campos F e nf . Neste caso, (F · nf )
∇f = Projnf (F ), k∇f k
que e´ a projec¸a˜ o do campo F na direc¸a˜ o da normal a Sf . Contudo, se u e v s˜ao tangentes a Sf em p, ent˜ao u × v aponta na direc¸a˜ o da normal a Sf , de modo que F (p) · (u × v) = Projnf (F )(p) · (u × v). Portanto, ((F · nf )dA)(p, u, v) = ΦF (p, u, v), desde que u e v sejam tangentes a Sf em p. Como esta hip´otese e´ satisfeita quando ∂σ ∂σ u= e v= , ∂s ∂t temos que σ ∗ ((F · nf )dA) = σ ∗ (ΦF ). Logo, a integral de superf´ıcie Z Z (F · nf )dA = σ ∗ ((F · nf )dA) σ
R
e´ igual a Z R
σ ∗ (ΦF ) =
Z ΦF . σ
Esta igualdade desempenhar´a um papel importante na interpretac¸a˜ o vetorial que daremos ao teorema de Stokes no pr´oximo par´agrafo.
˜ 5. APLICAC¸OES
113
5.3. A variante vetorial. Antes de passar a` s aplicac¸o˜ es do teorema de Stokes ao eletromagnetismo, precisamos considerar sua traduc¸a˜ o em termos da an´alise vetorial tradicional. Isto e´ , sem usar formas diferenciais. Comec¸aremos com a vers˜ao bidimensional do teorema de Stokes, que foi originalmente enunciada por George Green em sua monografia [6, p. ]. T EOREMA DE G REEN . Seja A uma regi˜ao do plano parametrizada por um retˆangulo. Se F = (F1 , F2 ) e´ um campo definido em uma regi˜ao do plano que cont´em A, ent˜ao Z Z ∂F2 ∂F1 − dxdy. F = ∂x2 ∂x1 ∂A A Seja σ uma 1-c´elula contida em uma regi˜ao U de R3 . Para poder enunciar a vers˜ao vetorial do teorema de Stokes em dimens˜ao 3, precisamos explicitar Z dτF σ
em termos de uma integral dupla em cujo integrando o rotacional aparece. Mas, Z Z dτF = Φrot(F ) , σ
σ
onde σ e´ uma 2-c´elula sobre o retˆangulo plano R. Contudo, usando a igualdade entre integral do fluxo e integral de superf´ıcie enunciada ao final do §5.2 temos que Z Z ψ(rot(F ) · GF )dA.
Φrot(F ) = σ
σ
Isto nos permite enunciar a vers˜ao vetorial do teorema de Stokes. ˜ vetorial). Seja σ uma 2-c´elula. Se F = T EOREMA DE S TOKES (versao (F1 , F2 , F3 ) e´ um campo definido em uma regi˜ao aberta do plano que cont´em σ, ent˜ao Z Z (rot(F ) · N )dσ.
F = ∂σ
σ
´ 5.4. Campo eletrico de uma carga pontual. Comec¸amos nossas aplicac¸o˜ es ao eletromagnetismo calculando o fluxo do campo el´etrico correspondente a uma carga pontual q > 0 atrav´es de uma esfera. Pela lei de Coulomb, este campo e´ dado por kq (x, y, z), E(x, y, z) = 2 2 (x + y + z 2 )3/2 onde k e´ uma constante, que n˜ao precisamos explicitar. Para calcular o fluxo, usamos a 2-forma correspondente, que neste caso e´ kq (xdy ∧ dz − ydx ∧ dz + zdx ∧ dy). ΦE = 2 (x + y 2 + z 2 )3/2 Como o campo e´ central, e a integrac¸a˜ o ser´a sobre a superf´ıcie de uma esfera, e´ melhor usar coordenadas esf´ericas: S(x, y, z) = (r cos(θ) sen(φ), r sen(θ) sen(φ), r cos(φ)),
114
3. 2-FORMAS
onde r e´ o raio (constante!) da esfera. Da´ı, S ∗ (dx ∧ dy) = r2 sen(φ) cos(φ)dθ ∧ dφ S ∗ (dx ∧ dz) = r2 sen(θ) sen2 (φ)dθ ∧ dφ S ∗ (dy ∧ dz) = −r2 cos(θ) sen2 (φ)dθ ∧ dφ. Portanto, ap´os os devidos cancelamentos, S ∗ (ΦE ) = −kq cos2 (φ) sen(φ)dθ ∧ dφ. Portanto, o fluxo total atrav´es da esfera e´ Z Z Z 2π Z π ∗ ΦE = S (ΦE ) = −kq cos2 (φ) sen(φ)dθdφ, S
R
0
0
que e´ facilmente integr´avel e d´a Z π (5.2) ΦE = 2πkq cos2 (φ) = 4πkq. 0
S
Note que n˜ao e´ f´acil calcular, desta maneira, o valor do fluxo atrav´es de superf´ıcies mais gerais. Afinal, se a parametrizac¸a˜ o for muito complicada, os c´alculos podem ficar intrat´aveis. No entanto, com a ajuda da vers˜ao do teorema de Stokes que apresentaremos no pr´oximo cap´ıtulo, ser´a f´acil determinar o fluxo de uma carga pontual atrav´es de qualquer superf´ıcie. E mais, o resultado geral ser´a uma conseq¨ueˆ ncia dos c´alculos deste par´agrafo. E como se isto n˜ao bastasse, poderemos tratar tamb´em do caso de uma quantidade finita qualquer de cargas pontuais. ˜ 5.5. As equac¸oes de Maxwell. O estudo dos campos eletromagn´eticos est´a completamente contido nas equac¸o˜ es introduzidas por J. C. Maxwell em 1873. Das quatro equac¸o˜ es, duas dependem de conceitos que ainda n˜ao introduzimos, as outras duas podem ser formuladas da seguinte maneira ∂B ∂t 1 1 ∂E + J , rot(B) = 2 c ∂t 0 rot(E) = −
onde E e B representam, respectivamente, os campos el´etrico e magn´etico, J e´ a densidade de corrente (que tamb´em e´ um vetor), c e 0 s˜ao constantes cujo significado f´ısico n˜ao precisamos considerar. Segundo a primeira equac¸a˜ o, o rotacional do campo el´etrico e´ dado por uma variac¸a˜ o do campo magn´etico com o tempo. J´a a segunda equac¸a˜ o nos diz que o rotacional do campo magn´etico depende, n˜ao apenas da variac¸a˜ o do campo el´etrico, mas tamb´em da densidade de corrente. Para simplificar, consideraremos apenas o caso est´atico, em que nenhuma das quantidades acima varia com o tempo. Temos, assim, que o vetor J e´
˜ 5. APLICAC¸OES
115
constante, e que as derivadas de E e B com respeito a t s˜ao nulas. Portanto, as equac¸o˜ es se simplificam para rot(E) = 0 J . c2 0 Seja C uma curva fechada no espac¸o. Se C for a fronteira de um 2encadeamento S, ent˜ao, pelo teorema de Stokes Z Z Z E= τE = dτE . rot(B) =
C
∂S
S
Contudo, pela equac¸a˜ o (5.1), dτE = Φrot(E) = 0, donde
Z E = 0. C
Portanto, o campo eletrost´atico tem circulac¸a˜ o nula. A situac¸a˜ o e´ completamente diferente no caso do campo magn´etico. Repetindo o argumento acima para B, vemos que Z Z B= Φrot(B) . C
S
Mas, pela equac¸a˜ o de Maxwell, Φrot(B) = ΦJ/c2 0 =
1 c2 0
ΦJ
donde, Z 1 ΦJ . c2 0 S C Resta-nos entender o que esta u´ ltima integral representa. Para isto precisamos compreender melhor o significado de J. Imagine a corrente como um fluxo de el´etrons ao longo de um fio e considere uma sec¸a˜ o transversal T do fio. Se a corrente n˜ao varia com o tempo, ent˜ao os el´etrons que passam por um ponto p ∈ T tˆem sempre a mesma velocidade v(p). Se a densidade de carga no fio e´ constante e igual a ρ ent˜ao J(p) = ρv(p). Portanto, Z Z
(5.3)
B=
ΦJ T
representa a quantidade total de carga que flui atrav´es da sec¸a˜ o T ; isto e´ , a integral representa a corrente atrav´es de T . Assim, voltando a` equac¸a˜ o (5.3), podemos reescrevˆe-la na forma Z IC B= 2 . c 0 C onde IC representa a corrente que passa atrav´es da curva fechada C. Esta equac¸a˜ o e´ conhecida como lei de Amp´ere.
116
3. 2-FORMAS
A lei de Amp´ere pode ser usada para calcular a intensidade do campo magn´etico de um fio reto infinito de espessura desprez´ıvel, estendido ao longo do eixo z. Por´em, para viabilizar este c´alculo precisamos de uma hip´otese adicional, que resulta da simetria do campo: sobre qualquer cilindro cujo eixo e´ o pr´oprio fio, o campo e´ constante, tangente ao cilindro e perpendicular ao fio. Em particular, o campo e´ constante sobre uma circunferˆencia de raio r, desenhada sobre um plano perpendicular ao fio, cujo centro e´ o ponto de intersec¸a˜ o do fio com o plano. Denotando por Cr esta circunferˆencia, temos que Z B = 2πrkB(p)k, para qualquer p ∈ Cr . Cr
Portanto, pela lei de Amp´ere, 2πrkB(p)k =
IC , c2 0
donde
1 IC . 2πc2 0 r Como r e´ a distˆancia de p = (x, y, z) ao fio, podemos reescrever esta f´ormula como 1 I p C kB(x, y, z)k = . 2πc2 0 x2 + y 2 kB(p)k =
Finalmente, levando em conta que o campo e´ tangente a Cr , IC 1 (−y, x, 0). B(x, y, z) = 2πc2 0 (x2 + y 2 ) Podemos obter esta mesma f´ormula, sem recorrer a nenhuma hip´otese extra, calculando o potencial do campo; veja [11, p. 41]. ´ Comec¸amos relembrando as definic¸o˜ es de for5.6. Lema de Poincare. mas exatas e fechadas. Seja α uma 1-forma diferencial definida em uma regi˜ao U de Rn . Dizemos que α e´ fechada se dα = 0, e que e´ exata se existe f ∈ O(U ) tal que α = df . Mas, como vimos no §2.5, d(df ) = 0; isto e´ , toda forma exata e´ fechada. Nosso objetivo e´ discutir a rec´ıproca desta afirmac¸a˜ o; isto e´ : toda 1-forma fechada e´ exata? Como a resposta e´ “nem sempre”, precisamos entender de que a resposta depende. Comec¸amos estudando uma regi˜ao sobre a qual todas as formas fechadas s˜ao exatas. Lembre-se que uma regi˜ao U do Rn e´ convexa se, dados dois pontos quaisquer p e q em U , o segmento de reta que vai de p a q est´a totalmente contido em U . L EMA DE P OINCAR E´ (para 1-formas). Toda 1-forma fechada definida em uma regi˜ao convexa de Rn e´ exata.
˜ 5. APLICAC¸OES
117
˜ . Seja U uma regi˜ao de Rn e α uma forma fechada deD EMONSTRAC¸ AO finida em U . Tendo em vista o teorema do §5.2, basta mostrar que a circulac¸a˜ o de α e´ zero sobre qualquer 1-encadeamento fechado E. Isto e´ f´acil de provar desde que E seja a fronteira de um 2-encadeamento E. Se for este o caso, ent˜ao, pelo teorema de Stokes, Z Z Z α= α= dα = 0, E
E
∂E
j´a que α e´ fechada. Portanto, para completar a demonstrac¸a˜ o basta construir E a partir de E. Para isto suponha que E = σ1 + · · · + σm , onde os σs s˜ao 1-c´elulas parametrizadas por [0, 1] e digamos que σi (0) = pi . Como o encadeamento e´ fechado, temos que σi (1) = pi+1 e σm (1) = p1 . Seja, agora, q um ponto que n˜ao pertence a E, e considere as 2-c´elulas definidas por Si (s, t) = (1 − s)p0 + tσi (t), 2 para (s, t) ∈ [0, 1] . Denotando por ri a reta que vai de q a pi , podemos considerar esta 2-c´elula como um triˆangulo (curvil´ıneo), com v´ertice em q, cujos lados s˜ao as retas ri e ri+1 . Mais precisamente, ∂(Si ) = σi − ri+1 + ri , Portanto, se E=
m X
Si ,
i=1
ent˜ao E=
m X
∂(Si ) =
i=1
m X
(σi − ri+1 + ri );
i=1
cuja forma reduzida e´ E=
m X
σi = E.
i=1
Note que a construc¸a˜ o de E assume, implicitamente, que a regi˜ao U e´ convexa, do contr´ario n˜ao poder´ıamos garantir que as retas ri pertencessem a U . Combinando o lema de Poincar´e com o teorema do §5.2, obtemos uma caracterizac¸a˜ o bastante simples dos campos conservativos em regi˜oes convexas. ´ C OROL ARIO . Um campo F , definido em uma regi˜ao convexa de Rn , e´ conservativo se, e somente se, τF e´ uma forma fechada. Quando n = 3 este resultado pode ser reformulado em termos do rotacional do campo.
