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A FORMAÇÃO
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Capítuio 7 AUTOR DEFUNTO
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o que é um autor
suposto?
Comecemos por um exemplo curioso do procedimento de in. trodução do autor suposto e das conseqüências que arrastapara a figura do autor efetivo; .The narra tive of Arthur Gordon Pym ofNantucket, de Edgar Allan P mas será sempre também uma opção construída pelo leitor e atribuída a Aires pelo próprio processo da construção - sem garantia ou sequer probabilidade de coincidência harmoniosa com a presumível opção de Aires. Não há lugar para a figura do "autor implicado", nos termos em que a define Booth, porque está vedado, desde a origem, o caminho para o que Booth chama "a leitura ideal" (cE Booth, 19613, p. 153). Verifica-se uma inversão 145
do processo de autorização, porque agora é a necessidade de singularizar a destinação da narrativa que obriga a reconfigurar o nome de Aires: e então, Aires, ao abandonar a narrativa à sua sorte ou ao ser obrigado pela morte a abandonar a narrativa à sua sorte, abandonou de fato o seu nome, entregando-o aos acidentes de uma destinação indeterminada. Abandono, de resto, tão irremediável como anômalo, porque ó nome de Aires, sem deixar de designar a sua presença no texto, fica disponível para receber as figurações construídas pelo leitor, constituindo-se conjunto aberto de possibilidades que a origem não permite controlar. E é esse preço que Aires paga voluntária ou involuntariamente pela inscrição do seu nome próprio enquanto nome de autor. o sentido do seu nome dependerá sempre da leitura do texto que assina. Se se quiser, adotando uma formulação que poderá ter alguma utilidade nas próximas
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páginas, o seu nome designa~á, :~quant~ no~e de autor, um morto e o seu legado, sem assegurar a viabIlIdade de acesso entre um e outro: bem diferentemente, opera a disjunção que o) separa do mesmo passo que os mantém unidos. .
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3 Alinhemos agora três tipos de considerações que nos permitirão delimitar os traços decisivos do procedimento do autor suposto, con· firmando e completando o que já concluíramos através do exemplo de Gordon Pym.
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Neste ponto, não se
a) A indicação do nome próprio do autor realiza a função decisiva na delimitação do respectivo estatuto: a assinatura. Ora a assinatura tem eficácia paradoxal: por um lado, o nome de autor designa uma origem, anterior ao texto e idêntica a si própria - e nessa medida institui a responsabilidade de destinação da narrativa como responsabilidade irremovíve1 e intransmissível; por outro lado e na mesma operação, o nome de autor, ao inscrever-se como garante da unidade e da singularidade ~o texto, é afetado por uma potencialidade de sentido, assume significações que a origem não pode calcular e tampouco controlar - e nessa medida define a responsabilidade de destinação da narrativa como 146
responsabilidade que se reconfigura para responder ao apelo do leitor como se respondesse desde sempre. Assim, não há autor sem assinaturá que imponha a presença do autor, mas o texto assinado separa o nome próprio do portador, perturba-lhe a referência, de modo que a marca de presença do autor é, ao mesmo tempo, a força que o torna ausente. Então, se o autor não aparece para, expressamente, reinscrevendo o seu nome, assumir e declarar que assume a responsabilidade de destinar a narrativa - como era o caso de Gordon Pym -, a simples presença da assinatura cumpre essa função. A responsabilidade de autor é, por isso, rigorosamente intransmissivel, e dai que a única forma viável de transmissão seja a que justamente nega a transferência: a apropriação, figura gêmea da atribuição, já que uma e outra se fundam na possibilidade de o nome de autor funcionar como nome de autor na ausência do portador do nome e na ignorância ou na ocultação das intenções, dos projetos ou das determinações com que o inscreveu no limiar do texto. E daí, sobretudo, que a indicação pelo outro do nome de autor seja ainda uma forma de assinatura, porque realiza a mesma função que a indicação voluntária: no fundo, a operação de atribuição funda-se na idéia de que o texto atribuído tem em si as marcas da assinatura do autor, repondolhe o nome no lugar convencional como se de lá tivesse sido removido por acidente. Mas, qualquer que seja a natureza do acidente - neste caso, a morte de Aires -, o processo está invertido, parte-se do texto para o nome, porque este inscreveu-se disponível para s,e,configurar em resposta a uma leitura do texto.
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seguir Genette quando sustenta que o
fato de "o destiDª®I= _~e...ge autor não ser necessariamente o próprio autoó~m . ~. tm a indicação de nome de autor da assinatur.~_ cf. Genette, 1987, p. 46). D fato, O nome de autor pode ser inscritp pel '- --.,----.' . co e ISSO bom exemplo, posto Genette não o cite: mas exemplo que nos ensina que, ainda que inscrito pelo editor, o nome próprio enquanto nome de ,autor responsabi· liza sempre o autor, e, neste caso, o autor está disponível para ser responsabilizado désde o momento em que inscreveu um título. A assinatura realiza um ato performativo ao fornecer ao leitor um nome próprio capaz de designar a singularidade de uma destinação, e só cumpre essa função se, como insiste Derrida (cE Derrida, 1971b, pp. 390-92), 147
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paço que está no liIIl;iar'dos textos, parando o interior do exterioI:,.. _ fazendo fronteira, criando uma moldu tecto-urrrÔbJcto abordável, porque delimitado. A assinatura inscreve-se aí, e por isso não é nem simplesmente interior ao texto assinado, nem simplesmente exterior: em qualquer dos casos, valeria apenas como simples indicação de nome próprio, incapaz de realizar os efeitos específicos do ato de assinar, porque a assinatura, inscrevendo um nome próprio, é sempre mais que um nome próprio.
puder desligar-se de uma intenção presente e singular, porque é dessa forma paradoxal que a ligação à origem se efetua e se preserva. A verdade é que Genette trata as modalidades de indicação do nome de autor no
)tt L \") que próprios chamae, em "peritexto particular, editorial" sem levar semem interrogar conta o oefeito estatuto que ados indicação nomes do nome produz sobré o próprio autor: justamente porque apenas considera o processo num único sentido, isto é, como fonte de autoridade anterior, já consciente notara que eovoluntária. nome próprio um autor e designa~miÔ1elFouca Num deensaio bem "não é propriamente um nome próprio entre outros" (ef. Foucault,