118
3. 2-FORMAS
´ C OROL ARIO . Um campo F , definido em uma regi˜ao convexa de R3 , e´ conservativo se, e somente se, rot(F ) = 0 e´ uma forma fechada. ˜ exatas. Tendo mostrado que toda forma 5.7. Formas fechadas, nao fechada sobre um regi˜ao aberta convexa e´ exata, passamos agora ao caso em que a regi˜ao n˜ao e´ convexa. Para isto consideramos o campo magn´etico de um fio infinito, estendido ao longo do eixo z. Como o campo e´ constante ao longo de qualquer cilindro cujo eixo e´ o fio, basta considerar o que acontece em um plano perpendicular a z, digamos xy. Restringindo o campo a este plano obtemos 1 (−y, x, 0), B(x, y) = 2 (x + y 2 ) onde escolhemos a intensidade da corrente de modo que o quociente dos termos constantes seja 1. Esta u´ ltima hip´otese n˜ao e´ necess´aria, e s´o foi feita para facilitar a notac¸a˜ o. Este campo est´a definido na regi˜ao U = R2 \ {(0, 0)} e x −y dx + 2 dy. τ = τB = 2 2 x +y x + y2 Um c´alculo direto, que ser´a deixado por sua conta, mostra que dτ = 0. Logo a forma τ e´ fechada. Considere, agora, a curva C : [0, 2π] → U que corresponde a` circunferˆencia de raio 1 parametrizada por C(t) = (cos t, sent). 2
2
Como sen (t) + cos (t) = 1, C ∗ (τ ) = −sen(t)d(cos(t)) + cos td(sen(t)) = (sen2 (t) + cos2 t)dt = dt. Mas isto significa que, Z
Z τ=
C
2π
dt = 2π. 0
Contudo, pelo corol´ario 5.3, se τ fosse uma forma exata, a integral deveria ter dado zero, porque o caminho e´ fechado. Portanto, τ n˜ao pode ser exata, e obtivemos o exemplo desejado. Vamos imaginar, agora, que B define, n˜ao um campo magn´etico, mas sim um campo de velocidades em R2 \ {(0, 0)}. Podemos visualizar isto como modelando um fluxo laminar definido em uma superf´ıcie na qual est´a inserida um prego (situado na origem do sistema de eixos). A presenc¸a deste prego faz com que o campo n˜ao esteja definido em (0, 0). Utilizando a terminologia introduzida no §5.1 temos, assim um campo de vorticidade zero, cuja circulac¸a˜ o sobre uma curva fechada que envolve a origem e´ n˜ao nula. Voltando a` s formas, vocˆe pode ter ficado com a impress˜ao de que, se usando apenas func¸o˜ es racionais bem simples, conseguimos uma 1-forma n˜ao exata em R2 \ {(0, 0)}, que dizer ent˜ao se usarmos uma combinac¸a˜ o de senos, co-senos, logaritmos e exponenciais! A verdade, e´ que nada essencialmente pior que x −y dx + 2 dy τ = τB = 2 x + y2 x + y2 ocorre, como mostra o pr´oximo teorema.
6. RECAPITULANDO
119
T EOREMA . Seja U = R2 \ {(0, 0)}. Se α ∈ Ω1 (U ) e´ fechada, ent˜ao α = kτ + df, para algum f ∈ O(U ) e algum k ∈ R. ˜ . Seja σ a 1-c´elula que corresponde a uma circunferˆenD EMONSTRAC¸ AO cia com centro na origem e raio 1; isto e´ , σ(θ) = (cos(θ), sen(θ)) onde 0 ≤ θ ≤ 2π. Considere 1 k= 2π
Z α, σ
que, claramente, e´ um n´umero real. Seja, agora, E um encadeamento fechado qualquer em U . Como α e´ fechada, temos pelo teorema de Stokes que Z α = 0. E−C
Portanto, Z
Z α=
α = 2πk.
E
C
Se k = 0, ent˜ao pelo teorema do §5.2, α e´ exata. Logo, existe f ∈ O(U ) tal que df = α, e o teorema est´a provado neste caso. Suponha, agora, que k 6= 0 e considere a forma β = α − kτ. Como Z
Z α−k
β= C
Z
C
τ = 2πk − k2π = 0, C
podemos concluir, da parte anterior do argumento, que β = df para alguma func¸a˜ o f ∈ O(U ). Portanto, que α − kτ = β = df ; donde α = kτ + df , como quer´ıamos mostrar.
6. Recapitulando Nesta sec¸a˜ o recapitulamos tudo o que foi feito neste segundo cap´ıtulo. Note que seguimos os mesmos passos utilizados na definic¸a˜ o de 1-formas e suas integrais no cap´ıtulo anterior. Ao longo de toda esta sec¸a˜ o U ser´a uma regi˜ao de Rn e V uma regi˜ao de m R .
120
3. 2-FORMAS
˜ 6.1. Definic¸ao. Uma 2-forma diferencial e´ uma aplicac¸a˜ o α : U × Rn × Rn → R, que satisfaz a` s seguintes condic¸o˜ es: (1) fixando p0 ∈ U , e considerando ω(p0 , v, w) como func¸a˜ o apenas de v e w, temos uma aplicac¸a˜ o bilinear alternada de Rn × Rn em R; (2) fixando v0 , w0 ∈ Rn , e considerando ω(p, v0 , w0 ) como func¸a˜ o apenas de p, temos uma func¸a˜ o diferenci´avel de U em R. O conjunto das 2-formas em U , que e´ denotado por Ω2 (U ), e´ um espac¸o vetorial relativamente a` soma de formas, e a` sua multiplicac¸a˜ o por escalares, conforme definidas no §2.2. 6.2. Produto exterior. Sejam α e β 1-formas diferenciais definidas em U , definimos o produto exterior α ∧ β em um ponto (p, v, w) ∈ U × Rn × Rn pela f´ormula (α ∧ β)(p, v, w) = det
α(p, v) β(p, v) . α(p, w) β(p, w)
A operac¸a˜ o assim definida satisfaz as seguintes propriedades Anti-comutatividade: α ∧ β = −β ∧ α; Distributividade: α + kβ) ∧ η = α ∧ η + k(β ∧ η); onde η ∈ Ω1 (U ) e´ outra 1-forma e k e´ um escalar. A anti-comutatividade implica que α ∧ α = 0, para qualquer 1-forma α em U . O produto exterior nos permite expressar qualquer 2-forma em U como a1 dx1 ∧ dx2 + a2 dx1 ∧ dx3 + a3 dx2 ∧ dx3 , onde a1 , a2 , a3 ∈ O(U ). Podemos us´a-lo tamb´em para definir a diferencial total da 1-forma n X α= bi dxi , i=1
como sendo d(α) =
n X
dbi ∧ dxi .
i=1
6.3. Campos e formas. A um campo vetorial F : U → R3 cujas func¸o˜ es coordenadas s˜ao F1 , F2 , F3 , fazemos corresponder a 2-forma ΦF = F1 dx2 ∧ dx3 − F2 dx1 ∧ dx3 + F3 dx1 ∧ dx2 , onde x1 , x2 e x3 s˜ao as coordenadas de R3 Esta correspondˆencia e´ bijetiva, e nos permite tratar a an´alise vetorial seja na linguagem de formas, seja na linguagem de campos.
6. RECAPITULANDO
121
6.4. Superf´ıcies. Uma 2-c´elula em U e´ uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel C : R → U , onde R = [a, a0 ] × [b, b0 ] e´ um retˆangulo em R com a0 > a e b0 > b. Denotando por L1 , L2 , L3 e L4 os lados consecutivos de R parametrizados de maneira que R e´ percorrido no sentido anti-hor´ario, temos que a fronteira de σ e´ a forma reduzida do encadeamento de curvas σ(L1 ) + σ(L2 ) − σ(L3 ) − σ(L4 ). Um 2-encadeamento em U e´ uma express˜ao da forma E = c1 σ1 + · · · + ck σk , onde σ1 , . . . , σk s˜ao 2-c´elula em U e os cs s˜ao n´umeros inteiros. A fronteira de E e´ a forma reduzida do encadeamento de curvas c1 ∂σ1 + · · · + ck ∂σk . 6.5. Imagem inversa. Dada uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel φ : V → U , onde V e´ uma regi˜ao aberta de Rm , definimos a imagem inversa de uma 2forma X ω= aij dxi ∧ dxj ∈ Ω2 (U ), 1≤i<j≤n
como sendo φ∗ (α) =
X
(aij · φ)dφi ∧ dφj .
1≤i<j≤n
onde φ1 , . . . , φn s˜ao as func¸o˜ es coordenadas de φ. A imagem inversa determina uma transformac¸a˜ o linear de Ω2 (U ) em Ω2 (V ) que satisfaz σ ∗ (df ) = dσ ∗ (f ). 6.6. Integral. Seja σ uma superf´ıcie em U parametrizada pelo retˆangulo plano R = [a, a0 ] × [b, a0 ]. A imagem inversa de ω ∈ Ω2 (U ) por σ pode ser escrita na forma σ ∗ (ω) = gdt1 ∧ dt2 , onde g = g(t1 , t2 ) e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel em R. A integral de ω sobre σ e´ dada por Z Z Z a0 Z b0 gdt1 ∧ dt2 , ω= σ ∗ (ω) = σ
R
a
b
que e´ a integral usual da func¸a˜ o g no retˆangulo R. A integral de ω ao longo do 2-encadeamento E = c1 σ1 + · · · + ck σk , e´ definida como sendo Z Z Z ω = c1 ω + · · · + ck ω. E
σ1
σk
122
3. 2-FORMAS
6.7. Teorema de Stokes. Seja σ uma superf´ıcie. O principal resultado deste cap´ıtulo e´ o seguinte teorema, que conecta a integral de uma 1-forma na fronteira de σ com a integral de sua diferencial sobre σ. T EOREMA DE S TOKES . Seja α uma 1-forma diferencial definida em uma regi˜ao aberta U de Rn . Se E e´ um 2-encadeamento contido em U , ent˜ao Z Z α= dα. ∂E
E
7. Exerc´ıcios 1. Parametrize cada uma das superf´ıcies dadas abaixo: (a) o cilindro x2 + y 2 = a2 ; (b) o cone a2 z 2 = x2 + y 2 ; (c) o parabol´oide a2 z = x2 + y 2 ; (d) o hiperbol´oide z 2 = x2 − y 2 . ˜ : use func¸o˜ es hiperb´olicas para parametrizar o hiperbol´oide. S UGEST AO 2. Calcule o fluxo dos campos abaixo atrav´es das superf´ıcies indicadas: (a) F (x, y, z) = (x2 , −y 3 , z) atrav´es do quadrado [0, 1] × [0, 1] × {2}; (b) F (x, y, z) = (3xy 2 , 3x2 y, 0) atrav´es da circunferˆencia de raio unit´ario e centro na origem, contida no plano z = 0; (c) F (x, y, z) = (x3 , y 3 , 0) atrav´es circunferˆencia de raio unit´ario e centro na origem, contida no plano z = 0; (d) F (x, y, z) = (3xy 2 , 3x2 y, z 3 ) atrav´es da esfera de raio unit´ario e centro na origem; (e) F (x, y, z) = (x, y, z) atrav´es da esfera de raio unit´ario e centro na origem; 3. Calcule as imagens inversas das seguintes formas sob as aplicac¸o˜ es indicadas: (a) xdy ∧ dz sob σ(u, v) = (cos(uv), sen(uv), uv 2 ); (b) xydz ∧ dx sob σ(u, v) = (u cos(v), u + v, u sen(v)); (c) z 3 dx ∧ dy sob σ(u, v) = (eu + v, eu − v, 2); (d) dx ∧ dy sob a transformac¸a˜ o de coordenadas polares para coordenadas cartesianas; (e) xdy ∧ dz + ydz ∧ dx + zdx ∧ dy sob a transformac¸a˜ o de coordenadas esf´ericas para coordenadas cartesianas; 4. Calcule a integral da forma xdy ∧ dz + ydx ∧ dy nos encadeamentos indicados: (a) a 2-c´elula dada por x = u + v,
y = u2 − v 2 e z = uv
com 0 ≤ u ≤ 1 e 0 ≤ v ≤ 1;
7. EXERC´ICIOS
123
(b) a porc¸a˜ o do cilindro x2 + y 2 = 1 com 0 ≤ z ≤ 1, orientada de modo que o vetor normal aponte para fora; (c) a superf´ıcie do cubo [0, 1] × [0, 1] × [0, 1], sem a tampa superior, orientado de modo que o vetor normal aponte para fora. 5. Calcule a integral da 2-forma (x2 + y 2 )dx ∧ dy na regi˜ao D dentro do quadrado |x| + |y| = 4 e fora do c´ırculo x2 + y 2 = 1. 6. Calcule a integral do fluxo do rotacional de cada um dos campos abaixo nas superf´ıcies indicadas: (a) F (x, y, z) = (y, z, x) no triˆangulo cujos v´ertices s˜ao (1, 0, 0), (0, 1, 0) e (0, 0, 1); (b) F (x, y, z) = (x + y, y − z, x + y + z) no hemisf´erio x2 + y 2 + z 2 = a2 e z ≥ 0. 7. Considere o campo vetorial F (x, y, z) = (yez , xez , xyez ). Seja E um 2encadeamento fechado. Calcule a integral de F ao longo da fronteira de E. 8. Calcule o rotacional de um campo central. 9. Calcule a vorticidade de cada um dos campos de velocidades abaixo. Quais deles representam um campo irrotacional? (a) F (x, y, z) = (ay, 0, 0); (b) F (x, y, z) = (a/r2 , 0, 0); (c) F (x, y, z) = (ay, 0, 0); (d) F (x, y, z) = (0, arn , 0); p onde a 6= 0 e´ uma constante e r = x2 + y 2 + z 2 . 10. Seja C o 1-encadeamento fechado que limita um 2-encadeamento conexo E. Mostre que a a´ rea de E e´ igual a Z 1 xdy − ydx. 2 C 11. Calcule a a´ rea das seguintes regi˜oes: (a) a regi˜ao limitada pela hipocicl´oide x = a cos3 (t) e y = a sen3 (t), onde 0 ≤ t ≤ 2 e a > 0; (b) a regi˜ao limitada por um arco de cicl´oide x = a(t − sen(t)) e y = a(1 − cos(t)), com a > 0 e 0 ≤ t ≤ 2; 12. Seja F (x, y, z) = (x, 0, −2z) um campo definido em todo o R3 . (a) Determine ΦF .
124
3. 2-FORMAS
(b) Determine uma parametrizac¸a˜ o para a esfera x2 + y 2 + z 2 = 1, de modo que o vetor normal sempre aponte para fora. (c) Calcule o fluxo de F atrav´es da esfera x2 +y 2 +z 2 = 1 com a orientac¸a˜ o determinada acima. 13. Mostramos no §2.4 que se λ1 , λ2 e λ3 s˜ao 1-formas constantes e k e´ um escalar, ent˜ao (λ1 + kλ2 ) ∧ λ3 = λ1 ∧ λ3 + k(λ2 ∧ λ3 ). Use esta propriedade e a anti-comutatividade de ∧ para provar que λ1 ∧ (λ2 + kλ3 ) = λ1 ∧ λ2 + k(λ1 ∧ λ3 ). 14. Seja σ uma 2-c´elula definida em uma regi˜ao U de R3 . Suponha que F e´ um campo de vetores definido R em U e cujo rotacional e´ tangente a σ em todos os seus pontos. Calcule ∂σ τF . 15. O campo el´etrico de um fio infinito cuja densidade de carga e´ uniforme e´ dado por k (x, y), E(x, y, z) = 2 x + y2 onde k e´ uma constante Calcule o fluxo deste campo atrav´es de um cilindro cujo eixo e´ o pr´oprio fio. 16. Seja F um campo vetorial definido em uma regi˜ao U de R3 . Prove as seguintes f´ormulas: (a) rot(∇g) = 0; (b) rot(gF ) = [∇g, F ] + g rot(F ); onde g ∈ O(U ). A definic¸a˜ o do comutador [, ] pode ser encontrada na p´agina 11. ˜ : traduza as afirmac¸o˜ es em termos de formas diferenciais. S UGEST AO 17. Determine f´ormulas para o rotacional de um campo de R3 (a) em coordenadas cil´ındricas; (b) em coordenadas esf´ericas. 18. Seja σ uma 2-c´elula contida em uma regi˜ao U de R3 e f, g ∈ O(U ). Prove as seguintes identidades: Z Z (a) τf ∇g = Φ∇f ×∇g ; ∂σ σ Z (b) τf ∇g+g∇f = 0; ∂σ
19. Seja U a regi˜ao de R2 definida por x > 0 e seja −x −y dx + 2 dy. α= 2 2 x +y x + y2 (a) Mostre que U e´ convexa.
8. PROBLEMAS
125
(b) Mostre que α e´ uma 1-forma fechada em U . (c) Mostre que α e´ exata em U e determine f ∈ O(U ) de modo que α = df . (d) Explique porque isto n˜ao contradiz a propriedade de α estabelecida no §5.7. p 20. Seja r = x2 + y 2 e considere um campo no plano definido por F (x, y) = (−g(r)y, g(r)x), onde g e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel de uma vari´avel. (a) Determine uma condic¸a˜ o necess´aria e suficiente para que τF seja fechada. (b) Resolva a equac¸a˜ o diferencial obtida em (a) e determine g como func¸a˜ o de r. (c) Em que regi˜ao o campo assim obtido est´a definido? Este campo e´ conservativo? Justifique detalhadamente sua resposta. ˜ : a equac¸a˜ o diferencial obtida em (a) fica f´acil de resolver se S UGEST AO vocˆe multiplic´a-la por r e usar a regra da derivac¸a˜ o do produto.
8. Problemas 1. Prove a distributividade do produto exterior de 1-formas n˜ao constantes sobre a adic¸a˜ o. 2. Sejam x1 , x2 , y1 , y2 coordenadas de R4 e seja xdy a 1-forma de R4 definida por xdy = dx1 ∧ dy1 + dx2 ∧ dy2 . (a) Calcule d(xdy). Esta e´ uma 2-forma de R4 que vamos denotar por dx ∧ dy (por raz˜oes o´ bvias). (b) Calcule a integral de dx ∧ dy em uma superf´ıcie fechada e mostre que d´a zero. 3. Seja f um polinˆomio nas vari´aveis x e y e Cf a curva alg´ebrica por ele definida em R2 ; veja p´agina 11 para a definic¸a˜ o. Mostre que um campo vetorial F de R2 e´ tangente a Cf em todos os seus pontos se, e somente se, (∇f )(p) · F(p) = 0, para todo p ∈ Cf . 4. Seja F um campo vetorial polinomial de R2 . A curva alg´ebrica definida pelo polinˆomio f , nas vari´aveis x e y, e´ uma soluc¸a˜ o alg´ebrica de F se o polinˆomio (∇f · F)(x, y) e´ m´ultiplo de f . Se F = (F1 , F2 ), defina a forma αF = F2 dx − F1 dy. (a) Mostre que se f e´ uma soluc¸a˜ o alg´ebrica de F, ent˜ao F e´ tangente a Cf em todo ponto p ∈ Cf em que nem F nem o gradiente de f se anulam.
126
3. 2-FORMAS
(b) Mostre que f e´ uma soluc¸a˜ o alg´ebrica de F se, e somente se, αF ∧ df = f η, onde η e´ uma 2-forma polinomial em R3 . (c) Mostre que se αF for exata ent˜ao F tem infinitas soluc¸o˜ es alg´ebricas distintas. 5. Mostre que um campo linear F sempre tem pelo menos uma reta como soluc¸a˜ o alg´ebrica.
Cap´ıtulo 4 3-formas Neste cap´ıtulo introduzimos 3-formas e estudamos uma vers˜ao do teorema de Stokes que nos permite passar de integrais de 2-formas a integrais de 3-formas. Traduzindo este resultado na linguagem do c´alculo diferencial, obteremos o teorema de divergˆencia de Gauss. Ao contr´ario dos outros cap´ıtulos, introduzimos 3-formas e outros conceitos correlatos diretamente, sem nenhuma motivac¸a˜ o f´ısica preliminar. Afinal de contas, tomando por base a teoria de 1-formas e 2-formas, n˜ao e´ dif´ıcil advinhar o que deve ser uma 3-forma, nem o que devemos fazer para integr´a-las. 1. 3-formas Comec¸amos generalizando o conceito de f´ormula bilinear alternada. 1.1. Formas multilineares alternadas. Uma forma k-linear de Rn e´ definida recursivamente como sendo uma aplicac¸a˜ o ω : Rn × · · · × Rn → R, | {z } k vezes
que satisfaz a` seguinte condic¸a˜ o: dado um vetor v0 ∈ Rn , a aplicac¸a˜ o ωj : Rn × · · · × Rn → R, para j = 1, . . . , k | {z } k−1 vezes
obtida fixando-se a j-´esima coordenada de ω como sendo igual a v0 , e´ k − 1-linear. Por exemplo, ω : Rn × Rn × Rn → R, e´ 3-linear se, para todo v0 ∈ Rn , as formas ω1 (u, w) = ω(v0 , u, w), ω2 (u, w) = ω(u, v0 , w), e ω3 (u, w) = ω(u, w, v0 ), s˜ao bilineares. Uma forma k-linear ω de Rn e´ alternada se ω(v1 , . . . , vi , . . . , vj , . . . vk ) = −ω(v1 , . . . , vj , . . . , vi , . . . vk ) 127
128
4. 3-FORMAS
quaisquer que sejam v1 , . . . , vi , . . . , vj , . . . vk ∈ Rn . Em outras palavras, trocando de posic¸a˜ o duas entradas de ω, a forma troca de sinal. Como conseq¨ueˆ ncia disto temos que se vi = vj ent˜ao ω(v1 , . . . , vi , . . . , vj , . . . vk ) = 0. Uma forma k-linear alternada tamb´em e´ conhecida como uma k-forma constante. Usando estas propriedades e´ f´acil determinar todas as 3-formas constantes de R3 . Seja ω uma forma 3-linear alternada e u, v, w ∈ R3 . Se e1 , e2 e e3 s˜ao os vetores da base canˆonica, ent˜ao u = a1 e1 + a2 e2 + a3 e3 , onde a1 , a2 , a3 ∈ R. Da linearidade de ω, obtemos (1.1) ω(u, v, w) = a1 ω(e1 , v, w) + a2 ω(e2 , v, w) + a3 ω(e3 , v, w). Mas os ω(ej , v, w) s˜ao formas bilineares alternadas e, como tais, podemos escrevˆe-las usando determinantes. Por exemplo, se v = b1 e1 + b2 e2 + b3 e3 e w = c1 e1 + c2 e2 + c3 e3 ent˜ao, ω(e1 , v, w) = ω(e1 , b2 e2 + b3 e3 , c2 e2 + c3 e3 ), j´a que a forma se anula quando duas entradas quaisquer se repetem. Assim, das propriedades de formas bilineares alternadas temos que b 2 b3 ω(e1 , v, w) = ω(e1 , e2 , e3 ) det c2 c3 Analogamente,
b1 c1
ω(e2 , v, w) = −ω(e1 , e2 , e3 ) det
b3 c3
ao passo que, ω(e3 , v, w) = ω(e1 , e2 , e3 ) det
b1 c1
b2 c2
Substituindo em (1.1), vemos que ω(u, v, w) e´ igual a b b b b b ω(e1 , e2 , e3 ) a1 det 2 3 − a2 det 1 3 + a3 det 1 c2 c3 c1 c3 c1 Por´em, a menos da constante ω(e1 , e2 , e3 ), esta e´ (pela primeira linha) do determinante a1 a2 det[u, v, w] = det b1 b2 c1 c2
.
a expans˜ao em co-fatores a3 b3 c3
Portanto, (1.2)
b2 c2
ω(u, v, w) = ω(e1 , e2 , e3 ) det[u, v, w].
1. 3-FORMAS
129
Como as 3-formas constantes s˜ao aplicac¸o˜ es que tomam valores em R, podemos som´a-las da maneira usual. Isto, e´ , dadas duas 3-formas constantes ω e θ, definimos (ω + θ)(u, v, w) = ω(u, v, w) + θ(u, v, w),
(1.3)
quaisquer que sejam u, v, w ∈ Rn . Que esta f´ormula define uma aplicac¸a˜ o de Rn × Rn × Rn em R, n˜ao h´a d´uvida; a quest˜ao e´ se essa aplicac¸a˜ o e´ 3-linear e alternada. Fixando u0 em (1.3), temos (ω + θ)(u0 , v, w) = ω(u0 , v, w) + θ(u0 , v, w). Contudo, por definic¸a˜ o, ω(u0 , v, w) e θ(u0 , v, w) s˜ao aplicac¸o˜ es bilineares quando consideradas como func¸o˜ es de suas duas u´ ltimas entradas. Assim, (ω + θ)(u0 , v, w) e´ bilinear como func¸a˜ o de v e w. Resultados semelhantes valem para as outras duas escolhas de entradas fixas. Finalmente, (ω + θ)(u, v, w) = ω(u, v, w) + θ(u, v, w) = −ω(u, w, v) − θ(u, w, v); como isto e´ igual a −(ω + θ)(u, w, v), e resultado semelhantes valem para as outras escolhas de entradas. Conclu´ımos, assim, que ω +θ tamb´em e´ alternada. Resumindo: a soma de duas 3-formas constantes e´ uma 3-forma constante. Encerramos este par´agrafo definindo a imagem inversa de uma 3-forma constante por uma aplicac¸a˜ o linear. Dada uma transformac¸a˜ o linear T : Rm → Rn , comec¸amos por definir uma aplicac¸a˜ o ∆ T : Rm × R m × Rm → Rn × Rn × Rn , pela f´ormula ∆T (u, v, w) = (T (u), T (v), T (w)). Como T e´ linear, ∆T (u1 + ku2 , v0 , w0 ) = ∆T (u1 , v0 , w0 ) + k∆T (u2 , v0 , w0 ), onde k e´ um escalar e v1 , v2 , w0 ∈ Rm . F´ormulas semelhantes valem para as outras duas escolhas de entradas. ˜ . Se ω e´ uma 3-forma em Rn ent˜ao a composta ω · ∆T e´ P ROPOSIC¸ AO uma 3-forma em Rm . ˜ . Sejam k e´ um escalar e u1 , u2 , v0 , w0 ∈ Rm , ent˜ao D EMONSTRAC¸ AO (ω · ∆T )(u1 + ku2 , v0 , w0 ) = ω · ∆T (u1 , v0 , w0 ) + kω · ∆T (u2 , v0 , w0 ); ao passo que (ω · ∆T )(u1 , v0 , w0 ) e´ igual a ω(T (u1 ), T (v0 ), T (w0 )) = −ω(T (w0 ), T (v0 ), T (u1 )) = −(ω·∆T )(w0 , v0 , u1 ), donde (ω · ∆T )(u1 , v0 , w0 ) = −(ω · ∆T )(w0 , v0 , u1 ).
130
4. 3-FORMAS
Como f´ormulas semelhantes valem para as outras trocas de posic¸o˜ es dos vetores, podemos concluir que ω · ∆T e´ uma 2-forma constante em Rm , como desej´avamos mostrar. Nos pr´oximos par´agrafos generalizemos tudo isto para 3-formas n˜ao constantes, definidas sobre uma regi˜ao aberta de Rn . 1.2. 3-formas diferenciais. Seja U uma regi˜ao aberta de Rn . Uma 3-forma diferencial em U e´ uma aplicac¸a˜ o ω : U × Rn × Rn × Rn → R, que satisfaz a` s seguintes condic¸o˜ es: (1) fixando p0 ∈ U , e considerando ω(p0 , u, v, w) como func¸a˜ o apenas de u, v e w, temos uma aplicac¸a˜ o 3-linear alternada de Rn ×Rn ×Rn em R; (2) fixando u0 , v0 , w0 ∈ Rn , e considerando ω(p, u0 , v0 , w0 ) como func¸a˜ o apenas de p, temos uma func¸a˜ o diferenci´avel de U em R. O conjunto das 3-formas diferenciais definidas em uma regi˜ao aberta U de Rn ser´a denotado por Ω3 (U ). H´a v´arias operac¸o˜ es que podemos definir em Ω3 (U ), a mais simple das quais e´ a soma. Sejam ω e θ 3-formas diferenciais em U , a soma ω + θ e´ definida em um ponto (p, u, v, w) ∈ U × Rn × Rn × Rn por (1.4)
(ω + θ)(p, u, v, w) = ω(p, u, v, w) + θ(p, u, v, w).
Para que esta definic¸a˜ o seja u´ til, e´ preciso que ω + θ tamb´em seja uma 3-forma diferencial em U , e n˜ao apenas uma aplicac¸a˜ o qualquer. Mas, como vimos no §1.1, a soma de 3-formas constantes e´ uma 3-forma constante, o que prova (1). J´a (2) segue porque a soma de func¸o˜ es diferenci´aveis e´ diferenci´avel. Procedendo de maneira semelhante, podemos mostrar que se ω e´ uma 3forma diferencial em U e f ∈ O(U ), ent˜ao a aplicac¸a˜ o de U × Rn × Rn × Rn em R definida por (f ω)(p, u, v, w) = f (p)ω(p, u, v, w), onde p ∈ U e v, w ∈ Rn tamb´em e´ uma 3-forma diferencial. Um caso particular da multiplicac¸a˜ o de uma 3-forma por uma func¸a˜ o ocorre quando a func¸a˜ o e´ constante. Neste caso o que temos e´ o produto de um escalar por uma 3-forma. Assim, podemos somar 3-formas diferenciais e multiplic´a-las por escalares. Com um pouco de paciˆencia e´ poss´ıvel verificar que estas operac¸o˜ es satisfazem todas as propriedades requeridas para fazer de Ω3 (U ) um espac¸o vetorial sobre R. 1.3. Produto exterior. Nesta sec¸a˜ o queremos introduzir o produto exterior de trˆes 1-formas, assim como o produto de uma 2-forma por uma 1forma. Como seria de esperar, em ambos os casos, teremos como resultado uma 3-forma.
1. 3-FORMAS
131
Comec¸amos com o produto de trˆes 1-formas, α, β e γ, definidas em uma regi˜ao aberta U de Rn . Sejam p ∈ U e u, v, w ∈ Rn . Tomando a definic¸a˜ o do produto exterior de duas 1-formas como ponto de partida, podemos definir α(p, u) α(p, v) α(p, w) (α ∧ β ∧ γ)(p, u, v, w) = det β(p, u) β(p, v) β(p, w) γ(p, u) γ(p, v) γ(p, w) Segue, imediatamente, das propriedades do determinante que a express˜ao (α ∧ β ∧ γ)(p, u, v, w) e´ 3-linear alternada se p estiver fixo. Por outro lado, o determinante e´ uma express˜ao polinomial de suas entradas. Como somas e produtos de func¸o˜ es diferenci´aveis s˜ao diferenci´aveis, temos que esta func¸a˜ o e´ diferenci´avel quando u, v e w est˜ao fixos. Logo, α ∧ β ∧ γ define, corretamente, uma 3-forma diferencial. E´ importante vocˆe notar que h´a uma correlac¸a˜ o entre a ordem em que as 1-formas e os vetores aparecem em (α ∧ β ∧ γ)(p, u, v, w) e sua posic¸a˜ o no determinante. Afinal, qualquer variac¸a˜ o na ordem das linhas ou colunas far´a o determinante mudar de sinal. Por exemplo, β(p, u) β(p, v) β(p, w) (β ∧ α ∧ γ)(p, u, v, w) = det α(p, u) α(p, v) α(p, w) γ(p, u) γ(p, v) γ(p, w) e´ igual a α(p, u) α(p, v) α(p, w) − det β(p, u) β(p, v) β(p, w) γ(p, u) γ(p, v) γ(p, w) que, por sua vez, e´ igual a −(α ∧ β ∧ γ)(p, u, v, w). Portanto, β ∧ α ∧ γ = −(α ∧ βγ). Em particular, se duas entre as trˆes 1-formas s˜ao trocadas de posic¸a˜ o, o sinal do produto exterior muda. Por outro lado, se fizermos duas trocas de posic¸a˜ o, o sinal muda duas vezes, de modo que continua igual ao inicial. Portanto, como no caso do produto exterior de duas 1-formas, o produto de trˆes delas tamb´em e´ anti-comutativo; isto e´ , o sinal troca a cada troca de posic¸a˜ o entre duas das trˆes 1-formas que est˜ao sendo multiplicadas. Como no caso de 2-formas, o produto exterior das 1-formas b´asicas desempenha um papel extremamente importante na teoria. Por isso, vamos calcular dxi ∧ dxj ∧ dxk em (u, v, w) ∈ Rn × Rn × Rn . Se u = a1 e1 + · · · + an en , v = b1 e1 + · · · + bn en e w = c1 e1 + · · · + cn en ent˜ao, por definic¸a˜ o,
dxi (u) dxj (u) dxk (u) (dxi ∧ dxj ∧ dxk )(u, v, w) = det dxi (v) dxj (v) dxk (v) dxi (w) dxj (w) dxk (w)
132
4. 3-FORMAS
Levando em conta que estas 1-formas capturam certas coordenadas dos vetores u, v e w, obtemos ai aj ak (dxi ∧ dxj ∧ dxk )(u, v, w) = det bi bj bk (1.5) ci cj ck Em particular, ( 1 (dxi ∧ dxj ∧ dxk )(ei0 , ej 0 , ek0 ) = 0
se i = i0 , j = j 0 e k = k 0 se i = 6 i0 ou j 6= j 0 ou k 6= k 0 .
Agora que temos a definic¸a˜ o do produto exterior de trˆes 1-formas, podemos expressar uma 3-forma qualquer em termos de coordenadas. Para simplificar a notac¸a˜ o, faremos isto apenas para 3-formas em R3 ; o caso geral fica como exerc´ıcio. Seja p um ponto de uma regi˜ao aberta U de R3 e ω ∈ Ω3 (U ). De acordo com a propriedade (1), a aplicac¸a˜ o ωp : R3 × R3 × R3 → R, definida por ωp (u, v, w) = ω(p, u, v, w), e´ uma 3-forma constante. Portanto, por (1.2) e (1.5), ωp (u, v, w) = ωp (e1 , e2 , e3 )(dx1 ∧ dx2 ∧ dx3 )(u, v, w). Como ωp (e1 , e2 , e3 ) e´ diferenci´avel como func¸a˜ o de p, podemos escrever ω = gdx1 ∧ dx2 ∧ dx3 , onde g : U → R e´ dada por g(p) = ωp (e1 , e2 , e3 ). Assumindo que o produto exterior deve ser sempre distributivo sobre a soma, e´ f´acil descobrir como o produto de uma 2-forma por uma 1-forma deve ser feito para que seja compat´ıvel com o produto de trˆes 1-formas. Mais uma vez, consideraremos apenas o caso em que a regi˜ao aberta U est´a contida em R3 , j´a que este e´ o u´ nico caso necess´ario na maioria de nossas aplicac¸o˜ es posteriores. Sejam α ∈ Ω1 (U ) e ω ∈ Ω1 (U ). Ent˜ao, existem aij ∈ O(U ), tais que X ω= aij dxi ∧ dxj . 1≤i<j≤3
Assumindo a distributividade do produto exterior sobre a soma, X (1.6) α∧ω = ajk α ∧ dxj ∧ dxk . 1≤j 0 e´ um n´umero real. Como de h´abito, n˜ao distinguiremos claramente entre a aplicac¸a˜ o σ e a imagem de R por σ. Para os prop´ositos deste livro um s´olido e´ simplesmente uma 2-c´elula, e os dois termos ser˜ao usados de maneira intercambi´avel de agora em diante. Como no caso de 2-c´elulas, comec¸amos definindo orientac¸a˜ o e fronteira para o pr´oprio 3-retˆangulo. Um ponto est´a na fronteira de R se pertence a uma de suas seis faces. Adaptando a notac¸a˜ o utilizada para o cubo [0, 1]3 no §3.4, podemos escrever R12 = [a, a0 ] × [b, b0 ] × {c} o R12 = [a, a0 ] × [b, b0 ] × {c0 }
R23 = {a} × [b, b0 ] × [c, c0 ] o R23 = {a0 } × [b, b0 ] × [c, c0 ]
R13 = [a, a0 ] × {b} × [c, c0 ] o R13 = [a, a0 ] × {b0 } × [c, c0 ]
138
4. 3-FORMAS
Como no caso de 2-retˆangulos, assumiremos que cada uma destas faces est´a orientada respeitando-se o sentido em que os reais crescem. Assim, se Nij e´ o o o vetor normal a` face oposta, temos que vetor normal a` face Rij e Nij o N12 = −N12 = e3 o N23 = −N23 = e1 o N13 = −N13 = −e2 .
No §3.4 vimos que h´a duas escolhas poss´ıveis de sinais que fazem do encadeamento das faces de R uma 2-c´elula fechada. Em uma delas, o vetor normal a cada face aponta para dentro, na outra, aponta para fora. Entre estas duas, escolheremos aquela em que o vetor normal sempre aponta para fora. Portanto, orientando R da forma sua fronteira ser´a o o o ∂R = −R12 + R12 − R23 + R23 + R13 − R13 .
A fronteira de qualquer 3-c´elula ser´a orientada a partir desta orientac¸a˜ o padr˜ao de R. Definimos, ent˜ao, a fronteira ∂σ de uma 3-c´elula σ : R → Rn como a forma reduzida de o o o −σ(R12 ) + σ(R12 ) − σ(R23 ) + σ(R23 ) + σ(R13 ) − σ(R13 ).
Um bom exemplo, e´ a esfera de raio b da qual foi extra´ıda uma esfera menor, de raio a < b. Neste caso, a parametrizac¸a˜ o Sa,b : [a, b] × [0, 2π] × [0, π] → R3 , em coordenadas esf´ericas, ser´a dada por Sa,b (r, θ, φ) = (r sen(φ) cos(θ), r sen(φ) sen(θ), r cos(φ)). Enumerando as faces de R na mesma ordem que fizemos acima, verificamos o ) s˜ao pontos, e que que ∂Sa,b (R12 ) e −∂Sa,b (R12 o ∂Sa,b (R13 ) ≡ −∂Sa,b (R13 )
correspondem a` metade de um anel vertical, contido no semiplano definido por y = 0 e x ≥ 0. Este anel tem de raio externo b e raio interno a, e as duas circunferˆencias correspondentes a estes raios est˜ao orientadas em sentidos opostos. Portanto, ∂Sa,b = −Sa,b (R23 ) + Sa,b (R23 ), e´ igual ao encadeamento das superf´ıcies interna e externa de Sa,b , ambas orientadas de modo que seus vetores normais apontem para fora da parte s´olida da 3-c´elula. A esfera (s´olida) de raio a e´ um caso particular desta 3-c´elula, bastando para isto tomar b = 0. Neste caso, Sa = Sa,0 tem fronteira o ∂Sa = Sa,b (R23 ),
˜ DE 3-FORMAS 2. INTEGRAC¸AO
139
j´a que Sa,b (R23 ) ≡ 0. Antes de poder definir um 3-encadeamento, precisamos considerar como inverter o sinal de uma 3-c´elula. Mas, para isto, basta trocar o sentido em que um de seus parˆametros avanc¸a. Por exemplo, se o 3-retˆangulo de parˆametros for (2.1), podemos tomar −σ(r, s, t) = σ(a + a0 − r, s, t). Com isto estamos prontos para definir um 3-encadeamento como sendo uma express˜ao da forma (2.2)
E = c1 σ1 + · · · + cm σm ,
onde os cs s˜ao inteiros e os σs s˜ao 3-c´elulas. A fronteira deste 3-encadeamento e´ definida pela f´ormula ∂E = c1 ∂(σ1 ) + · · · + cm ∂(σm ), como, ali´as, seria de esperar. ˜ de 3-formas. Neste par´agrafo veremos como integrar 2.2. Integrac¸ao uma 3-forma em 3-c´elulas. Comec¸aremos com o caso mais simples poss´ıvel: uma 3-forma definida em um 3-retˆagulo de R3 . Seja U uma regi˜ao do espac¸o, e digamos que R = [a, a0 ] × [b, b0 ] × [c, c0 ] ⊆ U. Dada η ∈ Ω3 (U ), queremos definir a integral de η no 3-retˆangulo R. Se r, s e t s˜ao as coordenadas em R3 , podemos escrever η = f (r, s, t)dr ∧ ds ∧ dt. Definimos, ent˜ao, a integral de η em R como sendo a integral da func¸a˜ o f neste mesmo retˆangulo; isto e´ Z Z a0 Z b0 Z c0 η= f drdsdt. R
a
b
c
Esta e´ a base de nossa definic¸a˜ o: o caso geral e´ reduzido a este caso particular atrav´es do c´alculo de uma imagem inversa. Em outras palavras, se σ : R → Rn , e´ uma 3-c´elula cuja imagem est´a contida em uma regi˜ao U de Rn , definimos a integral de ω em σ por Z Z (2.3) ω= σ ∗ (ω). σ
R
Precisamos discutir de que maneira a orientac¸a˜ o da 3-c´elula afeta o c´alculo da integral. Para descobrir o que ocorre, consideramos uma 3-c´elula σ, definida sobre o retˆangulo R = [a, a0 ] × [b, b0 ] × [c, c0 ]
140
4. 3-FORMAS
cuja imagem est´a contida em uma regi˜ao U de Rn . Digamos que r, s e t s˜ao os parˆametros de σ. Se ω ∈ Ω3 (U ) ent˜ao −σ tem dom´ınio R e e´ definida por −σ(r, s, t) = σ(a + a0 − r, s, t). Desta forma (−σ)∗ (ω)(r, s, t) = ω(σ(q), −Jq (σ)e1 , Jq (σ)e1 , Jq (σ)e3 )dr ∧ ds ∧ dt, onde q = (a + a0 − r, s, t). Portanto, (−σ)∗ (ω)(r, s, t) = −(σ)∗ (ω)(q), pela bilinearidade de ω. Assim, Z Z ∗ (−σ) (ω) = − (σ)∗ (ω), R
R
que e´ equivalente a dizer que Z
Z ω=−
−σ
ω. σ
2.3. Propriedades da integral de uma 3-forma. H´a algumas propriedades elementares das integrais de 3-formas que precisamos considerar. Suponha que U e´ uma regi˜ao de Rn . Se ω, η ∈ Ω3 (U ) e k ∈ R, ent˜ao Z Z Z (ω + kη) = ω+k η, E
E
E
onde E e´ um 3-encadeamento contido em U . A demonstrac¸a˜ o e´ essencialmente a mesma da propriedade correspondente para 2-formas e fica como exerc´ıcio. A segunda propriedade que desejamos estudar e´ a f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis. No que segue, usaremos a express˜ao a aplicac¸a˜ o diferenci´avel γ : [a, a0 ] × [b, b0 ] × [c, c0 ] → [k, k 0 ] × [`, `0 ] × [m, m0 ] para designar uma func¸a˜ o diferenci´avel γ : (a−, a0 +)×(b−, b0 +)×(c−, c0 +) → (k−, k 0 +)×(`−, `0 +)×(m−, m0 +) onde e´ um n´umero real positivo. Suponhamos, al´em disso, que: • γ e´ bijetiva e • leva o interior de [a, a0 ]×[b, b0 ]×[c, c0 ] no interior de [k, k 0 ]×[`, `0 ]× [m, m0 ]. O resultado que desejamos pode ser enunciado como segue. ´ ´ F ORMULA DE MUDANC ¸ A DE VARI AVEIS . Sejam R e R0 retˆangulos do 0 plano e γ : R → R uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel bijetora para a qual: • o determinante do jacobiano e´ sempre positivo em todo ponto de R, e • o interior de R e´ levado por γ no interior de R0 . Se σ : R → U,
3. TEOREMA DE STOKES
141
e´ uma 3-c´elula contida em uma regi˜ao U de Rn , ent˜ao Z Z σ∗ ω = ω. σ·γ
σ
Como no caso de 2-formas, a demonstrac¸a˜ o consiste em reduzir o problema a` integrac¸a˜ o de uma 3-forma em um 3-retˆangulo, usando a imagem inversa por σ. Mas uma 3-forma em uma regi˜ao U de R3 se escreve na forma gdx1 ∧ dx2 ∧ dx3 , onde g : U → R e´ uma func¸a˜ o diferenci´avel. Portanto, integrar esta forma em um retˆangulo e´ o mesmo que integrar g neste retˆangulo, o que nos permite usar o teorema de mudanc¸a de base para integrais triplas. Os detalhes ficam como exerc´ıcio. Como conseq¨ueˆ ncia desta f´ormula sempre podemos supor, ao provar um resultado sobre integrac¸a˜ o de 3-formas, que a c´elula tem o retˆangulo [0, 1]3 como espac¸o de parˆametros. ˜ . Seja R = [a, a0 ] × [b, b0 ] × [c, c0 ] um 3-retˆangulo e ω uma P ROPOSIC¸ AO 3-forma definida em uma regi˜ao aberta do plano que cont´em R. Ent˜ao existe uma aplicac¸a˜ o diferenci´avel γ : [0, 1]3 → R, tal que Z Z ω= γ ∗ (ω). [0,1]3
R
˜ . Defina γ : [0, 1]3 → R por D EMONSTRAC¸ AO γ(r, s, t) = (a, b, c) + r(a0 − a, 0) + s(0, b0 − b) + r(0, 0, c0 − c). Temos que det(J(γ)) = (a0 −a)(b0 −b)(c0 −c) > 0, pois a0 > a, b0 > b e c0 > c. A proposic¸a˜ o segue imediatamente da f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis. 3. Teorema de Stokes Nesta sec¸a˜ o enunciamos e provamos nossa segunda vers˜ao do teorema de Stokes. T EOREMA DE S TOKES . Seja ω uma 2-forma diferencial definida em uma regi˜ao U de Rn . Se E e´ um 3-encadeamento contido em U , ent˜ao Z Z ω= dω. ∂E
E
A demonstrac¸a˜ o e´ inteiramente an´aloga a da vers˜ao do mesmo teorema enunciada na sec¸a˜ o 4 do cap´ıtulo 3. Na verdade as duas demonstrac¸o˜ es s˜ao t˜ao semelhantes que seria prefer´ıvel se vocˆe tratasse esta como um exerc´ıcio, do qual estamos dando uma resposta completa. Dividiremos a demonstrac¸a˜ o em duas partes. A primeira consiste em mostrar que o teorema vale para 3-formas do R3 , integradas sobre um 3-retˆangulo. A segunda reduz o caso geral a este caso especial.
142
4. 3-FORMAS
˜ do teorema de Stokes no R3 . Comec¸amos 3.1. Demonstrac¸ao tratando o caso mais simples em que E e´ um 3-retˆangulo e ω uma 2-forma diferencial definida em uma regi˜ao aberta V do plano, que cont´em E. P RIMEIRA PARTE : reduc¸a˜ o ao caso em que o retˆangulo e´ [0, 1]3 . Pela proposic¸a˜ o 2.3 Z
Z
γ ∗ (dω).
ω=
(3.1)
[0,1]3
R
Enumerando os lados de C = [0, 1]3 e R segundo a convenc¸a˜ o introduzida no §3.4, vemos que γ(Cij ) = Rij , e o mesmo vale para os lados opostos. Mas, pela f´ormula de mudanc¸a de vari´aveis para integrais de 2-formas Z Z Z ω= ω= γ ∗ (ω). Rij )
γ(Cij )
Cij
de modo que Z
Z ω=
(3.2) ∂R
γ ∗ (ω).
∂[0,1]3
Mas, se o teorema de Stokes vale para γ ∗ (ω) em [0, 1]3 , temos Z Z ∗ γ (dω) = γ ∗ (ω); [0,1]3
∂[0,1]3
donde segue por (3.1) e (3.2), que Z γ ∗ (ω) = R Z Z ∗ − γ (ω) + Z −
γ ∗ (ω) +
Z
Z γ(R13 )
γ ∗ (ω)
o ) γ(R23
γ(R23 )
+
γ ∗ (ω)
o ) γ(R12
γ(R12 )
γ ∗ (ω) −
Z
γ ∗ (ω),
o ) γ(R13
que e´ o teorema de Stokes sobre R. Por isso, podemos supor, de agora em diante, que R = [0, 1]3 . S EGUNDA PARTE : reduc¸a˜ o ao caso em que a 2-forma em [0, 1]3 e´ gdt1 ∧ dt2 . Seja ω = g1 dt1 ∧ dt2 + g2 dt2 ∧ dt3 + g3 dt1 ∧ dt3 ,
3. TEOREMA DE STOKES
onde g1 , g2 , g3 ∈ O(V ). Mas, Z Z Z ω= g1 dt1 ∧ dt2 + ∂R
∂R
143
Z g2 dt2 ∧ dt3 +
∂R
g3 dt1 ∧ dt3 , ∂R
ao passo que Z Z Z Z dω = d(g1 dt1 ∧ dt2 ) + d(g2 dt2 ∧ dt3 ) + d(g3 dt1 ∧ dt3 ), R
R
R
R
j´a que d e´ uma transformac¸a˜ o linear. Portanto, basta provar que Z Z d(g1 dt1 ∧ dt2 ) = g1 dt1 ∧ dt2 ZR Z∂R d(g2 dt2 ∧ dt3 ) = g2 dt2 ∧ dt3 e que R ∂R Z Z d(g3 dt1 ∧ dt3 ) = g3 dt1 ∧ dt3 . R
∂R
Como as demonstrac¸o˜ es destas trˆes f´ormulas s˜ao idˆenticas (a menos de uma mudanc¸a de parˆametros), basta provar uma delas, as outras podem ficar como exerc´ıcios. T ERCEIRA [0, 1]3 .
PARTE :
demonstrac¸a˜ o do teorema para a 1-forma gdt1 ∧ dt2 em
Recapitulando, vimos nas duas partes anteriores que basta provar que a igualdade do teorema de Stokes e´ verdadeira quando R = [0, 1]3 e ω = g(t1 , t2 , t3 )dt1 ∧ dt2 , onde g ∈ O(U ). Por´em, como d(ω) =
∂g dt1 ∧ dt2 ∧ dt3 ∂t3
temos que Z
Z
1
Z
1
Z
1
∂g dt1 dt2 dt3 . ∂t 3 R 0 0 0 Contudo, pelo teorema fundamental do c´alculo, Z 1Z 1Z 1 Z 1Z 1 ∂g dt1 dt2 dt3 = (g(t1 , t2 , 1) − g(t1 , t2 , 0))dt1 dt2 , 0 0 0 ∂t3 0 0 dω =
que pode ser reescrito como Z Z 1Z 1 Z (3.3) dω = g(t1 , t2 , 1)dt1 dt2 − R
0
0
0
1
Z
1
g(t1 , t2 , 0)dt1 dt2 . 0
Por outro lado, enumerando as faces de R na forma j´a utilizada acima, o verificamos que a imagem inversa de g(t1 , t2 , t3 )dt1 ∧ dt2 por Ri3 e Ri3 , para 1 ≤ i ≤ 2, s˜ao nulas pois, em ambos os casos, a primeira ou a segunda
144
4. 3-FORMAS
coordenada da face e´ constante. Parametrizando as duas faces restantes na forma R12 (s1 , s2 ) = (0, 0, 0) + s1 (1, 0, 0) + s2 (0, 1, 0), o R12 (s1 , s2 ) = (0, 0, 1) + s1 (1, 0, 0) + s2 (0, 1, 0),
temos que Z
Z
1
1
Z
gdt1 ∧ dt2 =
g(s1 , s2 , 0)ds1 ds2 ,
R12
0
0
ao passo que Z
Z
1
1
Z
gdt1 ∧ dt2 = o R12
g(s1 , s2 , 1)ds1 ds2 , 0
0
Como o o o ∂R = −R12 + R12 − R23 + R23 + R13 − R13 ,
obtemos, Z
Z
1
Z
ω=− ∂R
1
Z
1
Z
g(s1 , s2 , 0)ds1 ds2 + 0
0
1
g(s1 , s2 , 1)ds1 ds2 0
0
j´a que as integrais sobre todas as outras faces s˜ao nulas. Mas isto nos permite concluir que Z Z dω = R
ω, ∂R
provando assim que o teorema de Stokes vale sobre um retˆangulo do plano. ˜ do teorema de Stokes em Rn . Levando em 3.2. Demonstrac¸ao conta que • a fronteira de um encadeamento e´ igual ao encadeamento das fronteiras de suas parcelas; • a integral sobre um encadeamento e´ igual a` soma das integrais sobre cada parcela do encadeamento; vemos que basta provar o resultado no caso em que E e´ uma 3-c´elula. Sejam, ent˜ao, R um 3-retˆangulo e σ : R → Rn uma 3-c´elula. Se ω ∈ Ω2 (U ) ent˜ao, σ ∗ (ω) ∈ Ω2 (V ), onde V ⊂ R3 e´ uma regi˜ao que cont´em R. Mas, Z Z ω= σ ∗ (ω). ∂σ
∂R
Contudo, j´a sabemos do §3.1 que o teorema de Stokes se aplica a esta u´ ltima integral, donde Z Z σ ∗ (ω) =
∂R
d(σ ∗ (ω)).
R
3. TEOREMA DE STOKES
145
Entretanto, pela definic¸a˜ o de integral de uma 3-forma Z Z dω = σ ∗ (dω). σ
R
Como σ ∗ (dω) = dσ ∗ (ω), podemos concluir que Z Z dω = ω, σ
∂σ
provando, assim, o teorema de Stokes enunciado no comec¸o da sec¸a˜ o. 3.3. A variante vetorial. Antes de passar a` s aplicac¸o˜ es do teorema de Stokes, precisamos considerar sua traduc¸a˜ o em termos da an´alise vetorial tradicional. Isto e´ , sem usar formas diferenciais. Seja F : U → Rn um campo vetorial definido em uma regi˜ao U do plano. A 2-forma associada a F e´ ΦF = F1 dx2 ∧ dx3 − F2 dx1 ∧ dx3 + F3 dx1 ∧ dx2 , e tem como diferencial dΦF =
∂F1 ∂F2 ∂F3 + + ∂x1 ∂x2 ∂x3
.
A func¸a˜ o ∂F1 ∂F2 ∂F3 + + ∂x1 ∂x2 ∂x3 e´ conhecida como o divergente de F , e denotada por div(F ). Portanto, (3.4)
dΦF = div(F )dx1 ∧ dx2 ∧ dx3 .
Veremos como interpretar o divergente na sec¸a˜ o 4, por enquanto vamos nos contentar em traduzir o teorema de Stokes em termos do divergente. Para poder enunciar a vers˜ao vetorial do teorema de Stokes em dimens˜ao 3, precisamos escrever Z ΦF σ
sem usar formas. Mas, j´a fizemos isto no caso especial de um campo rotacional. Estendendo a definic¸a˜ o ao presente caso, obtemos Z Z ΦF = (F · N )dσ, σ
σ
onde N e´ o vetor normal unit´ario a σ. Com isto podemos enunciar a vers˜ao vetorial do teorema de Stokes. T EOREMA DE DIVERG Eˆ NCIA (caso vetorial). Seja σ uma 3-c´elula. Se F e´ um campo definido em uma regi˜ao de R3 que cont´em σ, ent˜ao Z Z (F · N )dσ = div(F )dV. ∂σ
σ
Na pr´atica utilizaremos uma vers˜ao h´ıbrida do teorema, em que o divergente aparece como coeficiente de uma 3-forma. O enunciado completo e´ o seguinte.
146
4. 3-FORMAS
ˆ T EOREMA DE DIVERG ENCIA . Seja σ uma 3-c´elula. Se F e´ um campo definido em uma regi˜ao de R3 que cont´em σ, ent˜ao Z Z ΦF = div(F )dV, ∂σ
σ
onde dV = dx ∧ dy ∧ dz. ˜ 4. Aplicac¸oes Nesta sec¸a˜ o consideraremos v´arias aplicac¸o˜ es do teorema de Stokes e das 3formas a problemas de f´ısica. Comec¸amos buscando uma interpretac¸a˜ o para o divergente de um campo. 4.1. Divergente. Comec¸aremos calculando o divergente de alguns campos simples de R3 . Como e´ claro que um campo constante tem divergente zero, vamos comec¸ar por um campo n˜ao constante, mas cujos vetores s˜ao todos paralelos a uma dada direc¸a˜ o. Se v0 e´ um vetor unit´ario de R3 e ν uma func¸a˜ o de R3 em R, podemos escrever um tal campo na forma F (p) = ν(p)v0 , para todo p ∈ R3 . Como v0 e´ constante, podemos escolher as coordenadas de modo que v0 = (1, 0, 0), donde F (p) = (ν(p), 0, 0). Calculando o divergente, obtemos div(F ) =
∂ν . ∂x1
Se interpretarmos F como um campo de velocidades, ent˜ao ν corresponde ao m´odulo da velocidade em cada ponto. Portanto, o divergente ser´a zero apenas se o campo tiver acelerac¸a˜ o nula em todo lugar. Geometricamente isto significa que part´ıculas que forem liberadas pr´oximas uma da outra n˜ao ser˜ao separadas pela ac¸a˜ o do campo. Isto e´ , n˜ao v˜ao seguir trajet´orias divergentes. Por outro lado, se a acelerac¸a˜ o for n˜ao nula, as part´ıculas tendem a se afastar, ou a se aproximar, umas das outras. Um modelo f´ısico desta situac¸a˜ o e´ dado por um g´as que est´a sendo expandido (acelerac¸a˜ o positiva) ou comprimido (acelerac¸a˜ o negativa). E´ por isto que, em mecˆanica de fluidos, dizemos que um fluido e´ incompress´ıvel se seu divergente e´ zero. E´ claro que h´a outras maneiras de duas part´ıculas serem arrastadas para longe ou para perto umas das outras, sem que para isto o m´odulo da velocidade precise variar. Basta considerar, por exemplo, o campo de velocidades 1 V(x1 , x2 , x3 ) = p 2 (x1 , x2 , x3 ), x1 + x22 + x23
˜ 4. APLICAC¸OES
147
que tem m´odulo constante igual a 1. Neste caso as part´ıculas se afastam, porque o campo e´ central. Calculando o divergente, obtemos −1 (x1 + x2 + x3 ), div(V) = 2 (x1 + x22 + x23 )3/2 que n˜ao e´ constante, como seria de esperar. Para uma an´alise mais geral, e mais refinada, desta interpretac¸a˜ o do divergente, considere uma regi˜ao U ⊆ R3 onde est´a definido um campo de vetores F . Dado um ponto p ∈ U , seja σr uma bola fechada de raio r e centro em p, que est´a inteiramente contida em U . Pelo teorema da divergˆencia, Z Z (4.1) ΦF = div(F )dV. ∂σr
σr
Como div(F )(p) e´ constante e Z dV = σr
4πr3 , 3
e´ o volume da c´elula σr , temos que se p ∈ U , Z Z 4πr3 div(F )(p)dV = div(F )(p) dV = div(F )(p), 3 σr σr Somando e subtraindo este termo do lado direito de (4.1), obtemos Z Z 4πr3 ΦF = δdV + (4.2) div(F )(p), 3 ∂σr σr onde δ(x, y, z) = div(F )(x, y, z) − div(F )(p). Como r e´ constante, podemos dividir (4.2) por 4πr3 /3, o que nos d´a Z Z 3 3 1 1 Φ = δdV + div(F )(p), F 4π ∂σr r3 4π σr r3 Entretanto, div(F ) e´ uma func¸a˜ o cont´ınua em U , de forma que o limite de δ(x, y, z) tende a zero quando (x, y, z) tende a p. Assim, tomando o limite quando r tende a zero, Z (4.3) lim δdV = 0. r→0
σr
Disto obtemos
Z 1 3 lim ΦF = div(F )(p). 4π r→0 ∂σr r3 Portanto, lembrando que r est´a fixo, Z 3 1 (4.4) div(F )(p) = lim ΦF 4π r→0 ∂σr r3 Segundo a equac¸a˜ o (4.4), se r for muito pequeno, o divergente em p e´ mais ou menos igual ao fluxo atrav´es de uma esfera de raio r e centro em p, dividido pelo volume da esfera. Mas o fluxo atrav´es da esfera representa o balanc¸o entre
148
4. 3-FORMAS
a quantidade de fluido que entra, e a quantidade que sai da esfera. Portanto, o divergente nos d´a o balanc¸o entre a quantidade de fluido que entra e sai da esfera, por unidade de volume. Em particular, se o divergente for zero, ent˜ao todo o fluido que entra na esfera, acaba saindo. Isto e´ , n˜ao pode haver fluido se acumulando na esfera (seja por compress˜ao, ou porque h´a um sorvedouro dentro da esfera), nem pode haver fluido vazando da esfera (seja por expans˜ao, ou porque h´a uma fonte dentro da esfera). No §5.5 determinamos o campo magn´etico de um fio infinito, que se prolonga ao longo do eixo z, e por onde flui uma corrente constante. Vimos que a simetria do problema nos permite afirmar que sobre qualquer cilindro cujo eixo e´ o pr´oprio fio, o campo e´ constante, tangente ao cilindro e perpendicular ao fio. Isto significa que duas part´ıculas, abandonarmos pr´oximas uma da outra, e a uma mesma distˆancia do fio, ter˜ao a mesma distˆancia relativa ao longo de toda a sua trajet´oria. Por outro lado, se as duas part´ıculas est˜ao a distˆancias diferentes do fio, ent˜ao s´o manter˜ao sua posic¸a˜ o relativa se a intensidade do campo for a mesma em todo lugar. Contudo, as hip´oteses decorrentes da simetria do problema, combinadas com as equac¸o˜ es de Maxwell, nos permitiram determinar o campo como sendo k (−y, x, 0). B(x, y, z) = 2 x + y2 Em particular, o campo magn´etico de um fio reto infinito tem intensidade um em todo lugar. Combinadas com a interpretac¸a˜ o f´ısica apresentada acima, estas considerac¸o˜ es nos permitem afirmar que o divergente deste campo deve ser nulo. Um c´alculo direto a partir da f´ormula para B mostra que div(B) e´ igual a −2kx −2ky 2kxy −2kxy (−y) + 2 (x) 2 + 2 = 0, 2 2 2 2 2 2 +y ) (x + y ) (x + y ) (x + y 2 )2
(x2
confirmando portanto, o palpite decorrente da geometria do campo. No §4.3 veremos que o fato do divergente ser nulo e´ uma propriedade do campo magn´etico, qualquer que seja sua fonte. 4.2. Lei de Gauss: carga pontual. Seja U = R3 \ {(0, 0, 0)}, e E : U → R2 o campo el´etrico de uma carga pontual q situada na origem. Pela lei de Coulomb E = ∇f , onde kq f = −p 2 . x1 + x22 + x23 Temos, assim, que ∂f ∂f ∂f ΦE = dx2 ∧ dx3 − dx1 ∧ dx3 + dx1 ∧ dx2 . ∂x1 ∂x2 ∂x3 Portanto, ΦE = gΦR
˜ 4. APLICAC¸OES
149
onde g=
kq (x21 + x22 + x23 )3/2
e R e´ o campo radial. Mas, d(ΦR ) = 3dx1 ∧ dx2 ∧ dx3 , ao passo que dg =
(x21
−3kq (x1 dx1 + x2 dx2 + x3 dx3 ). + x22 + x23 )5/2
Contudo, dg ∧ ΦR =
−3kq (x2 + x22 + x23 )dx1 ∧ dx2 ∧ dx3 ; (x21 + x22 + x23 )5/2 1
donde dg ∧ ΦR =
(x21
−3kq dx1 ∧ dx2 ∧ dx3 . + x22 + x23 )3/2
Mas, dΦE = dg ∧ (ΦR ) − g ∧ d(ΦR ), de forma que obtemos dΦE = 0. Em particular, div(E) = 0. Com isto fica f´acil determinar o fluxo de E atrav´es da fronteira de um 3-c´elula σ que n˜ao cont´em a origem. Afinal, pelo teorema de Stokes Z Z ΦE = dΦE = 0. ∂σ
σ
Por outro lado, se a origem est´a no interior de σ, o teorema de Stokes n˜ao pode ser aplicado diretamente. O problema e´ que, por hip´otese, precisamos que a 3-c´elula esteja totalmente contida na regi˜ao onde a 2-forma est´a definida. Mas isto n˜ao ocorre neste caso, uma vez que ΦE n˜ao est´a definida na origem, que est´a contida em σ. Por sorte este obst´aculo e´ f´acil de contornar, desde que a 3-c´elula tenha pontos interiores; isto e´ , n˜ao se reduza a uma superf´ıcie. Como este e´ mesmo o u´ nico caso que nos interessa, podemos fazer esta hip´otese sem a preocupac¸a˜ o com poss´ıveis sobressaltos posteriores. Seja, ent˜ao, σ uma 3-c´elula σ que cont´em a origem e cujo interior e´ n˜ao vazio e cont´em a origem. Como a origem e´ um ponto interior de σ, existe um real positivo > 0 de modo que a bola B de raio e centro na origem est´a totalmente contida no interior de σ. Considere o 3-encadeamento E = σ − B, que corresponde ao s´olido σ do qual foi removido a bola B. A fronteira deste encadeamento e´ igual a ∂E = ∂σ − ∂B,
150
4. 3-FORMAS
que corresponde a` superf´ıcie de σ, com o vetor normal orientado para fora, somada a` superf´ıcie da bola B, com o vetor normal voltado para (0, 0, 0). Como a origem n˜ao pertence a E, podemos aplicar o teorema de Stokes, que nos d´a Z Z ΦE = dΦE = 0. ∂E
E
Contudo, Z
Z
Z ΦE −
ΦE = ∂E
∂σ
ΦE ; ∂B
donde podemos concluir que Z
Z ΦE =
∂σ
ΦE . ∂B
Portanto, para achar o fluxo de E atrav´es de ∂σ basta calcular seu fluxo atrav´es de ∂B, que e´ uma esfera de raio . Mas o valor deste fluxo j´a foi obtido na equac¸a˜ o (5.2) da p´agina 114, e e´ igual a 4πkq. Portanto, Z ΦE = 4πkq, ∂σ
qualquer que seja a 3-c´elula σ. Observe que se trata de um resultado extremamente geral, que seria muito dif´ıcil de provar sem este teorema. Resumindo, provamos o seguinte resultado da eletrost´atica. L EI DE G AUSS (para cargas pontuais). O fluxo do campo el´etrico de uma carga pontual q atrav´es de uma superf´ıcie fechada S e´ igual a • zero, se a carga n˜ao est´a contida no interior de S; • 4πkq, se a carga est´a contida no interior de S. Podemos nos perguntar se este resultado vale de maneira mais geral. Por exemplo, o que acontece se temos uma quantidade finita de cargas pontuais q1 , . . . , qm dentro da 3-c´elula σ? Neste caso, podemos repetir o argumento anterior, desta vez tomando n bolas B1 , . . . , Bm , cada uma das quais cont´em uma das cargas, e est´a completamente contida em σ. Fazendo isto, vemos que, neste caso, o fluxo e´ igual a Z m Z X ΦE = ΦE = 4πkqm. ∂σ
j=1
∂Bj
˜ 4.3. As equac¸oes de Maxwell. No §5.5 do cap´ıtulo 3 consideramos duas, das quatro equac¸o˜ es de Maxwell. No caso est´atico, as duas equac¸o˜ es restantes podem ser escritas como ρ div(E) = 0 div(B) = 0, onde E e B representam, respectivamente, os campos el´etrico e magn´etico, ρ e´ a densidade de carga e 0 e´ uma constante cujo significado n˜ao precisa nos preocupar.
˜ 4. APLICAC¸OES
151
Pela quarta equac¸a˜ o de Maxwell, o divergente de um campo magn´etico e´ sempre zero. Se o campo magn´etico fosse o campo de velocidades de um fluido, isto significaria que este campo n˜ao tem fontes, nem sorvedouros. No caso do campo el´etrico, que pode ter divergente n˜ao nulo, uma fonte do campo e´ uma carga positiva, e um sorvedouro uma carga negativa. Portanto, podemos interpretar a quarta equac¸a˜ o de Maxwell como dizendo que n˜ao h´a nada semelhante a uma carga isolada, no caso do campo magn´etico. Utilizando o jarg˜ao usual, n˜ao pode haver um monop´olo magn´etico; isto e´ , um p´olo isolado. Portanto, a quarta lei de Maxwell est´a relacionada ao fato, bem conhecido, de que quando quebramos um im˜a ao meio surgem dois novos p´olos magn´eticos de sinais opostas, um de cada lado da Passando a` terceira equac¸a˜ o de Maxwell, o que temos e´ uma vers˜ao diferencial da lei de Gauss. De fato, se U e´ uma regi˜ao de R3 e E e´ um campo el´etrico definido em U ent˜ao, pelo teorema de divergˆencia Z Z ΦF = div(F )dV, ∂σ
σ
onde σ e´ uma 3-c´elula contida em U . Substituindo div(E) = ρ0 nesta equac¸a˜ o, obtemos Z Z ρ ΦF = dV. ∂σ σ 0 Suponhamos que toda a carga est´a concentrada em uma 3-c´elula ξ ⊆ σ. Neste caso, a densidade de carga e´ nula em σ − ξ. Assim, Z Z ρ ρ dV = dV, 0 σ ξ 0 uma vez que Z ρ dV = 0. σ−ξ 0 Portanto, Z Z 1 ρdV. ΦF = 0 ξ ∂σ Contudo, a integral a` direita da f´ormula acima e´ igual a` carga total contida em ξ. Resumindo, temos a seguinte vers˜ao generalizada da Lei de Gauss. L EI DE G AUSS . Seja S uma superf´ıcie fechada. O fluxo do campo el´etrico gerado por uma distribuic¸a˜ o de carga de densidade ρ contida em um s´olido V e´ igual a • zero, se V n˜ao est´a contida em S; • Q/0 , se V est´a contido em S. Encerraremos o par´agrafo calculando o campo el´etrico E de um fio infinito e carregado, cuja sec¸a˜ o transversal suporemos desprez´ıvel, assim como fizemos para o campo magn´etico. Note por´em que, neste caso, n˜ao h´a uma corrente: a distribuic¸a˜ o de cargas no fio e´ uniforme e est´atica. Como no caso do campo magn´etico (veja §5.5) precisaremos apelar para a simetria do problema, a fim de entender a geometria do campo. Como se trata de um fio infinito, o
152
4. 3-FORMAS
campo deve ser igual em qualquer ponto de um cilindro σ coaxial com o fio. Al´em disso, nossa experiˆencia com o caso de uma carga isolada sugere que este campo deve ser normal ao cilindro. Portanto, denotando o campo restrito ao cilindro σ por Eσ , obtemos Eσ = kEσ knσ , onde nσ e´ o vetor normal a σ. Observe que as considerac¸o˜ es sobre a simetria do problema implicam que kEσ k e´ constante. Logo, σ ∗ (ΦE ) = kEσ kΦnσ . Portanto,
Z
Z ΦE = kEσ k
σ
Φ nσ , σ
j´a que as considerac¸o˜ es anteriores mostram que kEσ k e´ constante sobre o cilindro. Contudo, Z Φnσ = 4πr`, ∂σ
que e´ a a´ rea do cilindro. Deste modo, Z ΦE = kEσ k4πr`. σ
Apelando, agora, para a lei de Gauss, temos que kEσ k4πr` deve ser igual a` carga total dentro de σ. Supondo que o fio tem densidade de carga constante, e igual a ρ, por unidade de comprimento, a carga total ser´a q`/0 . Obtemos, assim, que ρ . kEσ k = 4π0 r ´ Seja U uma regi˜ao de R3 . Inspirados nas 4.4. Lema de Poincare. noc¸o˜ es correspondentes para 1-formas, vimos que uma 2-forma ω ∈ Ω2 (U ) e´ fechada se dω = 0. Uma 2-forma exata e´ aquela que pode ser escrita como dα para algum α ∈ Ω1 (U ). Como d(dα) = 0, temos que toda forma exata e´ fechada. O que dizer sobre a rec´ıproca? Como no caso de 1-formas, se a regi˜ao U for convexa ent˜ao a resposta a` pergunta e´ que a rec´ıproca e´ verdadeira. Tamb´em neste caso o resultado e´ conhecido como lema de Poincar´e. L EMA DE P OINCAR E´ (para 2-formas). Toda 2-forma fechada definida em uma regi˜ao e convexa de R3 e´ exata. Para simplificar os detalhes t´ecnicos da construc¸a˜ o provaremos o lema de Poincar´e apenas no caso em que U e´ um 3-retˆangulo aberto que cont´em a origem. ˜ . Seja D EMONSTRAC¸ AO ω = a1 dx2 ∧ dx3 + a2 dx1 ∧ dx3 + a3 dx1 ∧ dx2 . uma 2-forma fechada definida em uma regi˜ao convexa U de Rn . Vamos construir, explicitamente, uma 1-forma α ∈ Ω1 (U ) tal que ω = dα, mostrando,
˜ 4. APLICAC¸OES
153
assim, que ω e´ exata. Na verdade, podemos at´e mesmo supor que o coeficiente de dx3 em α e´ zero; de modo que α = b1 dx1 + b2 dx2 , onde a1 , a2 ∈ O(U ). Calculando dα e igualando a ω, verificamos que ∂b2 ∂x3 ∂b1 a2 = − ∂x3 ∂b2 ∂b1 a3 = − ∂x1 ∂x2 a1 = −
Integrando as duas primeiras equac¸o˜ es com relac¸a˜ o a z, obtemos Z x3 b1 = − a2 (x1 , x2 , t)dt + P1 0
ao passo que Z b2 = −
x3
a1 (x1 , x2 , t)dt + P2 , 0
onde P1 e P2 s˜ao func¸o˜ es apenas de x1 e x2 , que por isso funcionam como constantes na integrac¸a˜ o. Para determinar P1 e P2 recorremos a` terceira das equac¸o˜ es acima. Substituindo os valores que obtivemos para b1 e b2 naquela equac¸a˜ o, chegamos a Z x3 ∂a2 ∂P1 ∂P2 ∂a1 (4.5) a3 = − − dt + − . ∂x ∂x ∂x ∂x2 1 2 1 0 Contudo, como ω e´ uma forma fechada, dω = 0, donde ∂a2 ∂a3 ∂a1 − =− . ∂x1 ∂x2 ∂x3 Substituindo em (4.5), x3
Z b3 = 0
∂a3 ∂P1 ∂P2 (x1 , x2 , t)dt + − . ∂x3 ∂x1 ∂x2
Portanto, pelo teorema fundamental do c´alculo, a3 (x1 , x2 , x3 ) = a3 (x1 , x2 , x3 ) − a3 (x1 , x2 , 0) +
∂P2 ∂P1 − . ∂x1 ∂x2
Efetuando os devidos cancelamentos, a3 (x1 , x2 , 0) =
∂P1 ∂P2 − . ∂x1 ∂x2
Mas, para que esta u´ ltima equac¸a˜ o seja satisfeita, basta tomar P2 = 0 e Z x1 P1 (x1 , x2 ) = a3 (t, x2 , 0)dt. 0
154
4. 3-FORMAS
Resumindo, mostramos que α = b1 dx1 + b2 dx2 , onde Z x1 Z x3 a3 (t, x2 , 0)dt a2 (x1 , x2 , t)dt + b1 = − 0 0 Z x3 b2 = − a1 (x1 , x2 , t)dt
e
0
satisfaz ω = dα, provando assim o teorema de Poincar´e no caso especial em que U e´ um 3-retˆangulo aberto que cont´em a origem. Como no caso de 1-formas esta demonstrac¸a˜ o do lema de Poincar´e nos d´a um procedimento pelo qual podemos calcular a 1-forma α que satisfaz dα = ω, quando ω e´ uma dada 2-forma fechada definida em um paralelep´ıpedo de R3 . Por exemplo, seja 1 ω= 2 (4.6) (−ydy ∧ dz − xdx ∧ dz). x + y2 Como 2xy 2xy dω = 2 dx ∧ dy ∧ dz − 2 dy ∧ dx ∧ dz = 0, (x + y 2 )2 (x + y 2 )2 ent˜ao, pelo lema de Poincar´e, existe uma 1-forma α, definida em um 3-retˆangulo R que n˜ao cont´em o eixo z, para a qual dα = ω. Como a origem n˜ao pertence ao retˆangulo R, vamos tomar o ponto p = (1, 0, 0) como base da construc¸a˜ o. Naturalmente, para que isto fac¸a sentido, devemos ter que p ∈ R. Supondo que α = b1 dx1 + b2 dx2 , devemos ter Z z Z x Z z b1 = − a2 (x, y, t)dt + a3 (t, y, z)dt e b2 = − a1 (x, y, t)dt 0
1
0
j´a que o ponto base e´ (1, 0, 0). Substituindo os valores de a1 , a2 e a3 = 0 nas integrais, Z z xz −x b1 = − 2 dt = 2 2 2 x + y2 2 0 x +y Z z −y yz b2 = − . 2 dt = 2 2 2 x + y2 2 0 x +y Portanto, yz xz (4.7) dx + dy. α= 2 x2 + y 2 x2 + y 2 2 Observe que a forma α est´a definida em toda a regi˜ao U = R3 \ {x = y = 0}, e satisfaz dα = ω em toda esta regi˜ao e n˜ao apenas no retˆangulo na qual foi calculada. Com isso, acabamos obtemos mais do que barganhamos, j´a que mostramos que ω e´ exata em U e n˜ao apenas em um retˆangulo R contendo (1, 0, 0).
˜ 4. APLICAC¸OES
155
4.5. Potencial vetor. Vejamos o que o lema de Poincar´e nos diz quando e´ aplicado a um campo F : U → R3 . Apesar de nossa demonstrac¸a˜ o se restringir ao caso em que U e´ um retˆangulo, vimos que o lema vale sobre qualquer regi˜ao convexa. Por isso suporemos apenas que U e´ convexa. Digamos que F tem divergente zero. Neste caso, dΦF = div(F )dx1 ∧ dx2 ∧ dx3 = 0. Logo, a 2-forma ΦF e´ fechada e, pelo lema de Poincar´e, existe α = a1 dx1 + a2 dx2 + a3 dx3 , tal que dα = ΦF . Escrevendo G para o campo cujas func¸o˜ es coordenadas s˜ao (a1 , a2 , a3 ), vemos que α = τG , donde ΦF = dα = dτG = Φrot(G) . Conclu´ımos que todo campo em U cujo divergente e´ zero e´ igual ao rotacional de algum campo vetorial. Observe, tamb´em, que G n˜ao est´a definido de maneira u´ nica. Afinal, se g ∈ O(U ), ent˜ao H = G + ∇g satisfaz τH = τG + τ∇g = τG + dg, donde ΦH = d(τG + dg) = d(τG ) = F, j´a que d = 0. Em outras palavras, qualquer que seja g ∈ O(U ) temos 2
rot(G + ∇g) = rot(G) = F. Todas estas considerac¸o˜ es se aplicam quando F e´ um campo magn´etico j´a que, segundo a` s equac¸o˜ es de Maxwell, este campo tem divergente nulo. Para falar a verdade, tudo isto se parece muito com o que ocorria com o campo el´etrico e seu potencial. S´o que l´a, o potencial era uma func¸a˜ o com valores em reais, e o campo era obtido do potencial tomando-se o seu gradiente. Neste caso, G funciona como o potencial de F , s´o que G tamb´em e´ um campo, e F e´ obtido de G tomando-se o seu rotacional. Estes paralelos fazem com que seja natural pensar em G como um potencial vetor de F . Outra semelhanc¸a: no caso do campo el´etrico o potencial est´a definido a menos de uma constante; no campo magn´etico, o potencial est´a definido a menos do gradiente de uma func¸a˜ o diferenci´avel. A transformac¸a˜ o que leva o potencial vetor G de um campo F em G+∇g, para algum g ∈ O(U ) e´ conhecida como uma “mudanc¸a de gauge”, a` s vezes traduzida em portuguˆes como mudanc¸a de calibre. Um exemplo simples e´ dado pelo campo magn´etico de um fio infinito, alinhado ao longo do eixo z. Neste caso o campo e´ dado por B(x, y, z) =
k (−y, x, 0); x2 + y 2
de modo que, a menos da constante k, a forma do fluxo e´ a 2-forma ω definida em (4.6). Como uma 1-forma α para a qual ω = dα e´ dada pela f´ormula (4.7),
156
4. 3-FORMAS
o potencial vetor de B corresponder´a ao campo A que satisfaz τ A = α. Mas, este campo e´ yz xz , . A(x, y, z) = x2 + y 2 2 x2 + y 2 2 Podemos nos perguntar se o potencial vetor de um campo magn´etico e´ um campo fidedigno ou apenas uma ficc¸a˜ o matem´atica. Para responder a esta pergunta precisamos recorrer a` fenˆomenos da f´ısica quˆantica. Em primeiro lugar, um campo pode ser nulo sem que seu potencial vetor seja nulo. Este e´ o caso, por exemplo, dos campos conservativos. Uma situac¸a˜ o ainda mais radical ocorre para o campo magn´etico de um solen´oide infinito no qual flui uma corrente estacion´aria. Neste caso, o campo fora do solen´oide e´ nulo, embora seu potencial vetor n˜ao seja nulo. A pergunta e´ : o fato do potencial vetor n˜ao ser nulo fora do solen´oide pode ter algum efeito sobre um el´etron que trafega nas proximidades solen´oide? A resposta e´ sim, como mostra o chamado efeito de Aharonov-Bohm. O potencial vetor causa uma mudanc¸a de fase no el´etron, que pode ser observada em um experimento de difrac¸a˜ o. Para mais detalhes veja [5, pp. 15-8 a 15-14] ou o verbete correspondente na Wikipedia. Uma discuss˜ao detalhada do potencial vetor pode ser encontrada em [13]. 5. Exerc´ıcios 1. Calcule a diferencial das seguintes formas: (a) xdy ∧ dz; (b) xydz ∧ dx; (c) z 3 dx ∧ dy; (d) dx ∧ dy; (e) xdy ∧ dz + ydz ∧ dx + zdx ∧ dy. 2. Dˆe exemplo de uma 2-forma de R3 que n˜ao e´ fechada. 3. Use o produto exterior para calcular o jacobiano para as transformac¸o˜ es de coordenadas cartesianas para (a) coordenadas cil´ındricas; (b) coordenadas esf´ericas. 4. Use o teorema de Stokes para calcular o fluxo dos seguintes campos atrav´es das superf´ıcies dadas: (a) F = (y − x, z − y, y − x), atrav´es do cubo [−4, 4] × [−4, 4] × [−4, 4]; (b) F = (y, xy, −z), na fronteira do s´olido interno ao cilindro x2 +y 2 ≤ 1, limitado por z = 0 e por z = x2 + y 2 ; (c) F = (2x, y 2 , z 2 ) sobre a esfera unit´aria com centro na origem; (d) F = (2x, 3y, z) sobre a superf´ıcie que limita a regi˜ao definida por x2 + y 2 ≤ 4 e 1 ≤ z ≤ 3.
5. EXERC´ICIOS
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5. Use o teorema de Stokes para calcular o fluxo do campo y p 2z (log(x2 + y 2 ), arctan , z x2 + y 2 , x x atrav´es da fronteira do s´olido V = {(x, y, z) : 1 ≤ x2 + y 2 ≤ 2 e − 1 ≤ z ≤ 2}. 6. Deduza a lei de Coulomb a partir da lei de Gauss para uma carga pontual. 7. Mostre que a lei de Gauss e´ falsa para qualquer campo central cuja intensidade no ponto de coordenadas (x1 , x2 , x3 ) e´ dada por k , (x21 + x22 + x23 )n/2 onde k e´ uma constante e n 6= 2 e´ um inteiro positivo. 8. Seja F um campo vetorial definido em uma regi˜ao U de R3 . Prove as seguintes f´ormulas: (a) div( rot(F )) = 0; (b) div(gF ) = ∇g · F + g div(F ); onde g ∈ O(U ). ˜ : traduza a afirmac¸o˜ es em termos de formas diferenciais. S UGEST AO 9. Considere o campo central F (x, y, z) = (kx, ky, kz), onde k e´ uma constante. Esta f´ormula descreve um campo el´etrico ou um campo magn´etico? Justifique sua resposta usando as leis de Maxwell. 10. Calcule o divergente de cada um dos campos de velocidades abaixo. Quais deles representam um campo incompress´ıvel? (a) F (x, y, z) = (ay, 0, 0); (b) F (x, y, z) = (a/r2 , 0, 0); (c) F (x, y, z) = (ay, 0, 0); (d) F (x, y, z) = (0, arn , 0); p onde a 6= 0 e´ uma constante e r = x2 + y 2 + z 2 . 11. Calcule o divergente de um campo central do R3 . 12. Determine uma f´ormula para o divergente: (a) em coordenadas cil´ıdricas; (b) em coordenadas esf´ericas. 13. Considere cada uma das 2-formas ω de R3 dadas abaixo. Verifique se ω e´ fechada e, se for, determine uma 1-forma α tal que dα = ω. (a) ω = x2 dx ∧ dy + (y 3 + 1)dy ∧ dz + (z + 2)dx ∧ dz; (b) ω = xydx ∧ dy; (c) ω = (x2 + y 2 + z 2 )dx ∧ dz;
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4. 3-FORMAS
(d) ω = zdx ∧ dy + ydx ∧ dz. 14. Prove que a integral de uma 2-forma sobre fronteira de qualquer s´olido e´ igual a zero. 15. Sejam a1 , a2 e a3 func¸o˜ es diferenci´aveis de uma vari´avel definidas em toda a reta R, e considere a 2-forma ω = a1 (x)dx ∧ dy + a2 (y)dy ∧ dz + a3 (z)dx ∧ dz. (a) Mostre que ω e´ uma forma fechada. (b) Determine uma 1-forma α tal que dα = ω. 16. Considere o campo F (x, y, z) = (0, 0, −k log(x2 + y 2 ) definido em R3 \ {0, 0, 0)}, onde k ∈ R. (a) Mostre que F e´ um potencial vetor para o campo magn´etico de um fio infinito alinhado ao longo do eixo z. (b) Qual a “mudanc¸a de gauge” que nos permite passar de F ao potencial vetorial A determinado na p´agina 4.5 para este mesmo campo? 17. Seja F um campo de vetores definido em uma regi˜ao U de R3 . (a) Calcule div(∇F ). (b) Mostre que div(∇F ) = ∆f , o laplaciano de f . (c) Dˆe exemplos de func¸o˜ es para as quais ∆f = 0. (d) Se uma func¸a˜ o potencial f satisfaz ∆f = 0, o que podemos dizer sobre o campo gradiente de f , quando e´ considerado como um campo de velocidades? A definic¸a˜ o de ∆(f ) aparece na p´agina 11. 18. Sejam U uma regi˜ao de R3 , f, g ∈ O(U ) e V um s´olido limitado contido em U . Prove as seguintes f´ormulas, conhecidas como identidades de Green: Z Z (a) Φ(f ∇g) = (f ∇2 g + ∇f · ∇g)dx ∧ dy ∧ dz ∂V V Z Z (b) Φ(f ∇g−g∇f ) = (f ∇2 g − g∇2 f )dx ∧ dy ∧ dz. ∂V
V
Neste problema estamos usando a notac¸a˜ o ∇2 f para denotar div(∇f ).
6. Problemas 1. Seja U uma regi˜ao de R3 e f ∈ O(U ) uma func¸a˜ o que satisfaz ∆f = 0. Denote por Dv f a derivada direcional de f ao longo de v. Considere um s´olido V contido em U e seja n o vetor unit´ario normal a V . (a) Determine a 2-forma Dn f dA.
6. PROBLEMAS
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(b) Mostre que Z Dn f dA = 0. ∂V
(c) Mostre que Z
Z
k∇f k2 dx ∧ dy ∧ dz.
f Dn f dA = ∂V
V
˜ : Em (b) tome F = ∇f e em (c) F = f ∇f . S UGEST AO 2. A press˜ao para baixo exercida por um fluido que preenche a regi˜ao U definida por x ≤ 0 e´ dada por F (x, y, z) = (0, 0, cx3 ), onde c e´ a densidade do fluido. Seja V um s´olido (limitado) contido em U . O empuxo sobre V e´ definido como Z − ΦF . ∂V
Use o teorema de Stokes para provar o seguinte teorema de Arquimedes: O empuxo sobre V e´ igual ao peso do fluido deslocado por V .
Cap´ıtulo 5 n-formas Neste cap´ıtulo fazemos uma revis˜ao geral de tudo o que estudamos no livro; por isso, h´a aqui apenas definic¸o˜ es e teoremas, sem nenhuma demonstrac¸a˜ o. Utilizaremos um enfoque em que 1-formas, 2-formas e 3-formas s˜ao tratadas simultaneamente, como instˆancias diferentes de um mesmo tipo de objeto. Isto significa que, se vocˆe desejar, pode considerar esta revis˜ao como uma introduc¸a˜ o a` s n-formas. Neste caso, as demonstrac¸o˜ es de todos os resultados enunciados ficam como exerc´ıcios. !!!!!!! S´o que ainda n˜ao tive tempo de escrever este cap´ıtulo!!!!!
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ˆ Apendice Estas sec¸o˜ es apenas revisam algumas propriedades elementares do c´alculo diferencial e dos determinantes que usamos com freq¨ueˆ ncia neste livro. 1. Determinantes S´o usaremos determinantes de matrizes 2 × 2 e 3 × 3, e n˜ao teremos ocasi˜ao de calcular estes determinantes explicitamente em casos num´ericos. Por isso, n˜ao usaremos t´ecnicas de c´alculo como o m´etodo de Gauss. De fato, al´em das propriedades elementares dos determinantes usaremos apenas a expans˜ao em co-fatores para matrizes 3 × 3. Seja A uma matriz 2 × 2, cujas entradas s˜ao a a2 A= 1 . b1 b2 O determinante de A e´ definido por det(A) = a1 b2 − b2 a1 . Para calcular o determinante de uma matriz 3 × 3, apelamos para a expans˜ao em co-fatores. Expandindo o determinante de a1 a2 a3 B = b 1 b 2 b3 c1 c2 c3 pela primeira linha, obtemos b det(B) = a1 2 c2
b3 b − a2 1 c3 c1
b3 b + a3 1 c3 c1
b2 c2
Note a alternˆancia dos sinais ao longo da linha. Para efetuar o c´alculo completo do determinante de det(B) precisar´ıamos, agora, de expandir cada um dos determinantes 2 × 2. N˜ao faremos isto, porque a express˜ao final e´ complicada e n˜ao ser´a utilizada em nenhum lugar no livro. Para simplificar a notac¸a˜ o, pensaremos cada uma das linhas de uma matriz como um vetor. Assim, u1 = (a1 , a2 , a3 ), u2 = (b1 , b2 , b3 ) e u3 = (c1 , c2 , c3 ). 163
ˆ APENDICE
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Com isto, podemos escrever B = [u1 , u2 , u3 ] e det B = det[u1 , u2 , u3 ]. Lembre-se que os us representam as linhas de B, e n˜ao as suas colunas. Com esta notac¸a˜ o podemos formular facilmente as propriedades do determinante de que vamos precisar. Sejam u1 , u2 , u3 , u4 ∈ Rn e k ∈ R, ent˜ao Propriedade 1: se trocamos duas linhas quaisquer de um determinante entre si, ele troca de sinal, por exemplo, det[u2 , u1 , u3 ] = − det[u1 , u2 , u3 ]; Propriedade 2: se uma linha da matriz for multiplicada por uma constante k, ent˜ao o determinante e´ multiplicado por k, por exemplo, det[ku1 , u2 , u3 ] = k det[u1 , u2 , u3 ]; Propriedade 3: o determinante e´ aditivo com respeito a cada uma de suas linhas, por exemplo, det[u1 + u4 , u2 , u3 ] = det[u1 , u2 , u3 ] + det[u4 , u2 , u3 ]; Embora tenhamos enunciado estas propriedades apenas no caso em que a matriz e´ 3 × 3, elas tamb´em valem para matrizes 2 × 2. Na verdade, todas valem quaisquer que sejam as matrizes quadradas cujos determinantes estamos calculando.
Bibliografia [1] V. I Arnold, Mathematical methods of classical mechanics, Springer, New York (1989). [2] D. Bachman, A geometric approach to differential forms, arXiv:math.GT/0306194 (2003). [3] S. Chandrasekhar, Newton’s Principia for the Common Reader, Oxford University Press, Oxford (1995). [4] R. Courant e F. John, Introduction to calculus and analysis, vol. 2, John Wiley and Sons (1974). [5] R. P. Feynman, The Feynman lectures on physics, vol II, comemorative issue, Addison-Wesley, Reading (1989). [6] G. Green, An essay on the application of mathematical analysis to the theories of electricity and magnetism, Nottingham, (1828). Dispon´ıvel em http:// [7] G. Helferich, Humboldt’s Cosmos: Alexander von Humboldt and the Latin American Journey that changed the way we see the World, Gotham Books, New York (2004). [8] S . Lang, Calculus of several variables, Springer, New York (1987). [9] I. Madsen e J. Tornehave, From calculus to cohomology: De Rham cohomology and characteristic classes, Cambridge University Press (1999) [10] I. Newton, Mathematical Principles of Natural Philosophy and his system of the world, vol. I, traduc¸a˜ o de A. Motte, revis˜ao de F. Cajori Springer, University of California Press, Berkeley, (1962). [11] E. M. Purcell, Eletricidade e magnetismo, curso de f´ısica de Berkeley, vol. 2, Edgard Bl¨ucher, S˜ao Paulo (1970). [12] N. M. dos Santos, Vetores e matrizes, Instituto de Matem´atica Pura e Aplicada, Rio de Janeiro (1975). [13] M. D. Semon e J. R. Taylor, Thoughts on the magnetic potential, Am. J. Phys. 64 (1996), 1361–1369. [14] M. Spivak, Calculus on manifolds, Benjamin/Cummings, New York (1965). [15] R. S. Westfall, Never at rest: a biography of Isaac Newton, Cambridge University Press, Cambridge (1980).
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´Indice
Equac¸a˜ o de Laplace, 10 Equac¸o˜ es de Maxwell, 150
Base canˆonica, 1 Bola aberta, 1 fechada, 1
Fluido incompress´ıvel, 146 Forma diferencial, 51 Fronteira, 2
C´elula 1-c´elula, 52 2-c´elula, 87 3-c´elula, 137 Campo constante, 43 de velocidades, 44 central, 50 conservativo, 49 el´etrico de fio infinito, 151 magn´etico de fio infinito, 45, 116, 118, 148 Carga pontual, 148 Circulac¸a˜ o, 43, 44, 108 e campos conservativos, 49 Comutador, 11 Conexo, 3 Conjunto aberto, 2 convexo, 3 fechado, 2 vazio, 2 Curva alg´ebrica, 11 cont´ınua parametriz´avel, 3
Gauss lei de, 151 Laplaciano, 10 Lei de Amp´ere, 115 de Gauss, 148, 152 Magn´etico monop´olo, 151 Norma, 1 Redemoinho, 45 Retˆangulo, 2 Retˆangulo fechado, 2 rotacional, 108 Singularidade, 5 Teorema da divergˆencia, 145, 146 do gradiente, 42 de Stokes, 42, 104, 141 V´ortice, 45 Velocidade angular, 110 campo de, 109 Vorticidade, 110, 118
Divergente, 145 f´ormula integral, 147 interpretac¸a˜ o f´ısica, 146 Encadeamento 1-encademento, 52
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